Crescem os avisos sobre o nefasto impacto ambiental causado pelas actividades de extracção de areias pesadas na costa moçambicana. Desta vez, os alertas não chegam de organizações da sociedade civil e muito menos de ambientalistas, mas de armadores industriais, que já testemunharam parte dos resultados daquela actividade mineira.
Há dias, o Secretário-Geral da Associação Moçambicana de Armadores de Pesca Industrial de Camarão (AMAPIC), Muzila Nhatsave, manifestou a sua preocupação com o licenciamento de operações mineiras ao longo da costa e em zonas nevrálgicas de reprodução das espécies.
A preocupação foi manifestada à Ministra do Mar, Águas Interiores e Pescas, Lídia Cardoso, durante a cerimónia de abertura da campanha de pesca de 2023, que teve lugar na cidade de Maputo.
Segundo os armadores industriais, as operações mineiras têm causado poluição ambiental nas zonas de reprodução, como também mar adentro, através de operações conexas usando barcaças para fazer baldeamento dos minérios em mar aberto.
Os armadores revelam, por exemplo, que no distrito de Larde, província de Nampula, as zonas que outrora eram produtivas, hoje nada produzem, por isso entendem que, caso se materialize o projecto de exploração de areias pesadas na região de Moebaze, no distrito de Pebane, província da Zambézia, umas das poucas zonas produtivas de camarão que o país ainda possui, “o futuro das pescas está condenado”.
“Não podemos perder nunca de vista que a pesca, a par da agricultura, constitui a fonte de subsistência e de renda da maioria da nossa população. É preciso ter sempre em conta, na tomada de decisões, as consequências sociais e políticas que a falta de recursos, já escassos, pode trazer. São actividades que mitigam a falta de emprego e ocupação de uma população maioritariamente jovem que tem nesta área, em particular, o seu sustento”, defendeu Muzila Nhatsave.
Para Nhatsave, é necessária uma actuação imediata do Ministério do Mar, Águas Interiores e Pescas com vista a travar a expansão da actividade de recolha das areias pesadas ao longo de toda a costa do banco de Sofala, sob pena de esta condenar, a curto prazo, toda a actividade piscatória, implicando a perda do meio de sustento não só da indústria de camarão, mas de todas as dezenas de milhares de pescadores artesanais e suas famílias.
Combustíveis sufocam o sector
A expansão da actividade mineira não é a única preocupação dos armadores industriais. O aumento galopante dos preços dos combustíveis líquidos também inquieta aquele grupo social.
Segundo o Secretário-Geral da AMAPIC, no ano passado, cerca de 30% das embarcações não conseguiram concluir a campanha de camarão devido à inviabilidade económica despoletada pela rápida subida dos preços dos combustíveis no fim do primeiro semestre de 2022. Para a campanha de 2023, desde o início, estima-se que 30 a 40% das embarcações não trabalhem pelo mesmo motivo.
A fonte explica que o combustível representa agora mais de 55% dos custos operacionais de um navio, devido ao aumento em cerca de 73% do preço do gasóleo, estando acima do custo nos mercados internacionais.
Por isso, Nhatsave propõe a adopção de um mecanismo temporário para o controlo do preço do combustível, “impedindo” que o gasóleo ultrapasse os 50 Meticais por litro, “valor que permitiria à indústria pesqueira operar no limiar do equilíbrio entre receitas e custos”. Pede também a permissão para importação isenta do IVA [Imposto sobre Valor Acrescentado] de todos os consumíveis a bordo das embarcações.
Os armadores revelam ainda ter havido um aumento muito significativo dos custos dos metais industriais (aço, ferro, etc.) necessários à reparação das embarcações e a maior parte dos aprestos de pesca; assim como houve redução do valor do camarão e outros crustáceos no mercado internacional entre 2020 e 2022.
“As consequências de todos os factores acima descritos, se não forem tomadas medidas de imediato, conduzirão, a muito curto prazo, ao colapso da actividade pesqueira industrial em Moçambique. Este é um momento especial em que coincidem muitos impactos negativos, que exigem acções especiais para evitar o desaparecimento de parte da indústria”, alertam os pescadores industriais.
Refira-se que a Ministra do Mar, Águas Interiores e Pescas garantiu, na ocasião, que entrará em funcionamento no país, dentro de um ano, um Centro Regional que irá coordenar as actividades de controlo da pirataria, pesca ilegal e outros crimes ao nível da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC). (Carta)