O acesso à justiça, em Moçambique, ainda é limitado. A conclusão consta do terceiro relatório sobre direitos humanos, no país, elaborado pela Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados e que foi apresentado nesta quinta-feira (01 de Agosto), em Maputo. Entre as várias questões analisadas, o destaque vai para a questão dos direitos humanos e sistema de justiça, a crise económica e os direitos económicos, sociais e culturais, o acesso à informação, a situação da mulher e criança e as minorias sexuais (LGBT).
Ricardo Moresse, presidente da CDH, da Ordem dos Advogados, disse que, em Moçambique, há falta de um Plano Nacional de Direitos Humanos, assim como da transparência do Governo em produzir relatórios periódicos sobre os direitos humanos. Mais ainda, Moresse afirmou que, no país, o acesso às leis ainda é limitado, devido a questões linguísticas, escassez de quadros em todos os sectores do judiciário e questões económicas.
Associado a esta situação, está o facto de, no país, um advogado estar para 13.343 pessoas, cifra que se mostra muito aquém de alguns países da África Subsaariana, ao exemplo da África do Sul, onde um advogado estava para 2.067 pessoas até ao ano de 2017. De acordo com o estudo, 73 por cento dos advogados do país estão baseados na cidade de Maputo, por sinal a província com menor índice populacional do país.
Segundo o Relatório, este dado é preocupante no que concerne ao acesso à defesa por parte de toda a população, ao exemplo da província de Nampula, que tem apenas 92 advogados (equivalente a 7.39 por cento) e, por coincidência, a província mais populosa. Na província de Nampula, um advogado está para 66.000 pessoas.
Outro facto associado é de que, em Moçambique, um juiz está para 83.900 pessoas, numa situação em que existem 152 tribunais para 154 distritos, um Tribunal Supremo, três Tribunais de Recurso, 11 Tribunais Provinciais e 137 Tribunais Distritais. Entre as províncias, a menos privilegiada é Zambézia, que dispõe de 14 Tribunais, numa população estimada em 17.7 por cento, em comparação com Niassa que tem 16 Tribunais para uma população estimada em 6.46 por cento.
Entre as constatações, está ainda o facto de, no país, existirem 16 juízes de instrução criminal, 344 magistrados judiciais e 448 magistrados do Ministério Público. A corrupção e não aplicação devida da legislação interna para combater juízes e oficiais corruptos são também apontados como entraves no acesso à justiça.
Para os pesquisadores, o problema das capturas e detenções arbitrárias continua no país, onde o princípio de 48 horas de prisão preventiva para ser apresentado a um juiz continua a ser violado. Segundo constataram, mais de 31.6 por cento do total dos cidadãos em reclusão ficam mais de 1 ano presos sem ser presentes a um juiz. Mas, também o problema da tortura e tratamentos ou punições degradantes é apontado como preocupante.
De salientar que, por o Relatório referir-se a aspectos relacionados com a situação dos direitos humanos, os pesquisadores foram bastante criticados pelo facto de alguns dados constatados nele serem extemporâneos e muita coisa relatada já ter sido resolvida ou desenvolvida, conforme avançou o professor de Direito, Aguinaldo Mandlate. Sublinhe-se que o relatório trouxe dados de 2017 a Julho de 2018.
Em resposta, o Bastonário da Ordem dos Advogados, Flávio Menete, garantiu esforçar-se para que o próximo relatório albergue factos de 2018 e 2019, de modo a se eliminar esta lacuna.
Sublinhar ainda que para além de os dados não estarem actualizados, o Relatório não abordou a questão de Cabo Delgado, onde desde 2017 se verificam ataques e, muito menos, a situação da protecção dos idosos. Também não fez referência a certas práticas culturais que violam os direitos humanos. (Omardine Omar)