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quarta-feira, 19 julho 2023 06:26

Eleições no SNJ: “A actual direcção olha para mim como um inimigo” – Alexandre Chiúre

alexandre chiure

Cerca de 80 delegados à VII Conferência Nacional do Sindicato Nacional de Jornalistas (SNJ), que se realiza a partir de hoje, no Posto Administrativo de Mafambisse, distrito de Dondo, província de Sofala, são chamados, esta quinta-feira, 20 de Julho, a eleger os novos órgãos sociais da organização, com destaque para o Secretário-Geral.

 

Entre os candidatos à substituição de Eduardo Constantino está o jornalista Alexandre Chiúre, membro do Conselho Superior da Comunicação Social, um dos pioneiros no debate sobre as eleições no SNJ, que se encontram atrasadas há seis anos.

 

Em entrevista à “Carta”, Chiúre revela que as suas reflexões em torno do actual estágio do SNJ tornaram-no inimigo número um da direcção da organização, porém, considera-se homem firme e ideal para a condução dos destinos da mais antiga organização sócio-profissional do país. “Se votasse apenas a direcção actual do Sindicato, diria que vou perder, mas porque votam outros companheiros, sinto que vou ganhar, porque tenho muito apoio dos colegas”, garante.

 

Acompanhe, a seguir, os excertos da conversa:

 

Foi uma das vozes mais audíveis na defesa da realização das eleições no SNJ, um acto que se encontra atrasado há seis anos. Chegou mesmo a escrever artigos de opinião a criticar directamente o actual Secretário-geral pela sua gestão. Terá sido neste momento em que nasceu a ideia de se tornar líder do SNJ?

 

AC: Quando escrevi aqueles artigos, não tinha nenhuma intenção de me candidatar, era apenas uma contribuição para que o SNJ saísse da situação em que está, era apenas uma chamada de atenção à classe, no sentido de que estávamos a deixar o Sindicato morrer. Foi muito difícil escrever aqueles artigos, primeiro, porque achei que ia ser mal-entendido, segundo, achei que as pessoas iam pensar que estou a escrever porque quero poder e acabou acontecendo um pouco disto porque a actual direcção do Sindicato olha para mim como se fosse um inimigo, como uma pessoa maldosa, enquanto em nenhum momento discuti pessoas.

 

E como nasce a sua candidatura?

 

AC: Nasce de uma pesquisa que eu fiz ao nível nacional sobre a situação do jornalista. Viajei pelo país e conversei com alguns colegas das províncias, do Sindicato e do MISA para entender o estágio actual do jornalista em Moçambique. Foi nessa altura que me questionaram porquê não me candidatava, citando o facto de ter sido o pioneiro no debate sobre a situação do Sindicato. Portanto, depois de uma reflexão, pensei que podia avançar porque estou preocupado com a situação em que a organização se encontra. Ninguém se revê num Sindicato ausente, que abandonou os seus membros e que luta muito pouco na defesa dos seus associados.

 

Na sua óptica, o facto de ter sido pioneiro no debate sobre a organização das eleições no SNJ, constitui alguma vantagem ou desvantagem?

 

AC: Se votasse apenas a direcção actual do Sindicato, diria que vou perder, mas porque votam outros companheiros, sinto que vou ganhar, porque tenho muito apoio dos colegas. Há, na classe, um sentimento de que tem de haver mudanças e eles olham para mim como o ideal para tornar o SNJ actuante, interventivo e que vá atrás dos interesses dos seus associados. Conto com apoio de vários colegas e sinto que vão votar em mim, porque um dos candidatos lidera a lista da continuidade e o outro era patrão até “ontem”.

 

O apoio a que se refere não será de colegas que não integram o SNJ e que muito menos são delegados à conferência?

 

AC: Estou consciente disso e, quando falo de ter apoio dos colegas, refiro-me também aos que vão à conferência. Infelizmente, o voto ainda é delegado e é uma coisa que queremos mudar. Temos de ter um sistema em que todos aqueles que são membros do SNJ, com cotas em dia, devem votar do Rovuma ao Maputo. Agora, quem toma a decisão da classe é um punhado de gente (cerca de 80 pessoas). Também temos de rever essa ideia de que só membros com mais de cinco anos podem votar e serem votados. Aqueles Estatutos são anti-democráticos.

 

Algum comentário em relação ao local da realização do evento?

 

AC: Bom, acho que a direcção do Sindicato gosta muito de realizar as conferências em Sofala. Não sei porque é no centro do país e facilita o encontro entre os colegas, mas quase todas as conferências realizam-se em Sofala. Mas não tenho nada contra isso, não importa onde se realiza a conferência, o que me interessa é o resultado.

 

A sua candidatura propõe-se a instituir a Carteira Profissional do jornalista, um sonho de longa data. Como fará isso?

 

AC: É preciso fazer lobbies, porque o assunto está na Assembleia da República e está a ser adiado em todas as sessões. É um assunto sensível e é por isso que o seu tratamento exige muito cuidado por parte dos deputados. Então, o que nós vamos fazer, assim que ganharmos as eleições, é aproximarmo-nos junto da Assembleia da República e do Governo para fazermos os nossos lobbies e fazer entendê-los a importância da aprovação da lei, porque será através da carteira profissional que vamos disciplinar o exercício da actividade jornalística.

 

É também seu projecto influenciar as entidades patronais a oferecer contratos de trabalho dignos aos jornalistas. Numa área já viciada em contratar mão-de-obra barata, como pensa em mudar este cenário?

 

AC: Eu acredito que, com diálogo, é possível mudar este cenário. Sonhamos com um Sindicato que sirva de plataforma de diálogo, portanto, vamos sentar com as entidades patronais e assinaremos um compromisso para a mudança do actual paradigma.

 

O SNJ hoje é uma organização de jornalistas mais velhos e na sua maioria pertencentes aos órgãos de comunicação social do sector público. Como captar os jornalistas do sector privado, em particular os mais jovens?

 

AC: A nossa grande prioridade vai ser justamente sindicalizar os jornalistas que trabalham no sector privado. Neste momento, por exemplo, quem manda é a Rádio Moçambique porque os seus jornalistas estão sindicalizados e o pagamento de cotas é feito na fonte. Mas o SNJ é para todos e se há esse entendimento é por culpa dos jornalistas do sector privado que não se sindicalizam. Por exemplo, na organização da minha lista, o desejo era constituir órgãos com jornalistas jovens, porém, enfrentei muitas dificuldades porque grande parte não é membro do SNJ. Mas faremos o esforço de trazê-los ao Sindicato.

 

Também tem constituído preocupação, a nível da classe, a existência de inúmeros bares na sede do Sindicato. Será, aquela, a melhor forma de rentabilizar as contas da organização?

 

AC: Não é a única forma, mas são aqueles restaurantes que asseguram as receitas para pagar salários. Mas há algumas coisas que precisam ser feitas ali. Por exemplo, quando chegas no Sindicato, o que chama mais atenção é a publicidade de bebidas alcoólicas. Dá a impressão de que ali só se bebe. Então, é preciso devolver, ao Sindicato, o debate de ideias e isso vai mudar muito o rosto da organização. Aliás, pretendemos abrir oficinas de jornalismo para os estudantes. Pretendemos celebrar parcerias com Universidades para que os seus estudantes visitem o Sindicato como parte da sua actividade curricular, de modo a consolidar os seus conhecimentos práticos do jornalismo e isso será vantajoso, tanto para as universidades, tal como para as empresas jornalísticas, que ganharão uma força de trabalho qualificada. O SNJ também vai ganhar membros muito cedo.

 

Caso ganhe as eleições, qual será a sua primeira acção?

 

AC: A primeira actividade será o levantamento estatístico para saber quantos jornalistas o país tem, incluindo os que não estão sindicalizados e os jornalistas estrangeiros baseados no país. A partir daí, será possível aferir quantos operam no sector público, quantos operam no sector privado, quantos estão nas rádios comunitárias. Será possível sabermos onde trabalham, em que condições trabalham, seus graus académicos e suas respectivas áreas de formação. Com essa informação, será possível, por exemplo, saber quantos precisam de formação, de modo a explorarmos algumas janelas de formação, seja no país, assim como no estrangeiro.

 

Perfil de Alexandre Chiúre: Natural do distrito de Chibuto, província de Gaza, Chiúre é membro do Conselho Superior da Comunicação Social. Foi jornalista do Diário de Moçambique, tendo desempenhado as funções de Coordenador Editorial na Delegação de Maputo. Foi repórter sénior do jornal Savana (1994/1995) e correspondente do jornal português Diário de Notícias, entre 1991 e 2020. Também colaborou com a Agência LUSA em Maputo na década 90. (Abílio Maolela)

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