Seguindo uma tendência que já se verifica há mais de 10 anos, o sector castrense continua a ser o mais privilegiado no Aparelho do Estado, uma caraterística comum em Estados autoritários, tal como Moçambique se tornou nos últimos anos.
A última prova da atenção que o Governo dá ao sector castrense em detrimento do produtivo está vertida na Tabela Salarial Única (TSU) destinada às Forças de Defesa em Segurança (FDS). Depois de a primeira versão da TSU das FDS ter causado polémica no seio da Polícia da República de Moçambique (PRM), devido à suposta “banalização” dos homens da “lei e ordem” em relação aos militares, o Governo viu-se obrigado a fazer reajustes nos enquadramentos dos membros das duas forças, assim como nos quantitativos a serem pagos a cada patente de ambas forças.
E é nos quantitativos aprovados pelo Governo, no passado dia 24 de Janeiro, que está a prova do privilégio que o sector castrense tem em relação ao produtivo: os militares e agentes da Polícia passam a ter os melhores salários do Aparelho do Estado.
De acordo com os Decretos n.º 4/2023 e n.º 5/2023, ambos do dia 27 de Janeiro, publicados recentemente pelo Ministério da Economia e Finanças (MEF), o salário mínimo pago nas FADM (Forças Armadas de Defesa de Moçambique) e na PRM é de 11.032,84 Meticais, equivalente ao nível salarial 1C, contra o de 8.758,00 Meticais pago na Administração Pública (funcionários civis), representando uma diferença de 2.274,84 Meticais entre funcionários do mesmo nível salarial.
Por sua vez, o salário máximo pago nas FADM e na PRM, de acordo com os mesmos Decretos, é de 145.733,84 Meticais, correspondente ao nível salarial 21A, enquanto o funcionário civil mais bem pago do Estado recebe 131.758,00 Meticais, representando uma diferença de 13.975,84 Meticais entre funcionários do mesmo nível salarial no Estado.
Lembre-se que, na estreia da TSU, em Julho de 2022, a Administração Pública e as FDS tinham tabelas salariais idênticas, contendo os mesmos quantitativos e os mesmos níveis salariais. Até ao início de 2023, o salário mínimo pago na função pública, assim como nas FDS, era de 8.758,00 Meticais, correspondente ao nível salarial 1C, sendo que o salário máximo pago nas “duas alas” era de 165.758,00 Meticais, equivalente ao nível salarial 21A.
Após a revisão dos quantitativos das duas tabelas salariais, em Janeiro último, os funcionários públicos civis viram, por um lado, o salário mínimo manter-se, enquanto os militares e agentes da Polícia tiveram um aumento de 2.274,84 Meticais. Por outro lado, o salário máximo reduziu em 34.000,00 Meticais para os funcionários civis, enquanto o salário máximo pago nas FDS baixou em 20.024,16 Meticais.
No entanto, embora tenham os “melhores” salários do Aparelho do Estado, os militares e agentes da Polícia têm a pior diferença salarial entre os diferentes níveis salariais. Por exemplo, enquanto na função pública a diferença entre os níveis salariais 1C e 1B é de 500,00 Meticais, nas FDS é de 196,00 Meticais. Como resultado, a diferença entre os níveis salariais 1C e 10C é de 10.730,16 Meticais nas FDS, enquanto na função pública é de 18.900,00 Meticais.
Refira-se que na Sessão em que o Conselho de Ministros reviu os quantitativos das FDS, o vice-Ministro da Administração Estatal e Função Pública, Inocêncio Impissa, decidiu esconder os números, alegadamente por questões “estratégicas”. (A. Maolela)