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sexta-feira, 14 junho 2019 06:10

Conselho Constitucional: Nyusi com “batata quente” na mão para encontrar sucessor de Gamito que prestigie o órgão

Encontrar um novo Presidente para o Conselho Constitucional (CC) pode ser a coisa mais fácil do mundo. Mas encontrar um nome que prestigie a instituição vai ser uma “batata quente” para o Presidente Filipe Nyusi, que deverá provar, com a escolha, se está disposto a seguir a cartilha “guebuzista” de nomeação de comissários políticos ou vai inverter essa tendência, indicando alguém com perfil comprovado de competência em matérias de direito constitucional e disposto a devolver o respaldo de independência que caracterizou os primeiros anos do CC sob a batuta de Rui Baltazar. Será que Nyusi irá buscar esse nome dentro da casa (do CC) ou vai “pescar” no largo espectro da sociedade?

 

“Carta” esteve a recolher um vasto leque de percepções sobre a questão da sucessão no CC, originada pela renúncia, semana passada, do anterior Presidente Hermenegildo Gamito. Uma das soluções imediatas de Nyusi é ir buscar alguém mesmo dentro do CC. Mas aí a escolha deveria recair para os mais velhos juízes da casa. E a escolha natural apontaria para o juiz João Guenha, um dos mais competentes em matéria de fiscalização da constitucionalidade.

 

Mas Guenha está impossibilitado: desde há cinco anos que, praticamente, está sem trabalhar, depois de ter sido acometido por dois acidentes de saúde. Dos mais velhos, restariam os juízes Manuel Franque, escolha política da Renamo na primeira leva de juízes que formaram o Conselho, Lúcia Ribeiro (que entrou na casa por indicação da Frelimo).

 

Franque tem tido um comportamento misto ao longo dos anos. No início pendia para uma postura mais em consonância com os ditames que recebia da Renamo, mas, nos últimos anos, tem sido mais moderado, mas dificilmente Nyusi ofereceria o lugar à oposição. Franque é, hoje, a terceira pessoa na hierarquia do CC, depois de Lúcia Ribeiro, uma jurista que chegou ao posto pela mão de Verónica Macamo, a actual Presidente da Assembleia da República, de quem é grande amiga e confidente.

 

É provável que Verónica Macamo tente fazer o seu “forcing” dentro do partido Frelimo para que a escolha recaia em Lúcia Ribeiro. Mas quem conhece esta juíza e já trabalhou com ela crê que só uma coisa levaria o Presidente Nyusi a optar por Ribeiro: ela é a juíza mais disponível a garantir o expediente da Frelimo dentro do CC. Fora isso, suas competências em matéria de direito constitucional são limitadas (e desde os tempos de Rui Baltazar que isso foi notado).

 

Ela sente-se melhor a trabalhar em matérias eleitorais (validação de resultados, sobretudo). Ciente das suas limitações, Lúcia Ribeiro, desde que chegou ao Conselho Constitucional, tem se dedicado a colaborar mais na parte administrativa e protocolar do órgão. Em suma, se for para devolver o prestígio do Conselho, ela não é certamente a pessoa mais indicada.

 

De dentro do CC, “Carta” recebeu indicações de que Lúcia Ribeiro foi instrumental para arrumar o acórdão que validou a falcatrua eleitoral de Marromeu, dando a vitória fraudulenta à Frelimo. Em ano de ferrenha disputa eleitoral, Nyusi pode cair na tentação de garantir que o CC actue em conformidade com os objectivos políticos da Frelimo e, para isso, vai certamente apontar Lúcia Ribeiro.

 

Mas isso seria ir contra o imperativo da credibilização do órgão. Nas últimas eleições autárquicas, o CC mostrou-se como um comissariado da Frelimo. E no recente acórdão sobre a Ematum, seus juízes uniram-se na exacerbação das competências do órgão, atraindo para si uma série de comentários jocosos sobre o trabalho do Conselho.

 

Entre os juízes mais novos do CC (juízes Saize e Cintura) não se vê ainda nenhum com arcaboiço suficiente para assumir a liderança. E o que resta, Ozias Pondja (um homem de mão de Armando Guebuza), que já foi juiz-Presidente do Tribunal Supremo, não é necessariamente um poço de integridade e credibilidade. Então, a solução seria Nyusi tentar alguém fora do CC. Mas quem? Eis o dilema. Teria de ser alguém com competência técnica e capaz de imprimir a independência almejada. Há, diga-se, em Moçambique, pouca gente com bagagem bem firmada nas matérias afins.

 

Uma das pessoas que se tem dedicado com afinco ao direito constitucional (certamente que parece uma heresia pensar no seu nome) é o jurista e deputado Edson Macuácuà. Sua competência em matérias constitucionais tem crescido a olhos vistos. O problema é que ele se expôs demasiado como militante da Frelimo e uma sua indicação configuraria uma tragédia. De modo que o leque de opções do Presidente Nyusi é limitado.

 

Mas se Nyusi quiser mesmo optar por olhar para dentro do CC terá de fazer um exame minucioso para encontrar alguém sobre quem não pesam alegações de esbanjamento de dinheiros públicos. Há demasiadas alegações sobre uso indevido de bens e viagens sem motivo aparente, fazendo recordar a farra do usufruto que levou à queda, há poucos anos, do então Presidente do órgão Luís Mondlane, que teve de regressar ao Tribunal Supremo, donde era oriundo. (Marcelo Mosse)

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