Já não será qualquer indivíduo a ser punido por ter publicado informação classificada sobre o terrorismo, mas, sim, o funcionário ou agente de Estado que publicar a referida informação, enquanto tem a responsabilidade de mantê-la em segredo.
A inovação foi anunciada ontem pelo Presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade da Assembleia da República, António Boene, durante a discussão, na especialidade, da Lei nº 5/2018, de 2 de Agosto, que estabelece o regime jurídico específico aplicável à prevenção, repressão e combate ao terrorismo e acções conexas aos actos e organizações terroristas.
Apresentando o parecer da 1ª Comissão da Assembleia da República (a mais importante do parlamento moçambicano), Boene afirmou que o polémico artigo 19 (agora artigo 20), que criminalizava a divulgação de informação classificada e disseminação de alertas sobre possíveis ataques terroristas, ganhou uma nova redacção, passando a punir servidores públicos que “vazam” informação classificada e aqueles que supostamente propalam boatos.
Assim, segundo Boene, o artigo 20 determina, no número 1, que “aquele que, por dever legal, tiver custódia ou sendo funcionário ou agente do Estado aceder à informação classificada por qualquer meio a divulgar, no âmbito da presente Lei, é punido com pena de prisão de 12 a 16 anos”.
Significa, isto, que a nova redacção penaliza apenas os funcionários e agentes do Estado que “vazarem” informação classificada relacionada com o terrorismo e não qualquer indivíduo, tal como previa a redacção anterior. “Aquele que, por qualquer meio, divulgar informação classificada no âmbito da presente Lei, é punido com a pena de prisão de 12 a 16 anos”, dizia o número 1 do polémico artigo 19.
Já o número 2 do mesmo artigo, que até a sua aprovação na generalidade (na quarta-feira) penalizava a divulgação de qualquer informação relativa à possibilidade de ocorrência de um ataque terrorista, ganhou o seguinte texto: “aquele que, sendo moçambicano, estrangeiro ou apátrida, residindo ou encontrando-se em Moçambique, fizer ou reproduzir publicamente afirmações relativas a actos terroristas, que sabe serem falsas ou grosseiramente deformadas, com intenção de criar pânico, distúrbio, insegurança e desordem públicas, é punido com penas de 2 a 8 anos de prisão”.
A anterior redacção dizia o seguinte: “aquele que intencionalmente difundir informação, segundo a qual, um acto terrorista foi ou é susceptível de ser cometido, sabendo que a informação é falsa, é punido com a pena de prisão de 8 a 12 anos”.
As remodelações resultam de críticas feitas pela opinião pública. A primeira crítica veio do MISA-Moçambique, que denunciou o risco de a nova lei coartar as liberdades de expressão e de imprensa. Para a organização, o artigo 19 constituía um enorme retrocesso aos ganhos alcançados com a aprovação da Lei nº 34/2014, de 31 de Dezembro (Lei do Direito à Informação) e do respectivo Regulamento (Decreto nº 35/2015, de 31 de Dezembro).
Mesma opinião foi expressa pelas bancadas parlamentares da oposição, Renamo e MDM (Movimento Democrático de Moçambique), durante o debate da proposta na generalidade. As duas bancadas parlamentares defendiam também que o nº 2 do artigo 19 (hoje artigo 20) era inconstitucional.
A Lei, sublinhe-se, foi aprovada ontem na especialidade, com a Frelimo a votar a favor, a Renamo a votar contra e o MDM a optar pela abstenção. A Renamo disse ter votado contra lei, devido a manutenção do número 2 do polémico artigo. (Carta)