“Claro que esperamos [receber] é nosso cidadão, temos interesses processuais e é por isso mesmo também que nós estamos a pedir a extradição do cidadão Manuel Chang para o nosso país, para o interesse dos processos moçambicanos”, respondeu a PGR, na cidade da Praia, onde se encontra de visita oficial, a convite do seu homólogo cabo-verdiano, José Luís Landim.
Em 20 de dezembro, os advogados sul-africanos da PGR de Moçambique avançaram à Lusa a intenção de solicitar a reconsideração do seu pedido de recurso contra a extradição de Manuel Chang para os EUA no âmbito das dívidas ocultas.
Em causa está o pedido de interposição de recurso de Maputo que foi rejeitado pelo Supremo Tribunal de Recurso (SCA) da África do Sul, “por não haver razoável perspetiva de êxito no recurso e não existir outra razão imperiosa para o julgamento do recurso” no âmbito do processo das dívidas ocultas, em Moçambique, segundo a ordem judicial a que a Lusa teve acesso.
“E para isso estamos na expetativa que se decida na maior celeridade, para o bem do processo e mesmo para proteção dos direitos do próprio cidadão”, completou Beatriz Buchili.
Na altura, o advogado sul-africano Busani Mabunda disse que estavam a “aguardar instruções do cliente [PGR Moçambique], mas o caminho a seguir é submeter um pedido ao presidente do Supremo Tribunal de Recurso para reconsiderar esta decisão”.
“Se não merecer aprovação, vamos levar o caso ao Tribunal Constitucional [da África do Sul]”, adiantou.
E sublinhou que, em junho, o Tribunal Constitucional (ConCourt, no acrónimo em inglês), a mais alta instância da Justiça na África do Sul, “disse que não era do interesse da justiça ouvirem o caso naquela fase”, o que significa que “o que estavam a dizer era esgotem todos os vossos recursos, ou caminhos, antes de voltarem a nós”, sublinhou.
Nesse sentido, Busani Mabunda explicou que o novo requerimento judicial será submetido no início do próximo mês de janeiro ao vice-presidente do Supremo Tribunal de Recurso da África do Sul, Xola Petse, que preside atualmente interinamente àquela instância judicial.
O advogado sul-africano da PGR de Moçambique avançou ainda que o Governo sul-africano se “comprometeu” perante o Supremo Tribunal de Recurso, durante o recente processo de requerimento judicial, a “não extraditar” o ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang enquanto decorrer o processo legal na África do Sul, de contestação da sua extradição para os Estados Unidos da América, como foi ordenada em novembro do ano passado pelo tribunal provincial de Gauteng.
“O Ministério da Justiça [da África do Sul] assumiu o compromisso de que não irá extraditar o Sr. Chang para os EUA até que todos os processos legais no país tenham sido esgotados”, referiu o advogado Busani Mabunda à Lusa.
Nos últimos quatro anos, o ex-governante moçambicano, que é tido como a “chave” no escândalo das chamadas dívidas ocultas, enfrentou na África do Sul, sem julgamento, dois pedidos concorrenciais dos Estados Unidos e de Moçambique para a sua extradição do país.
Aos 63 anos, Manuel Chang foi detido em 29 de dezembro de 2018 no Aeroporto Internacional O. R. Tambo, em Joanesburgo, a caminho do Dubai, com base num mandado de captura internacional emitido pelos EUA em 27 de dezembro, pelo seu presumível envolvimento no chamado processo das dívidas ocultas no vizinho país lusófono.
A prisão de Manuel Chang foi legal ao abrigo do tratado de extradição entre os EUA e a África do Sul, assinado em setembro de 1999, em Washington, segundo o Ministério Público sul-africano.
Chang foi ministro das Finanças de Moçambique durante a governação de Armando Guebuza, entre 2005 e 2010, e terá avalizado dívidas de 2,7 mil milhões de dólares (2,5 mil milhões de euros) secretamente contraídas a favor da Ematum, da Proindicus e da MAM, empresas públicas referidas na acusação norte-americana, alegadamente criadas para o efeito nos setores da segurança marítima e pescas, entre 2013 e 2014.
A mobilização dos empréstimos foi organizada pelos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia.
Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.
No passado dia 07 de dezembro, 11 dos 19 arguidos no processo das dívidas ocultas foram condenados a penas de prisão entre 10 e 12 anos e três deles foram ainda condenados a pagar uma indemnização ao Estado equivalente a 2,6 mil milhões de euros.
Os três visados são Ndambi Guebuza, filho do ex-presidente Armando Guebuza, e dois ex-dirigentes dos serviços secretos, Gregório Leão e António Carlos do Rosário (ex-diretor-geral e antigo líder da ‘inteligência’ económica, respetivamente), que receberam uma pena de 12 anos de prisão cada um.(Lusa)