Preocupante! É o que se pode dizer em relação ao estágio dos direitos humanos no país, passados quase 33 anos depois de Moçambique ter aprovado a sua primeira Constituição que define o país como um Estado de Direito Democrático, onde os direitos e as liberdades individuais são respeitados, entre os quais, o direito à manifestação.
A Polícia da República de Moçambique (PRM), através das suas Unidades de Intervenção Rápida (UIR) e Canina, voltou a mostrar a sua musculatura, inviabilizando marchas de homenagem ao rapper AZAGAIA, falecido no passado dia 09 de Março. As mesmas Unidades da PRM, lembre-se, já tinham inviabilizado, na passada terça-feira, o cortejo fúnebre do autor da música “Povo no Poder”.
Gás lacrimogénio, balas de borracha e verdadeiras e cacetadas são algumas das formas usadas pela PRM para dispersar milhares de moçambicanos que, nas cidades de Maputo, Beira e Xai-Xai, saíram à rua para homenagear o “herói do povo”, estatuto ganho pelo artista Edson da Luz, através das suas letras de intervenção social.
Em Maputo, mais de uma dezena de manifestantes foram detidos e 19 deram entrada no Hospital Central de Maputo (HCM), vítimas de agressão física, protagonizada pela PRM. Aliás, um cidadão de nome Inocêncio Manhique perdeu um olho, depois de ter sido atingido por uma bala disparada pela Polícia, na cidade de Maputo.
Na cidade da Beira, capital provincial de Sofala, 12 pessoas foram detidas e uma ficou ferida, uma atitude considerada “um padrão perturbador de tácticas imprudentes e ilegais contra as pessoas durante os protestos” pela Amnistia Internacional.
As manifestações inviabilizadas nas cidades de Maputo, Xai-Xai e Beira tinham sido comunicadas às autoridades municipais locais com devida antecedência, tal como manda a Lei, mas no lugar de garantir protecção e segurança aos manifestantes, a Polícia usou da força para impedir a realização das marchas, alegando ter recebido “ordens superiores”.
As “ordens superiores”, sublinhe-se, foram invocadas pelo Presidente do Município de Vilanculos, na província de Inhambane, para negar a realização da marcha naquela cidade turística e violar a Constituição da República, perante o silêncio cúmplice do Presidente da República, o “garante da Constituição”, o autointitulado “empregado do povo” e Comandante-Chefe das Forças de Defesa e Segurança.
Este não é primeiro caso de inviabilização de marchas pacíficas em Moçambique protagonizada pela Polícia, perante o silêncio das autoridades, incluindo o Chefe de Estado. Aliás, desde que Filipe Nyusi ascendeu ao poder, Moçambique nunca assistiu à realização de marchas, organizadas por cidadãos e organizações da sociedade civil. Apenas assistiu às organizadas pelo partido Frelimo em saudação ao Presidente da República, que é também líder daquela formação política.
As últimas marchas realizadas por diversos cidadãos e organizações da sociedade civil, no país, foram vistas em Outubro de 2013, no penúltimo ano do segundo mandato de Armando Emílio Guebuza, quando as organizações da sociedade civil uniram-se para protestar contra os raptos e contra a guerra que se verificava na zona centro.
Desde esse ano, só a Frelimo tem agradado a Polícia, em manifestações que contam, aliás, com a presença das bandas da Polícia das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM).
Sublinhe-se que o Índice de Democracia de 2022, produzido pela revista The Economist, coloca Moçambique entre os regimes autoritários, estando no 117º lugar, de uma lista de 167 países analisados. Isto é, Moçambique está entre as 50 piores democracias do planeta terra. (Carta)