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domingo, 21 abril 2019 08:29

Andre Thomashausen: Maputo “fintou” justiça sul-africana no pedido de extradição de Manuel Chang

O académico sul-africano Andre Thomashausen considerou que o pedido da Procuradoria-Geral de Moçambique para a extradição do deputado Manuel Chang, detido na África do Sul desde dezembro, é uma "finta técnica" à justiça sul-africana. "É de duvidar que seja por lapso, é muito mais provável que foi intencionado e que seja uma finta técnica para criar aqui na África do Sul a ilusão de que o processo Chang em Moçambique está preparado e vai seguir até ao dia do julgamento, o que não é verdade", disse o professor catedrático de Direito Comparado da UNISA (Universidade da África do Sul) e especialista em Direito Internacional.

 

Andre Thomashausen, que analisava para a Lusa o pedido da PGR de Moçambique remetido em 8 de abril pelo juiz William Schutte para decisão do Governo sul-africano, salientou que "o que temos aqui é uma tecnicidade da lei moçambicana", mais especificamente da lei do Estatuto do Deputado, que distingue no artigo 13 a inviolabilidade do deputado a ser submetido a uma detenção preventiva e a julgamento.

 

"São dois tipos de inviolabilidade sob o título "Imunidades", Capítulo II, que são distintos na Lei, e o que o Supremo Tribunal [de Moçambique], a pedido da Procuradoria, remeteu à Assembleia foi um pedido de consentimento à detenção preventiva do deputado Chang", explicou.

 

Nesse sentido, Andre Thomashausen considera que "não houve requerimento para um consentimento da Assembleia ao julgamento do deputado Chang", apenas houve consentimento de prisão preventiva, faltando ainda o consentimento ao julgamento e o levantamento da imunidade do antigo governante e atual deputado pelo partido no poder em Moçambique.

 

"São duas coisas distintas, e o que se submeteu ao poder judicial na África do Sul foi a prova de que a Comissão Permanente da Assembleia, tal como lhe compete, deu o seu consentimento a uma prisão preventiva do deputado Chang, o que eles chamam de medida de coação máxima", afirmou.

 

"Mas nunca se falou do consentimento ao julgamento, o que então poderá acontecer é que na base desta informação se o ministro da Justiça da África do Sul assim achar por bem, o deputado Chang poderá ser enviado para Moçambique onde poderá ser preso preventivamente para ser ouvido, para ser questionado como testemunha, para ser ouvido como possível arguido, mas que depois não poderá ir a julgamento porque a Assembleia Nacional ainda não, ou em plenário ou em Comissão Permanente, deu o consentimento ao julgamento do deputado Chang", salientou.

 

Thomashausen adiantou que a Lei do Estatuto do Deputado da Assembleia da República de Moçambique refere-se também no artigo 17 do capítulo sobre Imunidades ao levantamento da imunidade dos deputados que tem de ser decidido em plenário da Assembleia.

 

"Não houve levantamento da imunidade e assim, tendo omitido explicar essa distinção na lei moçambicana, a Procuradoria e o Ministério da Justiça de Moçambique enganaram o sistema judicial sul-africano e isso ainda virá à luz do dia porque se houver, por exemplo, um recurso da parte dos Estados Unidos contra uma decisão do ministro [da Justiça da África do Sul] em favor de Moçambique, esses argumentos vão ser expostos e serão do conhecimento público", afirmou.

 

De acordo com o académico sul-africano, nos termos do Protocolo de Extradição da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC, na sigla inglesa) um pedido de extradição só é válido "na base de um processo penal que eventualmente seguirá a julgamento e se isso for impedido por lei, se não for possível haver julgamento por causa de uma imunidade, não pode haver um pedido de extradição válido".

 

"Estamos perante uma situação um bocado embaraçosa, um bocado delicada, porque de facto trata-se de um abuso da posição formal na base do protocolo SADC", declarou. Andre Thomashausen sublinhou ainda que em caso de não haver recurso [contra a decisão do Governo em extraditar Manuel Chang para os EUA] e ser extraditado para Moçambique, o ex-ministro das Finanças "estará salvaguardado de não ir a julgamento em Moçambique"

 

"Na base da imunidade nunca será julgado, a não ser que em Moçambique haja uma nova apreciação destas circunstâncias e a Assembleia acabar por decidir levantar a imunidade e dar consentimento ao julgamento do deputado Chang", precisou. "É difícil imaginar isso, visto a maioria [do partido Frelimo] que existe na Assembleia da República", afirmou Thomashausen. Manuel Chang é um dos visados num processo judicial internacional que investiga quase dois mil milhões de euros de dívidas ocultas de Moçambique, entre 2013 e 2014. (Lusa)

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