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quinta-feira, 29 julho 2021 06:10

Jovens bloqueiam EN1 reclamando emprego na indústria extractiva: a Sasol no centro do furacão

Dezenas de jovens barricaram nesta terça a Estrada Nacional número 1, a principal rodovia moçambicana, entre as regiões de Inhassoro e Pande, concretamente um pouco depois das bombas da Total localizadas no desvio para Inhassoro, para quem segue na direcção Sul/Norte.

 

O desacato teve lugar ao princípio da tarde de ontem. “Carta” apurou que os jovens reclamavam por oportunidades de emprego na região de Pande/Temane, onde se localizam os poços de gás concedidos a petroquímica americana baseada nas África do Sul, Sasol. E também por promessas não cumpridas, como uma simples casa de banho.

 

A administradora de Inhassoro falou à TVM sobre o assunto e disse que houve tumultos, tendo agendado uma reunião para a sexta-feira, às 9 horas para “ouvir melhor a nossa juventude”. Ela não mencionou nem uma vez a palavra Sasol. “A implantação de projectos na região provoca esta situação pois os jovens têm expectativas de empregos”, frisou.

 

O desacato de ontem na EN1 durou quase uma hora de tempo. O trânsito na principal via rodoviária do país esteve interrompido. Fontes de Carta em Vilankulo disseram que é segunda vez, em quatro meses, que jovens da região criam desacatos reclamando oportunidades de trabalho na indústria extractiva local, encabeçada pela Sasol.

 

“Há quatro meses, jovens em Inhassoro barricara o Temane-Lodge, durante horas, impedindo a entrada e saída de utentes durante cerca de 3 horas. O caso foi “controlado”, disse uma fonte, evitando que imagens sobre a greve fossem circuladas pela internet e nas redes sociais.

 

A reivindicação de ontem, disseram fontes no terreno, visou essencialmente a Sasol, mas isso é desmentido pelo Eng. Ovídeo Rodolfo, DG da multinacional em Moçambique desde 2019. “Pelo que me foi reportado não senti que tivesse havido uma menção concreta à Sasol. Não há evidências nem ninguém tentou comunicar connosco”, disse Rodolfo.

 

Mas um dos jovens que esteve na barricada, Pedro Jornal, disse à estação de rádio alemã DW que os protestos visavam a Sasol, e tinham por objetivo impedir a circulação de viaturas ostentando o logo da multinacional. Jornal disse que a barricada foi provocada pelo facto de a Sasol não estar a cumprir uma alegada promessa de dialogo com a Associação dos Naturais e Amigos de Inhassoro, onde ele é Presidente.

 

Ovídeo Rodolfo explicou que a Sasol participa de um Fórum de Emprego local e que sempre que há oportunidades de trabalho para gentes da terra, não qualificada, elas têm prioridade”. Isso sempre aconteceu com o trabalho sazonal da limpeza do trajecto do gasoduto Temane-Secunda (na RAS), que do lado de Moçambique é sempre foi feito pelas populações por onde ele passa, pelo menos nos tempos em que a Sasol assumia ao controlo da infraestrutura, explicou.

 

Neste momento, acrescentou Rodolfo, a Sasol emprega 400 moçambicanos, dos quais 50% são locais, ocupando, como sempre, postos de trabalho não especializados. Rodolfo fala de perspectivas animadoras de emprego de curto prazo para um futuro próximo – para além do prospecção do furos em curso e da preparação de uma pesquisa sísmica – com o inicio, dentro de semanas, da implementação no novo Contrato de Partilha de Petróleo que teve o seu Plano de Desenvolvimento (PDO, escondido da opinião pública) revisto pelo Governo em Setembro de 2020, e no âmbito do qual a Sasol prevê a produção de 23 milhões de Giga joules de gás natural por ano (60% vai ser monetizado dentro de Moçambique), que serão usados para a produção de 30.000 toneladas de gás de cozinha. Por outro lado, a construção da Central Térmica de Temane (EDM) para geração de 450 MW de electricidade também poderá absorver mão de obra local. 

 

“Mas é tudo emprego precário”, diz uma ativista anti-Sasol que esteve nos primórdios do empreendimento, entre 2001/2002, tentando influenciar para que a multinacional começasse a formar moçambicanos locais que mais tarde substituiriam os expatriados que ainda hoje controlam o trabalho especializado nos empreendimentos em Inhambane.

 

O governador de Inhambane, Daniel Chapo, tem sido um crítico severo da Sasol, sobretudo no que tange à pouca visibilidade da sua alegada contribuição para a vida local através da responsabilidade social corporativa. Chapo já foi citado na imprensa dizendo não ser concebível que a sede do distrito de Inhassoro não tenha água canalizada e, pelo menos, uma rádio comunitária. E que não se percebia por que é que a Estrada Nacional nº1, na secção Pambara/Mangungumenta, continuava esburacada quando, de hora a hora, transitam dali camiões transportando gás natural condensado.

 

“Carta” apurou que, há cerca de três anos, a Sasol acordou com o governo de Inhambane um programa de responsabilidade social orçado em 20 milhões de USD. O valor estava destinado a ser investido nas regiões de Vilankulo e Inhassoro. Cada um dos distritos receberia anualmente 2 milhões de USD até 2025. Consta que 8 milhões de USD já foram gastos nesse programa de responsabilidade social, mas as gentes locais ainda não conseguem vislumbrar aonde é que os dinheiros foram realmente aplicados.

 

Uma fonte próxima das relações entre a Sasol e os governos distritais de Inhassoro disse que a implementado do programa em causa tinha sido terceirizada para uma empresa baseada em Maputo, que está alegadamente a gastar o dinheiro em Maputo com o aluguer de apartamentos e custos administrativos na ordem de 80% do orçamento.

 

“Carta” conseguiu contactar, ontem, Mateus Mosse, gerente de Relações Públicas da Sasol, tendo-lhe colocado questões relativas a esse programa de responsabilidade social. Ele recolheu todas as perguntas e disse que iria reagir, de forma compreensiva, dentro de dias. (M.M.)

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