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segunda-feira, 22 agosto 2022 07:10

Os pontos nos “ii” sobre a proveniência da proposta de Lei da Acção Popular

Continua aceso o debate sobre a “paternidade” da proposta de Lei da Acção Popular em Moçambique, com o político e activista social, Ismael Mussa, a chamar para si o protagonismo pelo desenho da proposta de uma Lei que já foi ensaiada pela Assembleia da República há 21 anos.

 

O debate está activo desde que o Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), uma organização da sociedade civil, organizou um debate para discutir uma proposta de Lei da Acção Popular a ser submetida ao Parlamento.

 

A discussão centra-se na paternidade daquela iniciativa de Lei, reivindicada pelo Observatório da Cidadania de Moçambique (COM), dirigido por Ismael Mussa. É que, em 2020, o Observatório da Cidadania de Moçambique, em parceria com outras organizações da sociedade civil, também discutiu uma proposta de Lei da Acção Popular e submeteu-a à Assembleia da República.

 

No entanto, a sua proposta não era nova. Em 2001, o Juiz Jubilado do Tribunal Supremo, João Carlos Trindade, então Director do Centro de Formação Jurídica e Judiciária, liderou a equipa que elaborou o primeiro projecto de Lei da Acção Popular, a pedido do próprio Parlamento.

 

“Carta” resgatou o Projecto, de 29 artigos, e apresenta aos leitores o que de essencial previa para “concretização do acesso à justiça, quando estiverem em causa interesses colectivos ou titulados por uma massa indeterminável de sujeitos”.

 

Por exemplo, o projecto de Lei propunha, no seu artigo 3, que a titularidade do direito de acção popular pode ser exercida, individual ou colectivamente, “por qualquer cidadão no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, bem como pelas autarquias locais e por associações sem fins lucrativos, de algum modo interessadas na defesa de direitos ou interesses difusos e colectivos, ainda que não possuam interesse directo em demandar”.

 

Já no artigo 9, o documento estabelecia que, na decisão dos litígios que tenham dado origem ao exercício do direito de acção popular, os juízos de equidade teriam prevalência sobre os juízos de legalidade estrita.

 

Quanto à responsabilidade civil, o artigo 16 defendia, no seu número 1, que o responsável pela violação dolosa ou culposa de direitos ou interesses colectivos incorre no dever de indemnizar o lesado ou lesados pelos danos causados. Já o número 2 do referido artigo dizia: “a indemnização pela violação de direitos difusos é fixada globalmente, sempre que não for possível individualizar os respectivos titulares”.

 

E o número 3 referia: “o direito à indemnização prescreve passados três anos a contar do trânsito em julgado da decisão que tiver reconhecido esse direito, sem prejuízo do regime de suspensão, interrupção e contagem dos prazos, previsto na lei geral”.

 

“Existe ainda a obrigação de indemnização por danos, independentemente de culpa, sempre que das acções ou omissões do agente tenha resultado ofensa de direitos ou interesses protegidos nos termos da presente lei e no âmbito ou na sequência de actividade objectivamente perigosa”, estabelecia, por sua vez, o artigo 18.

 

O Projecto de Lei da Acção Popular previa ainda a criação de um fundo de promoção e tutela dos direitos e interesses difusos, que seria responsável pela gestão dos valores das indemnizações globais fixadas por violação daqueles direitos.

 

No que toca à titularidade do direito à indemnização, o artigo 19 defendia que, no caso de violação de interesses colectivos, a respectiva colectividade, quando dotada de personalidade jurídica, seria titular da indemnização.

 

“No caso de violação de interesses difusos, os respectivos titulares integrados numa comunidade ou num grupo, residentes numa determinada área geográfica ou de outro modo identificados”, seriam titulares. Já no caso de violação de direitos ou interesses públicos, o Estado, a autarquia local ou a entidade pública seriam titulares dos interesses violados.

 

Quanto à intervenção dos particulares no exercício da acção penal popular, o Projecto de Lei estabelecia: “aos cidadãos e às associações titulares do direito de acção popular é reconhecida legitimidade para apresentarem denúncia, queixa ou participação ao Ministério Público contra os agentes das infracções previstas na presente lei que se revistam de natureza criminal, bem como para se constituírem assistentes nos respectivos processos, nos termos da legislação processual penal”.

 

“No processo de elaboração dos planos e programas de desenvolvimentos do sector público, dos planos de urbanização e ordenamento do território, bem como na tomada de decisão sobre a localização e realização de obras públicas ou de outros investimentos de grande impacto, o Estado, as autarquias locais e demais pessoas colectivas de direito público ouvirão sempre os cidadãos e as associações de defesa dos interesses difusos ou colectivos que possam vir a ser afectados por aqueles planos ou decisões”, dizia o documento, no seu artigo 22.

 

Já no artigo 27, o Projecto de Lei defendia que os agentes da administração central e local do Estado e todas as pessoas jurídicas de direito público tinham o dever de cooperar com as partes intervenientes em processo de acção popular. O referido dever abrangia a passagem de certidões ou a prestação de informações que as partes considerassem necessárias ao êxito ou à improcedência do pedido, desde que não se tratasse de documentos e informações que constituíssem segredo de Estado ou de justiça.

 

“O agente da administração ou de qualquer pessoa jurídica pública que, injustificadamente, recusar, retardar ou omitir os dados ou informações, solicitados, incorrerá em responsabilidade civil e disciplinar”, estabelecia o Projecto que se encontra engavetado no Parlamento. (Carta)

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