O antigo ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang será extraditado para os Estados Unidos da América (EUA) no início desta semana, para responder pelo envolvimento no escândalo das dívidas ocultas, disse hoje fonte oficial à Lusa.
“Sim, podemos confirmar que ele será extraditado para os EUA, esta semana”, afirmou à Lusa a porta-voz do comando nacional da Polícia Sul-Africana (SAPS), Athlenda Mathe.
“Ele foi preso na África do Sul, vamos entregá-lo ao FBI esta semana agindo em conformidade com um pedido de extradição”, adiantou a porta-voz.
De acordo com a mesma fonte, Manuel Chang, que foi ministro da Economia e Finanças de Moçambique entre 2005 e 2015, será transferido “na segunda-feira ou terça-feira” pelo FBI [Federal Bureau of Investigation], unidade de polícia do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, num avião especial, depois de quatro anos e meio detido numa prisão na África do Sul pelo envolvimento no escândalo das dívidas ocultas do Estado moçambicano, calculadas em 2,7 mil milhões de dólares (2,5 mil milhões de euros).
A extradição de Manuel Chang para os Estados Unidos até 10 de julho foi comunicada às partes pelas autoridades sul-africanas em 30 de junho, segundo uma comunicação do Ministério Público de Joanesburgo a que a Lusa teve acesso.
“O Departamento de Justiça e Desenvolvimento Constitucional foi informado pela Interpol em Pretória, que estão em contacto com o 'US Marshall Service' e que o Sr. Chang será entregue às autoridades dos EUA durante o período de 8 a 10 de julho de 2023. Isso também foi confirmado pela Sra. Lerner do Departamento de Justiça dos Estados Unidos”, lê-se na nota consultada pela Lusa.
Manuel Chang, de 63 anos, foi detido em 29 de dezembro de 2018 no Aeroporto Internacional O. R. Tambo, em Joanesburgo, quando estava a caminho do Dubai, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos em 27 de dezembro, pelo seu presumível envolvimento no processo das chamadas dívidas ocultas.
Nos últimos quatro anos, o ex-governante moçambicano, que é tido como a “chave” no escândalo das dívidas ocultas, enfrentou na África do Sul, sem julgamento, dois pedidos concorrenciais dos Estados Unidos e de Moçambique para a sua extradição do país.
Em 24 de maio 2023, o Tribunal Constitucional da África do Sul indeferiu, pela segunda vez em 12 meses, um último recurso da Procuradoria-Geral de Moçambique (PGR) contra a extradição do ex-ministro Manuel Chang para os EUA.
Segundo a ordem judicial, a que a Lusa teve acesso, o Tribunal Constitucional reiterou que o antigo governante moçambicano deve ser entregue e extraditado para os Estados Unidos da América para ser julgado por supostos crimes naquele país, conforme consta no pedido de extradição datado de 28 de janeiro de 2019.
Em 7 de junho do ano passado, o Tribunal Constitucional da África do Sul rejeitou um pedido de Maputo para recorrer da extradição de Chang para os EUA.
Em novembro de 2021, o Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, anulou uma decisão do ministro da Justiça, Ronald Lamola, de extraditar Chang para Moçambique.
O antigo ministro das Finanças de Moçambique é arguido e já foi pronunciado pelo Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, capital de Moçambique, no âmbito de um processo autónomo sobre as dívidas não declaradas.
As autoridades norte-americanas alegam que o antigo governante conspirou com banqueiros do Credit Suisse e promotores internacionais para endividar o país em projetos marítimos, como a compra de uma frota contra a pirataria marítima, que acabaram por nunca se concretizar.
Em 2021, o Credit Suisse pagou quase 475 milhões de dólares (433 milhões de euros) para terminar as múltiplas investigações sobre o seu papel neste escândalo, um dos vários que o banco suíço tem enfrentado nos últimos anos, num processo que envolveu também três antigos banqueiros.
Moçambique contraiu empréstimos de quase 2 mil milhões de dólares (1,8 mil milhões de euros) para projetos marítimos, mas não os reportou aos parceiros internacionais nem os refletiu nas contas públicas, e quando não pagou as prestações, isso desencadeou um 'default' que atirou o país para uma crise económica e financeira.
O caso tornou-se um exemplo da ligação nem sempre transparente entre países africanos e os grandes bancos internacionais, e o processo está em litigação também no Reino Unido.(Lusa)