Tudo foi feito para que o caso não tivesse “pernas para andar”.
Ameaças, intimidações e apelos foram feitos desde os primeiros momentos em que uma menor confirmou à sua família que teria sido violada por Alberto Niquisse – deputado-eleito à Assembleia da República para a legislatura 2020-2024, com o número 21, pelo círculo eleitoral de Gaza.
O ora acusado violador de menor é proprietário da Kaunda Eventos, uma empresa que tem organizado vários eventos governamentais e não só e que, recentemente, foi condecorada pelo governo provincial, tendo inclusive recebido um diploma de honra das mãos da Governadora Stela Zeca. A menor que acusa Niquisse de a ter violado sexualmente, completou, recentemente, 15 anos de idade (nasceu a 03 de Novembro de 2004) e é estudante e residente na cidade de Xai-Xai.
Conforme consta do auto de denúncia n° 448/1ª ESQ/2019, de 23 de Julho de 2019, submetido ao Comando Distrital da Polícia da República de Moçambique (PRM), no Distrito de Xai-Xai – e assinado pelo Sub-Inspector da Polícia, José João Campira – tudo terá acontecido num dia de Setembro de 2018, por volta das 23:00 horas, quando Alberto Niquisse efectuou uma chamada para a menor, a perguntar onde esta se encontrava, ao que a menor terá respondido que estava numa festa, em casa de uma amiga e vizinha. Na sequência, o deputado eleito foi ao seu encontro, tendo de seguida a levado a uma residência na Praia de Xai-Xai, onde se encontrava apenas um guarda-nocturno. Foi ali que começou a acariciar e a beijar a menor.
Alberto Niquisse pediu à menina para manter relações sexuais, mas esta respondeu que não queria, até porque era virgem e estava com medo. Contudo, o indiciado insistiu, dizendo que tal não constituía problema, pois faria tudo com calma e sem forçá-la a nada.
Apesar da sua recusa, menor afirma que o indiciado acabou por violá-la numa varanda, uma vez que não possuía as chaves para poder aceder ao interior da dita residência.
A menor acrescentou que Niquisse teria ficado com o seu contacto num casamento que se realizara um mês antes (Agosto de 2018), e que desde então a ligava constantemente, até ao dia da consumação do acto sexual.
Já em Maio deste ano, quando a vítima regressava da Escola na companhia das suas colegas, o indiciado teria efectuado novamente uma chamada, procurando saber onde a moça se encontrava, ao que esta terá respondido que estava no Bairro 10”.
Conforme consta no documento na posse da “Carta”, durante a ligação, uma das amigas da menor terá gritado em voz alta que lhe apetecia “comer chocolate”. Niquisse aproveitou a deixa para se dirigir ao local onde se encontravam as jovens e entregar-lhes o alimento solicitado.
Mãe da menor desconfiou
Importa referir que a mãe da vítima, a menor violada, terá desconfiado que algo de errado se estaria a passar, por ter constatado que várias chamadas haviam sido recebidas pela filha no período nocturno.
Segundo consta no auto em posse da “Carta”, Cleia Evaristo, mãe da menor violada, entrou em contacto com a esposa do indiciado no intuito de conversar com ela sobre o assunto.
Após o encontro, a esposa de Alberto Niquisse pediu para falar com a menor, tendo esta confirmado que teria sido violada pelo esposo.
A esposa de Alberto Niquisse pediu então para que a menor não contasse a verdade à sua mãe. Dias depois, voltou a interpelar a menor quando esta se dirigia à escola. Tornou a abordá-la sobre o assunto, orientando-a que, caso fossem à esquadra ou ao tribunal, a jovem devia negar que fora violada sexualmente pelo seu esposo.
Refira-se, no entanto, que a mãe da menor confiscou o seu telemóvel, visando impedi-la de se comunicar com o indiciado, entretanto, a menor procurou outras formas de fazê-lo, usado o aparelho de uma amiga. Niquisse ter-lhe-á igualmente instruído a procurar formas de retirar o telemóvel da posse da mãe de modo a apagar toda a informação que pudesse ser comprometedora.
Em busca de soluções, Cleia Evaristo solicitou mais um encontro com o casal Niquisse, na sua residência, para em conjunto resolverem o caso, mas estes mostraram-se indisponíveis. Foi aí que a mãe da menor encaminhou o caso para a 1ª esquadra de Xai-Xai, onde a menina viria a confirmar o caso e a veracidade dos factos.
Mãe recebe ameaças
Conforme apurámos de fontes ligadas à família da menor, a queixa que deu entrada no passado dia 23 de Julho do presente ano viria a “hibernar” na gaveta da 1ª esquadra, enquanto nos bastidores seguia-se um conjunto de ameaças e intimidações contra a vida e o emprego da mãe da menor.
Organizações ligadas aos direitos humanos em Gaza tentaram a todo o custo levar o processo avante, porém, as suas pretensões viriam a ser frustradas.
Mas como já diz o adágio popular, “a culpa não morre solteira”, cinco meses após todo esse exercício visando apagar os vestígios do crime, activistas e defensores de direitos humanos denunciaram o caso aos órgãos de justiça, em Maputo.
“Carta” interagiu com Alberto Niquisse, telefonicamente, para procurar saber da sua versão dos factos. Na conversa de pouco mais de dois minutos, o nosso interlocutor confirmou que tinha conhecimento da referida denúncia.
No entanto, “convidou-nos” a deslocarmo-nos à cidade de Xai-Xai, alegadamente, porque queria falar com a nossa reportagem presencialmente, já que (segundo alegou) “não poderia falar sobre um assunto tão sensível sem que visse o rosto da pessoa com quem estava a dialogar”. E em seguida, desligou o telemóvel. (Carta)