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Maputo -

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BCI
quarta-feira, 02 outubro 2019 05:43

A outra versão sobre o negócio que levou Mazoio e Machaieie à prisão: um contexto de perseguição política?

No passado dia 15 de Agosto, o antigo PCA do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), Francisco Mazoio, foi detido em Maputo. Ele acabara de chegar de uma capital provincial e foi recolhido imediatamente aos calabouços. E, como se esperava, poucos dias depois, também foi detido Baptista Machaieie, antigo director-geral da mesma instituição.

 

Aquando das detenções, a suspeita na opinião pública apontava para um caso: o famigerado negócio do financiamento danoso à CAR Aviation, do falecido empresário Rogério Manuel, para a compra de aviões. Mas, poucos dias depois, o Ministério Público acabou libertando sua narrativa. Mazoio e Machaieie estão “indiciados de terem assinado um contrato suspeito para sacar dos cofres do INSS mais de 371 milhões de Meticais”.

 

O montante tinha a ver com um projecto imobiliário no distrito de Nacala-a-Velha, em Nampula. À luz desse contrato, de 2014, alega o GCCC, o INSS fez pagamentos no valor de 371.124.000 Meticais, dinheiro que foi alegadamente para bolsos privados.

 

O negócio envolveu o INSS e a Índico Dourado, uma empresa de consultoria e investimentos, a que estão ligados o Engenheiro ítalo-moçambicano Emiliano Finochi e o advogado Henriques Macuácuà, que é um dos defensores de Helena Taipo no caso de corrupção que levou à detenção da antiga Ministra. Finochi e Macuácuà, também são arguidos no processo sobre Nacala-à-Velha, mas estão em parte incerta, o que levou o Ministério Público a emitir contra os dois, há duas semanas, mandados internacionais de prisão.

 

Uma fonte ligada à Indico Dourado disse à “Carta” que o negócio entre a empresa e o INSS foi completamente limpo e tudo o que está acontecer não passa de mera “perseguição”. De acordo com a fonte, em 2014, o INSS publicou um estudo produzido e oferecido por um país nórdico, onde era sugerido que o instituto devia inverter o “ratio” entre depósitos e investimento a longo prazo, pois os bancos não pagavam juros decentes e estava a perder dinheiro. Até então, o INSS tinha investidos apenas 20% dos seus fundos e 80% estavam em depósitos, que geravam juros em dimensão limitada.

 

Na sequência desse estudo, diz a fonte, o INSS decidiu levar a cabo investimentos imobiliários em cada uma das províncias de Moçambique. E lançou convites, através da imprensa. A fonte diz que a Índico Dourado respondeu com um projecto em Nacala-à-Velha, na zona franca, e uma estância turística na praia.  Tratava-se de um complexo de escritórios de cerca 10.000 m2 e uma estância de luxo, com 48 quartos.

 

“A Índico fez um estudo de viabilidade económica financeira, adquiriu os Duats necessários, e desenvolveu todo o projecto de engenharia, criando um pacote pronto para ser executado, dividido em 2 fases: i) aquisição de todos os estudos de engenharia, arquitectura, viabilidade económica, incluindo os Duats; ii) Implementação do projecto. Ou seja, a construção física”.

 

De acordo com a fonte, “as fases eram separadas e independentes. Se o INSS quisesse construir com outros parceiros, estava livre de o fazer. Mas tinha tudo para começar. Tratava-se de um ‘project finance'”. A fonte alega que a negociação entre a Índico Dourado e o INSS “seguiu todos os termos legais, inclusive foi aprovado pelo Tribunal Administrativo, que comprovou a sua legalidade. E passou por 5 departamentos do INSS”.

 

A fonte não explicou porque é que o INSS não implementou o que tinha sido projectado. Mas lamentou que processos claros e transparentes venham a ser usados para "perseguições políticas". E queixou-se de que “investir em Moçambique é perigoso” e este caso prova por que é que empresários não querem pôr dinheiro no país”.

 

Do V concurso para a concessão de blocos de petróleo...

 

A menção à “perseguição política” parece não ser em vão. Emiliano Finochi e Henriques Macuácuà têm um historial recente de confrontação com o Governo em dois grandes processos estruturantes da economia. A Índico Dourado é parte de um consórcio que alega ter ganho os direitos para a exploração do bloco PT5-B, no norte de Inhambane, no âmbito do recentemente terminado V concurso, mas com quem o Governo acabou não rubricando qualquer contrato, mesmo depois de a antiga Ministra dos Recursos Minerais e Energia, Lectícia Klemens, ter assinado um despacho de concessão.  

 

O consórcio decidiu então processar o INP junto do Tribunal Judicial de Maputo por “ignorar as instruções da Ministra e falsificar documentos relevantes". Com a acção criminal, o consórcio pretende forçar o INP a abrir negociações para um contrato de exploração do bloco. 

 

O consórcio, liderado pela ShoreCan (uma joint venture entre a Canadian Overseas Petroleum Limited, COPL, e a Shoreline Energy International, da Nigéria), afirma que foi injustamente desqualificada do processo, encerrado em 2015. O advogado Henriques Macuácuà era quem estava a frente deste expediente, numa confrontação aberta com o MIREME (Max Tonela) e com o INP.

 

...à Hidroeléctrica de Mphanda Nkuwa

 

Outro caso recente de braço de ferro entre a Índico Dourado e o Governo envolve a Hidroeléctrica de Mpanda Kuwa. Em Agosto do ano passado, o PR Filipe Nyusi decidiu "adjudicar" o desenvolvimento do projecto de Mphanda Nkuwa (HMNK) a um futuro consórcio entre a EDM e a HCB. Numa quarta-feira (22 de Agosto), Nyusi, discursando na inauguração da nova Central Termoeléctrica de Maputo, bateu com a mão na mesa: chega de obstruções e intermediários.

 

E decidiu: os únicos mandatários de agora em diante seriam a EDM e a HCB. A posição presidencial causou calafrios nalgumas "boardrooms" do investimento estrangeiro em Maputo. E no Dubai o Sheik Maktoum Hasher Maktoum Al Maktoun aparava o “igal” de cor preta que fixava a “guthra” branca no topo da sua cabeça.

 

O quê?, perguntava Al Maktoum para seus botões. É que ele é o dono da Manannam Hydro Limited, que em Março de 2017 assinou um contrato com o Governo para a tomada da HMNK e colocando na mesa uma oferta de investimento de 4.6 bilhões de USD, sem garantias soberanas, para a construção da barragem e da linha de transmissão CESUL (centro/sul).

 

A Índico Dourado é a representante da Manannam em Moçambique e deixou claro que o afastamento abrupto do Sheik podia empurrar o caso para uma arbitragem internacional, colocando o Governo em tribunal. Não sabemos se essa ameaça foi concretizada, mas o certo é que a Índico Dourado passou a ser vista, em certos sectores do Governo, como um inimigo a abater.

 

E, enquanto o Governo lançava, em Março deste ano, um concurso para encontrar um consultor para realizar a estruturação legal e financeira do Projecto Hidroeléctrico de Mphanda Nkuwa, dando seguimento à "adjudicação" de Filipe Nyusi, Emiliano Finochi era constituído arguido no caso do Aeroport0 de Nacala, alegadamente por ter recebido subornos por parte da construtora brasileira Odebrecht.

 

Foi detido mas liberto a seguir sob uma caução milionária (20 milhões de Meticais). Seguiu-se, agora em Agosto, a detenção de Mazoio e Machaieie, com a indicação de que a Índico Dourado tinha também prevaricado e a constituição em arguidos de Finochi e Macuácuà, num caso ainda não cabalmente investigado pelo Ministério Público, que deixou a impressão de que estava a prender para depois investigar.

 

E foi, curiosamente, a seguir à revelação do caso de Nacala-à-Velha, já com o nome da Índico Dourado nas ruas da amargura, que o Governo anunciou finalmente o consórcio seleccionado, a Synergy Consulting (Worley Parsons mais Baker Mckenzie e HRA Advogados) para realizar os estudos técnicos e para a selecção do parceiro estratégico que deverá se juntar às empresas públicas Electricidade de Moçambique (EDM) e a Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) no desenvolvimento de Mphanda Nkuwa.

 

O enredo ainda promete. Finochi e Macuácuà estão em parte incerta, mas nada indica que o Sheik vai abdicar dos direitos adquiridos sobre a Mphanda Nkuwa nem se o consórcio que reivindica o bloco de petróleo no norte de Inhambane está disposto a desistir.  Será mesmo perseguição política? (Marcelo Mosse)

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