A ZANU-PF ajudou o Partido Frelimo, no poder em Moçambique, a registar milhares de zimbabweanos para participarem fraudulentamente nas eleições gerais marcadas para 9 de Outubro de 2024, revelou o jornal “The Mirror”.
O recenseamento foi feito de forma tão descarada que três repórteres do “The Mirror” trabalhando disfarçados estão entre centenas de zimbabweanos que conseguiram na semana finda recensear-se e receber cartões de eleitor num centro de inscrição em Nemamwa Growth Point, depois de passarem dois dias em longas filas. Nemamwa, situado a apenas 25 km a sudeste de Masvingo, acolheu o processo de registo. A campanha de recenseamento eleitoral estendeu-se para além de Nemamwa e abrangeu outras regiões do Zimbabwe, onde se presume que também tenham ocorrido registos ilegais.
De acordo com a equipa de investigação do “ The Mirror”, um esquema perturbador foi montado em que milhares de zimbabweanos foram recrutados para votar nas eleições gerais em Moçambique, com aparente apoio da ZANU-PF. “A Frelimo auxiliada por eleitores fantasmas em Masvingo prepara-se assim para vitória esmagadora em eleições duvidosas em Moçambique”.
As pessoas recenseadas foram informadas de que os cartões de eleitor escritos em português são bilhetes de identidade de Moçambique, o que lhes permitirá circular livremente em Moçambique e de lá encomendar roupas em segunda mão. Elas também foram informadas de que os cartões de eleitor lhes permitirão estabelecer-se na África do Sul, enquanto alguns indivíduos declaram com orgulho a sua identidade zimbabweana e afirmam ter participado regularmente nas eleições moçambicanas. Muitos zimbabweanos que se registam para votar em Moçambique não sabem que se trata de cartões de eleitor pelo facto de os documentos estarem escritos em português.
O processo de recenseamento em Nemamwa começou na passada segunda-feira (22 de Abril) e terminou ontem (28), e foi marcado por longas filas e as salas de registo ostentavam a inscrição “ZANU PF”.
A representante da Renamo, o maior partido da oposição em Moçambique, Glória Salvador, disse estar ciente das maquinações fraudulentas e que há pessoas dentro do Zimbabwe a recolher provas em preparação para uma contestação judicial. Venâncio Mondlane, aspirante a candidato presidencial da RENAMO, expressou a sua indisponibilidade para comentar quando contactado pelo “The Mirror”, citando uma reunião por vídeo-chamada em curso. No entanto, as tentativas subsequentes para contactá-lo foram infrutíferas.
Samuel Jemua, representante da FRELIMO, rejeitou as acusações de fraude eleitoral, afirmando que os cidadãos moçambicanos no estrangeiro têm o direito de registar-se e votar em qualquer local do mundo. Ao contrário do Zimbabwe, Moçambique permite que os seus cidadãos na diáspora participem nas eleições.
No entanto, o presidente da Comissão Nacional de Eleições (CNE), o Bispo Carlos Matsinhe, refutou esta afirmação, rotulando o registo dos zimbabweanos como um erro. Ao contrário do Zimbabwe, Moçambique permite que os seus cidadãos na diáspora votem, mas o recenseamento que terminou ontem parece ter sido marcado por algumas anomalias.
A falta de responsabilização por parte dos funcionários da ZANU PF, incluindo o porta-voz Christopher Mutsvangwa, aumenta ainda mais a suspeita em torno dessas actividades. Farai Marapira, director de comunicações da ZANU PF, distanciou o partido do alegado esquema, afirmando o seu compromisso com os princípios democráticos.
Nelson Chamisa, a principal figura da oposição no Zimbabwe, expressou choque, mas não surpresa com as revelações, atribuindo as acções à ZANU PF e à FRELIMO. Ele descreveu a situação como “fraude massiva” e “manipulação eleitoral clara”.
Douglas Mwonzora, líder do MDC-T, que boicotou as eleições presidenciais anteriores alegando fraude, advertiu contra a interferência do Zimbabwe nos assuntos internos de Moçambique, enfatizando o direito de Moçambique à auto-determinação.
No meio desta controvérsia, cidadãs comuns do Zimbabwe como Precious Gwangwava e Robina Mudura expressaram motivações contraditórias para se registarem, desde o desejo de exercer os seus direitos de voto até incentivos económicos ligados ao cenário político de Moçambique.
Gwangwava, que se registou para votar, expressou a sua intenção de viajar para Moçambique para votar, tendo votado em Nemanwa em 2019 enquanto Mudura, originária de Dande, perto de Moçambique, expressou apoio ao partido no poder para facilitar o comércio transfronteiriço nos próximos anos. No estrangeiro, os órgãos eleitorais previam inscrever cerca de 2 milhões de eleitores, nos círculos eleitorais da África (África do Sul, E-swatini, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwe e Malawi) e no resto do mundo (Portugal e Alemanha).
Moçambique realizou eleições autárquicas em 11 de Outubro, que foram vencidas pelo partido no poder, a FRELIMO, entre alegações de fraude, o que levou a protestos violentos.
Enquanto Moçambique se prepara para uma eleição crucial, com o Presidente em exercício, Filipe Nyusi, constitucionalmente impedido de concorrer a um terceiro mandato, o espectro da interferência externa agiganta-se, lançando uma sombra sobre o processo democrático da nação e ameaçando a integridade do seu sistema eleitoral. (The Mirror)