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segunda-feira, 11 março 2024 16:44

Assa Matusse: Um show em três estações (2.ª parte)

É facto indubitável: Assa Matusse fez “show” e a história ficou, assim, documentada: sexta-feira, 01 de março, a menina do bairro extasiou mais 1400 pessoas no Centro Cultural Moçambique – China, em Maputo. Um recorde, diga-se, desde que o centro foi inaugurado em setembro de 2023. O resto faz parte das infindáveis dedicatórios de ódio ou gosto particularizado. Por ser ela, ou, pior, por ter conseguido!

 

E foi o que aconteceu! Um espetáculo conseguido: em performance, espaço, luzes, alinhamento, instrumentistas, convidados e público. “Mata Ni Tayenna”, segunda música do dia, confirmou essa magia, já atuando a solo. “Chegou com suas coisas”, e com tudo, acompanhada por Válter Mabas, na guitarra, Stélio Mondlane, na bateria, Albano Bove, no baixo, e o francês Nicolas Vella, no piano e nas misturas eletrónicas.

 

Inquestionável, é também, a capacidade de execução destes instrumentistas. Se bem que o que há de novo neles é a “vibe” alinhada às exigências da protagonista. Cada um tem um percurso artístico cujos anos podem ser avaliados em função dos resultados da forma como se relacionam com essa arte. Eles produzem uma música que – longe do encaminhamento que a composição vocalizada sugere –, de per si, é uma narrativa crescente, com um começo, um desenvolvimento e uma conclusão, que até se confunde com a metáfora da vida – essa ideia de nascer, crescer, reproduzir-se e cumprir, por fim, o destino dos Homens, a morte.

 

Stélio, por exemplo, emergiu no princípio da década de 2010 e destacou-se no mesmo período quando, em 2013, concorreu para o Ngoma Moçambique e, logo à primeira, venceu a parada. Idem para Valter Mabas cujo percurso a solo inicia em 2003, em um concerto no Gil Vicente Café em Maputo, onde divulgou pela primeira vez os seus temas originais. Bove é baixista de mão cheia e Nicolas um produtor e artista com uma abordagem mais moderna e rica, com influências do jazz, pop e soul.

 

A verdade é que, mesmo para quem não gosta de música ao vivo, a experiência de contemplar os instrumentistas a reinventarem-se no palco é ímpar. A música feita com banda, repita-se, propõe aos ouvintes uma experiência sonora única. Fica-nos claro que é preciso potenciar esta prática. Ela representa uma atitude. E eles bem sabem ser ousados quanto misteriosos.

 

Essas influências são bem notáveis nas músicas do novo álbum de Assa. E a razão é simples: foi Nicolas Villa quem as produziu. “Mata Ni Tayenna”, por exemplo, é potencialmente recomendável e, na sua temática, desarma a atitude irresponsável de alguns e rende-se à paz, enquanto estado de ausência de perturbações e agitação. Um verdadeiro hino, num tom desesperado, dramático, rendido: “já chegou com seus problemas”, diz-se repetidas vezes na música cantada em changana, sua língua materna. 

 

Como é de seu costume, Assa abusa da sua criatividade e mistura elementos comuns de afro jazz e afro fusion para apresentar um material agradavelmente inusitado aos ouvintes. Para o espetáculo, escolheu 15 músicas, dos seus dois álbuns, que criaram uma estrutura audível única, apaixonante, crescente e narrativa. Cantou, seguidamente, Sombeco, Menina do Bairro, Litle Girl, Meu Canto, Nitxintixile, Looking For, Rokotxi, com Deltino Guerreiro, +Eu, Jé suis Malade Dèja?, Aprendeste Aonde e Aqui Preço – outro hino sobre o custo do sucesso e o preço do sacrifício.

 

Sempre abusando de várias vibrações, Assa fez, em quase duas horas do espetáculo, transições à capela, scatsinging, scatvoice e em brincadeiras com o público e com a banda. Em sua, foi um “show” e eles cumpriram o rigor que se impõe com uma marca nas lides: cantar e tocar como sempre e brilhar como nunca.

 

Texto: Reinaldo Luís

 

Jornalista e Editor de Cultura

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