Chegou ao fim, no passado sábado, 03 de Junho de 2023, o recenseamento eleitoral com vista às VI Eleições Autárquicas, a decorrerem no próximo dia 11 de Outubro de 2023 nas 65 autarquias do país. O processo, que arrancou no dia 20 de Abril, foi concluído perante críticas e pedido de prorrogação do prazo pelos dois maiores partidos políticos da oposição e de organizações da sociedade civil, tendo em conta as irregularidades detectadas durante o processo, com destaque para a avaria das máquinas e exclusão dos membros da Renamo e Movimento Democrático de Moçambique (MDM), nas províncias dominadas pela oposição, porém, sem sucesso.
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) negou os pedidos da Renamo, MDM e do Consórcio Mais Integridade de se prorrogar o período de recenseamento eleitoral. A Renamo propôs o acréscimo de mais 30 dias, enquanto o MDM pediu uma prorrogação de 15 dias. O Consórcio Mais Integridade, composto por sete organizações da sociedade civil, não avançou com datas.
Segundo a CNE, os motivos alegados nos três pedidos não constituem irregularidades típicas das operações do recenseamento eleitoral, pelo que não deu provimento às três solicitações. Diz ainda que os motivos elencados não vêm acompanhados de provas e que “não consubstanciam qualquer violação à Lei, por serem aspectos técnicos que podem ocorrer independentemente da vontade humana”.
“As irregularidades que ocorrem ao longo do processo de recenseamento eleitoral são passíveis de serem reclamadas e recorridas dentro do período estipulado nos termos dos artigos 41 e seguintes da Lei n.º 5/2013, de 22 de Fevereiro, alterada e republicada pela Lei n.º 8/2014, de 12 de Março. Portanto, a existência ou não de irregularidades no processo de recenseamento eleitoral não encontra na Lei alguma cominação legal que concorra para a prorrogação do processo, objecto das petições”, acrescenta.
Contudo, a CNE diz que o recenseamento eleitoral não foi prorrogado devido ao calendário eleitoral, que também se mostra bastante apertado. O órgão liderado pelo Bispo Anglicano Dom Carlos Matsinhe afirma que a prorrogação do recenseamento eleitoral comprometeria as fases subsequentes do processo eleitoral, com destaque para a fase que se segue, que é a de inscrição dos proponentes, apresentação de candidaturas, recurso contencioso e sorteio das listas, que inicia no dia 26 de Junho e termina no dia 14 de Julho.
“A questão financeira foi também chamada à colação e teve-se também em conta os números de registo até então alcançados, que estão dentro dos padrões internacionais para a realização de eleições credíveis”, rematou a CNE.
Dados partilhados pela CNE na manhã de sábado indicam que, até ao dia 31 de Maio, os órgãos eleitorais tinham recenseado 7.773.622 eleitores, dos 9.877.829 eleitores projectados, o que representa uma realização de 78.70%.
“A nível das zonas autárquicas estão já recenseados 4.309.434, da estimativa de 5.243.539 eleitores, o que corresponde a 82,19% de realização”, sublinha a CNE, garantindo que as medidas tomadas pelo órgão, nomeadamente a extensão do horário das 07:00 às 17:00 horas, reforço do número de mobiles ID, intensificação de educação cívica e assistência técnica, permitirão aos órgãos eleitorais atingir a cifra registada nos anos anteriores.
Membro da CNE distancia-se do processo eleitoral
Enquanto a CNE garante que os três pedidos de prorrogação do recenseamento foram rejeitados por consenso, o vice-Presidente da CNE eleito pela Renamo, Fernando Mazanga, veio a público, na última sexta-feira, distanciar-se dos dados e de todo o processo eleitoral.
Aos órgãos de comunicação social, Mazanga disse termos estado perante um processo cirúrgico, no qual as brigadas de recenseamento priorizavam as pessoas que se deslocavam aos postos de recenseamento em camiões.
Mazanga disse ainda que a extensão do horário do funcionamento das brigadas não era suficiente para suprir a demanda que se verificava em alguns pontos do país, com destaque para as cidades da Beira, Quelimane, Mocuba, Lichinga e Matola. “Mais de 200 mil eleitores, na cidade da Matola, poderão ser excluídos do processo”, avançou a fonte.
“Não posso ficar dentro da Comissão Nacional de Eleições com um fardo destes. É preciso que os moçambicanos saibam, por isso convocamos esta conferência de imprensa para alertarmos aquilo que é a ameaça à democracia multipartidária”, finalizou.
Já o Presidente do MDM, Lutero Simango, defende que a CNE se mostrou incapaz de dirigir e conduzir o processo de recenseamento eleitoral e, sobretudo, “de pôr a ordem no STAE”, uma situação descrita como grave. “Não estamos satisfeitos. Estamos revoltados porque os direitos do cidadão estão a ser negados”, sentenciou o também Chefe da Bancada Parlamentar do MDM, na Assembleia da República.
Enchentes no último dia
No entanto, as enchentes tomaram conta de grande parte dos postos de recenseamento eleitoral nas autarquias de Maputo, Matola (província de Maputo); Beira, Marromeu e Dondo (Sofala); Tete e Moatize (Tete); Quelimane, Mocuba e Gurúè (Zambézia); Nampula, Ribáuè, Nacala, Angoche e Moma (Nampula); Cuamba e Lichinga (Niassa); e Chiúre (Cabo Delgado).
Milhares de eleitores lotaram dezenas de postos de recenseamento eleitoral, que estiveram abertos até às 00:00 horas deste domingo, uma decisão tomada pela CNE na passada quinta-feira. Na cidade da Beira, por exemplo, onde o Director-Distral do STAE (Secretariado Técnico da Administração Eleitoral) chegou a criar um “cordão de segurança” para impedir o recenseamento dos membros e simpatizantes dos partidos políticos da oposição, os potenciais eleitores tiveram de madrugar para garantir os primeiros lugares das filas.
As enchentes que se verificaram na última semana do recenseamento eleitoral levaram alguns cidadãos a desistirem do processo. Outros voltaram a denunciar a movimentação de pessoas e o uso de listas para o recenseamento dos eleitores, uma situação que foi reportada durante os 45 dias em que o país testemunhou o registo de eleitores para as próximas eleições autárquicas.
Refira-se que o recenseamento eleitoral termina com o STAE a demonstrar a sua insubordinação à CNE, ao recusar executar a deliberação da CNE, que ordenava a suspensão do Director Distrital do STAE da Beira, acusado de ter boicotado o recenseamento de membros e simpatizantes da Renamo e MDM. (Carta)