O bairro de Ontupaia, uma das zonas de expansão da cidade de Nacala-Porto, onde há 15 anos foram distribuídas altas extensões de terra a empresários locais e estrangeiros, tornou-se, nos últimos cinco anos, epicentro de estaleiros que processam e transformam madeira ilegal a nível da província de Nampula e outra oriunda da Zambézia.
Uma investigação da “Carta”, realizada nos últimos cinco meses, reuniu e confirmou os factos, através de vídeos, fotos e áudios, que descrevem a trama que gira em torno do negócio ilegal da madeira.
No passado dia 23 de Agosto, a equipa de reportagem da “Carta” deparou-se, ao longo das Estradas Nacionais Nº 01 e Nº 08, com cinco camionetas da marca Mitsubishi, modelo Canter, transportando a espécie de madeira Umbila, alegadamente proveniente da Reserva Nacional do Gilé, distrito com mesmo nome, na província da Zambézia. Entretanto, os toros transportados não continham nenhuma catalogação nem enumeração.
Na ocasião, “Carta” apurou que as viaturas tinham passado por dois postos de controlo, onde, mesmo com a presença das autoridades conjuntas de fiscalização, estas não foram interpeladas, tendo continuado a viagem rumo aos arredores da cidade de Nacala-Porto.
A saga de entrada de viaturas na cidade de Nacala-Porto continuou durante aquele dia, tendo sido possível registar mais de 15 camiões, transportando toros de madeira em direcção aos estaleiros não oficiais, localizados no bairro Ontupaia. A “Carta” apurou de fontes próximas à fiscalização que os referidos estaleiros funcionam com o conhecimento das autoridades fiscalizadoras.
Aliás, para o nosso espanto, verificamos que os camiões entravam numa empresa denominada Zhen Long Internacional, localizada ao longo da EN8, na cidade de Nacala-Porto, que anteriormente se dedicava à exportação da madeira, mas que actualmente processa pedra de construção. Em 2011, a referida empresa esteve envolvida no caso de apreensão de mais de 561 contentores de madeira diversa naquela parcela do país.
Seguindo outras pistas, identificamos mais cinco locais no bairro de Ontupaia que, no período diurno, funcionam como zonas residenciais e, no período nocturno, são locais clandestinos de processamento de madeira, que entra ilegalmente e que depois é exportada para China.
Nos referidos estaleiros há tendas e quartos, onde moram cidadãos de nacionalidade chinesa. Alguns desses “residentes”, nos seus tempos livres (quando não estão a processar madeira), dedicam-se a consultorias relacionadas com canalização de água, construção civil e fornecimento de energia.
Visando confirmar a real situação, a nossa equipa de reportagem fez-se passar por estudantes que estavam atrás de um local para arrendar, uma vez que a 200 metros dos estaleiros funciona uma instituição de ensino superior. “Carta” interagiu com os guardas dos estaleiros que nos confirmaram e, através de fotos e vídeos, verificamos que existiam camiões que transportam madeira para o local. Observamos ainda madeira diversa espalhada ao longo do quintal.
Como forma de colher mais depoimentos relacionados com o caso, “Carta” interagiu com vários cidadãos residentes em Ontupaia, ao que nos confirmaram que o assunto é “cabeludo” e que é normal ver aqueles camiões a entrarem naqueles estaleiros que têm mais de quatro metros de altura.
De fontes locais e envolvidas no negócio, soubemos ainda que o assunto envolve algumas personalidades políticas e económicas da província de Nampula, assim como de nível central. Relativamente à matéria em questão, a nossa equipa de reportagem dirigiu-se à Direcção Regional da Autoridade Tributária, em Nacala, onde não foi possível colher uma versão diferente dos factos, uma vez que a mesma madeira irá ser exportada logo que uma embarcação chegar ao Porto de Nacala.
Na mesma senda, “Carta” procurou ouvir a reacção da Direcção Provincial da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural de Nampula, através dos serviços florestais e fauna bravia. Luís Sande, Chefe Provincial destes serviços, disse que a situação já não ocorria em Nampula, desde o lançamento da Operação Tronco, entretanto, com a mudança de pelouros (agora é da alçada da Agência Nacional de Controlo de Qualidade Ambiental – ACQUA), a instituição garante ainda não ter reunido elementos para responder à situação apresentada. (Omardine Omar)