Director: Marcelo Mosse

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Uma das maiores dificuldades (e quotidiana) dos moçambicanos prende-se com a localização de um determinado endereço físico. Acredito que o leitor já esteve inúmeras vezes na situação de explicar a alguém ou a de ser explicado (sobretudo ao telefone) onde se localiza determinado sítio. Imagino a dificuldade enfrentada por ambos sobre algo que a partida parecia óbvio. Nesta situação é normal que se desista ou se recorra a outra (s) pessoa (s) tanto do lado de quem explica como do aquém é explicado. E mesmo assim: da mata densa não sai nenhum coelho.
 
Assim ocorre com o processo de desenvolvimento do país. O exemplo mais flagrante é o da Ajuda ao Desenvolvimento capitaneada pelos países mais ricos do Ocidente em apoio aos países pobres, na sua maioria africanos. O Ocidente se esforça às estopinhas para explicar aos países receptores da sua ajuda, incluindo Moçambique, como se chega ao desenvolvimento. E para tal, fora a explicação (técnica), aloca avultados recursos financeiros e equipamento para tornar o caminho menos penoso e célere. 
 
Há mais de seis décadas que se anda nisto e os países receptores da ajuda ainda não localizaram o desenvolvimento. Onde está o problema? No explicador  ou no  explicado? 
 
No primeiro e corriqueiro exemplo fiz referência a desistência e a mudança de uma das partes ou ainda de ambos como uma das saídas do imbróglio. Neste sentido e face as dificuldades na localização do desenvolvimento as mesmas hipóteses deviam ser equacionadas como uma das saídas para o caso da localização do endereço do desenvolvimento.
 
Atendendo que o arrolado é um assunto de extrema urgência é caso para que se diga que os dois factos requerem – pelo menos entre portas nacionais - a necessidade urgente de uma profunda reflexão relativamente às dificuldades experimentadas pelos moçambicanos na forma de chegar a um determinado endereço físico e na de localizar o desenvolvimento.  
 
Até lá fica a deixa: não se pode localizar o endereço do desenvolvimento sem que se domine previamente a localização de um simples endereço físico. Todavia, havendo uma ténue possibilidade e necessidade, fica um apelo para o ano de 2020: quem ajuda aos interessados a localizar o endereço do desenvolvimento de Moçambique ?
segunda-feira, 23 dezembro 2019 07:01

O asno e a moça

Imobilizou-se repentinamente na berma do passeio, perscrutou o ambiente que residia na via depois de olhar para esquerda e para a direita, carros, bicicletas e pessoas moviam-se rapidamente de um lado para o outro, numa azáfama que caracterizava a cidade de Quelimane no fim do dia laboral.

 

Ela ensaiava pousar o pé direito na estrada, mas o medo demovia-lhe de tal aventura.

 

Um carro passou rente ao passeio ela deu um pulo para trás, franziu a teste e a sua jovialidade ficou subtraída naquele acto.

 

O seu cabelo oleoso com brilhantina reluzia quando as folhas da acácia deixavam escapar tiras de sol, o seu rosto completamente maquiado era evidenciado pelo batom vermelho pronunciando os lábios e para rematar os seios erectos agregavam os seus dotes femininos. Usava uma saia de caqui castanha que combinava com a sua tez escura e uma blusa branca sem mangas. Calçava umas sandálias pretas que deixavam visíveis as unhas pintadas.

 

Um homenzinho acantonado na esplanada gesticulava ininterruptamente procurando captar a atenção do atarefado servente, ignorado por este o senhor levantou-se e toda a extensão da sua altura mediana ficou exposta. Gesticulou mais umas vezes até ser descoberto.

 

Quando estava para sossegar no seu acento e esperar pelo atendimento eis que descobre a moça na sua tentativa de atravessar a rua. Arregalado não perdia de vista o pequeno espectáculo.

 

- Sim faz favor – abordou o servente, distraindo-o

 

- Um café – disse sem tirar os olhos da moça

 

Quando o café prontamente chegou, absorveu num trago pediu a conta e retirou-se energizado ao encontro da moça.

 

Quando a alcançou abordou-a:

 

- O que se passa moça? perguntou solícito.

 

- Tenho medo.

 

- Vamos – convidou ele.

 

Um pico da sua pulsação cardíaca sacudiu o seu peito quando ela segurou a sua mão esquerda, caminharam calados pelo passeio até ao semáforo, ele esperou que o vermelho brilhasse e então iniciaram a travessia pela passadeira. Este conctato físico fez com que ele libertasse gotículas de suor que sulcaram pela testa apesar da frescura vespertina.

 

Quando finalmente alcançaram a outra margem da via, ele quis se libertar da mão dela apesar de estar a gostar do calor que ela transmitia, mas a rapariga continuou segurando firme.

 

- Tenho medo de atravessar as estradas ajuda-me a chegar a paragem de chapa? – solicitou timidamente.

 

O homenzinho demorou a responder, apreciando a beleza que ela emanava.

 

- Sim, sim – disse sem pensar completamente enfeitiçado pela sua beldade.

 

Taxistas de bicicletas pedalavam em fila indiana conversando animados com os seus respectivos passageiros.

 

Continuaram caminhando de mãos dadas como um casal de namorados atravessando as vias a caminho da paragem.

 

Quando alcançaram a terminal de transportes semi-colectivos o último chapa acabava de partir superlotado, bufando pela via em direcção a Nicoadala.

 

Eles entreolharam-se calados, já passavam das 18h aquela hora era improvável que conseguisse um carro que a levasse para o seu destino.

 

- Como te chamas? – perguntou-lhe repentinamente o senhor preocupado.

 

- Zainabe – respondeu - não sei como faço vivo em Nicoadala, não sei onde vou passar a noite – desabafou ela entristecida.

 

Arrojado no espírito solidário o senhor avançou com uma proposta:

 

- Podes passar a noite no hotel onde estou hospedado e de manhã segues para o teu destino.

 

Ela anichada na oferta que acabava de receber, ficou divagando digerindo a boa nova.

 

- Obrigado senhor – titubeou ela.

 

- Trata-me por Juventino – afirmou ele afável. 

 

Uma dupla timidez conferia a caminhada um ambiente tenso, até que ele recebeu um zéfiro no coruto descabelado e então lembrou de perguntar.

 

- O que fazes?

 

- Perdi a matrícula escolar e agora faço pequenos negócios.

 

Um bando de marriés partiu num voo rasante e foi ganhando altitude gradualmente em busca dos seus ninhos.

 

Os candeeiros das vias já brilhavam para minimizar a escuridão que chegava com a noite, eles caminhavam lado a lado sem pressa de chegar.

 

- O que fazes cá? – perguntou ela envolta na sua timidez suburbana

 

- Estou de passagem venho de Maputo e amanhã parto para Mocuba em missão de serviço – replicou à vontade.

 

Antes de se embrenharem no hotel pararam num restaurante e tomaram uma leve refeição.

 

Encontraram a recepcionista embrenhada no seu telemóvel, Juventino pigarrou para não a assustar.

 

- Chave 14

 

Sentaram-se no sofá da recepção, ela ofereceu-lhe um olhar benevolente pelo acolhimento oferecido. Ele replicou o gesto com um sorriso terno antes de lhe falar.

 

- Podemos dormir no mesmo quarto pois, possui duas camas – alertou para evitar qualquer mal-entendido.

 

Ela ponderou demoradamente antes de proferir qualquer resposta, como se buscasse na sua mente a afirmação mais acertada.

 

- Sim podemos – sussurrou ela meio acanhada.

 

Seguiram pelo corredor em direcção ao quarto sob o olhar inspectivo da recepcionista.

 

Cavaquearam durante horas enquanto o sono não chegava, falavam disto e daquilo, como velhos amigos. Primeiro foi ela que bocejou e logo Juventino ficou contaminado.

 

- Boa noite! – sussurrou ensonado.

 

Um elemento calorifico conferiu um aumento substancial da temperatura corporal, ele despertou não demorou muito para encontrar Zainabe ali na sua cama completamente nua.

 

O impulso animal catapultou-o para cima dela, não demorou muito para o gemido unilateral expelido por ela catapultasse mais a sua apetência carnal.

 

Evoluíam no coito libertando duplo gemido sonoro que confiscava o silêncio da noite, copulavam selvaticamente como verdadeiros animais indistintos de qualquer norma ética que aprisiona os humanos. Ela animada pelo vigor do seu parceiro derrubou e trepou-o, assumindo agora a liderança movia-se devagarinho sentindo cada centímetro da penetração nos seus múltiplos nervos genitais. Gozava e gozava mais ainda quando via Juventino rendido a sua grandeza de governante do prazer.

 

Suavam e esse odor tornava-se num perfume afrodisíaco que excitava mais o ritual sexual.  

 

O domínio dela demorou o tempo suficiente dele se revigorar, saiu debaixo e posicionou-se por trás reiniciou a penetração com uma das mãos segurava um dos seios e com outro a omoplata, movia-se rapidamente fazendo com que ela deixasse escapar pequenos grunhidos. O acto demorou pouco mais de vinte minutos até que a sua euforia masculina encheu o balão que lhe revestia o órgão genital, ela sentiu aquela volúpia sensacional deixando os músculos afrouxarem completamente relaxados. Ele libertou um suspiro e capturou todo o oxigénio que pode para refrescar o seu ser agora também mais descontraído.

 

Deixaram-se cair na cama, respirando fundo, descobrindo o teto escuro, cada um pensou em nada ainda apreendidos pelo prazer que haviam sentido. Encontraram espaço na pequena cama e adormeceram.

 

A manhã encontrou-os ainda dormitando estafados pelo exercício nocturno, o pio dos pássaros, o som dos motores, misturada com a vozearia popular compunham um alarme madrugador.

 

Descobriram-se mutuamente com a luminosidade fosca que entrava pelas cortinas.

 

Ela desembarcou da cama que lhe acolhera completamente despida, caminhou pelo soalho em direcção ao quarto de banho, deixando bem evidente cada parte do seu formoso corpo na passada lenta que executava, não era a mesma menina que temia atravessar a estrada, era outra, toda poderosa, ele todo babado limpou os olhos remelados com as mãos para capturar cada quadro daquele movimento soberbo.

 

Mil projecções eróticas chegaram a sua mente quando a perdeu de vista, não sabia o que fazer estava agora vigiado pela luz diurna.

 

Quando ela reapareceu a tela voltou a ganhar vida Juventino pulou da cama completamente nu o seu membro viril erecto desafiava a força de gravidade e pulsava ao ritmo cardíaco. Arrebatou-lhe de encontro a parede levantou-lhe a perna direita descobriu o manto de pelos púbicos com o seu falo e entrou, o movimento de vaivém foi ganhando cadência, as suas matunas iam serpenteando seu membro viril, ela soltou um vagido e logo ele beijou-a. A sua boca ora a beijava ora sugava os seios, ela o abraçava e arranhava nesse momento de êxtase sublime. Quando finalmente derramou o fluido seminal libertou um suspiro e a largou. Ela caminhou para se preparar e ele dirigiu-se ao quarto de banho.

 

Juventino encontrou-a se maquiando e foi-se preparando para deixarem o hotel.

 

– São dez mil meticais – disse ela estreando as palavras nessa manhã de quinta-feira

 

Ele percebeu que ela emitira um som, mas não foi capaz de descodificar.

 

– Não ouviste eu disse que são dez mil! – voltou a proferir alto e serena.

 

– Dez mil de quê? – perguntou ele estupefacto.

 

– Pelos serviços da noite passada e desta manhã – conferiu ela e toda a meiguice de moça inocente ficaram dissipadas.

 

– Menina você não esta boa, quem te mandou vir para minha cama nua? – disse ele com a voz tremula deixando transparecer algum nervosismo.

 

– Senhor eu não sei quero meu dinheiro. – gritava ela.

 

– Você é puta? – questionou visivelmente fora de si. 

 

– O que eu sou não interessa, quero o meu dinheiro senhor.

 

Ele não quis divagar em busca de qualquer interpretação ainda sentia nas suas entranhas o gozo do sexo que tivera.

 

– Vamos embora, preciso de viajar - disse ele.

 

Já na rua uma baforada de ar fresco renovou-lhe o ânimo caminhava meio apressado e ela logo ali no seu encalço. Eram nove horas, não tinha tomado o pequeno almoço, estava sem apetite, precisava mesmo de apanhar o carro para Mocuba. Ela interrompeu a sua caminhada prostrando-se a sua frente.

 

Uma passageira montada na garupa de um táxi bicicleta pede o condutor para parar quer presenciar o pequeno espetáculo onde um grupo de jovens uniformizados que estavam a caminho da escola já fazem parte dos espectadores.

 

– Estou a pedir pagar-me senhor! - diz muita convicta.

 

Ele fuzila-lhe com um olhar vítreo afasta-lhe de seu caminho e continua o seu percurso apressando o passo. Ela alcança-o logo de seguida e pega-lhe pelo cinto. 

 

O pequeno público liberta murmúrios animados ainda lhes seguem até perderem interesse.

 

Quando Juventino percebeu que ela não desarmava das suas intenções convidou-lhe a irem a um posto policial.

 

– Não vou a lado nenhum até você dar o meu dinheiro – agora ela gritou.

 

Já tinha alcançado a terminal de autocarros para os distritos da província. 

 

Um a um ia chegando curiosos desocupados para se entreter com o pequeno espectáculo que ela investia.

 

Juventino começava a sentir-se acossado com a determinação da moça segurou-lhe pela mão e mudaram de posição para fugir os mirones.

 

– Não tenho esse dinheiro.

 

– Paga-me.

 

O homem desesperado puxou da carteira tirou o dinheiro que tinha e antes de conferir ela confiscou-o.

 

Ele olhou pasmada para ela sem sabe o que fazer e dizer.

 

Eram sete mil e quinhentos meticais, ela ainda tirou quinhentos e ofereceu-lhe para que ela apanhasse o chapa para Mocuba. Depois largou um sorriso trocista.

 

– Estás arrependido nem!

sexta-feira, 20 dezembro 2019 08:06

Senhor deputado Galiza, conta outra!

Circula nas redes sociais uma carta supostamente da autoria do deputado da bancada parlamentar do partido FRELIMO, Edmundo Galiza Matos Júnior, falando do diploma de honra atribuído pela FRELIMO ao pseudo-profeta Joe Williams. Na suposta missiva o deputado Galiza escreve ao Secretário-Geral da FRELIMO, Roque Santeiro... digo Silva, um "Pedido de revogação de diploma ao Sr. Joe Williams" porque "o cidadão em causa, Joe Williams, não gozar de uma postura pública que se funde nos ideias do Partido de que somos membros (...)". Os argumentos do deputado Galiza Matos Júnior alicerçam-se nos Estatutos do partido. 

 

A indignação do deputado Galiza é legítima. Todos nós estamos indignados com este reconhecimento do cinquentenário a este  eclesiástico "swegga". Mas, se, de facto, a carta que circula nas redes sociais é do punho do digníssimo deputado, então estamos perante um populismo de proporções titânicas. 

 

UM: em primeiro lugar, o deputado Galiza devia se indignar com o seu próprio partido FRELIMO por ter aceite o apoio de um cidadão com uma postura pública indecente. Isso é o mais importante. O digníssimo deputado não deve ficar enfurecido pelo diploma de honra. Um diploma é um reconhecimento. E se houve reconhecimento é porque houve um préstimo, um favor. E, quanto a mim, é o favor que devia estar em causa. É que, se o partido FRELIMO não tivesse aceite os préstimos do pouco-posturado-profeta, não haveria motivos para diplomas de honra. Então, o problema não está no diploma em si, mas - sim - na falta de pudor do partido FRELIMO. 

 

Pela lógica, o deputado Galiza devia repudiar os apoios que o seu partido tem estado a receber. 

 

DOIS: o que é pior: Manuel Chang ou Joe Williams; as dívidas ocultas ou o diploma de honra? É que não vimos a mesma indignação aquando da descoberta das dívidas ocultas. Não vimos nem ouvimos a indignação do deputado Edmundo Galiza Matos Júnior enquanto membro e porta-voz da bancada parlamentar da FRELIMO na Assembleia da República. Não vimos! Muito pelo contrário, assistimos a argumentos de defesa acérrimos às dívidas e ao seu camarada deputado Manuel Chang. 

 

É muito populismo barato. É muita indignação por conveniência. O deputado e porta-voz Galiza apoiou a aprovação da inclusão das dívidas ocultas no Orçamento do Estado feita apenas pela sua bancada. Tem estado a assistir as demarches de apoio e resgate do "Chopstick" feita pelo seu partido. Tem estado a aplaudir os insultos protagonizados pelos seus pares. 

 

Então, digníssimo camarada deputado, conta outra! Eu não caiu nessa! O seu partido aceitou a oferta do Joe Williams durante a campanha. O seu partido reconheceu os préstimos do Joe Williams durante a campanha. Se é para nos indignarmos, comecemos então do princípio. Comecemos pelas dívidas e pelo "Chopstick". Fora isso, é puro populismo mascarado. Só que nós estamos atentos. Nos conhecemos quem é quem.

 

Se a carta e a conta do "feici" não forem suas (e espero que não sejam mesmo), peço, antecipadamente, as minhas sinceras desculpas. 

 

- Co'licença!

quinta-feira, 19 dezembro 2019 07:23

A adrenalina do Código Penal

Não sei vocês, mas eu "pessoalmente" estou a gostar dessa nova revisão do Código Penal promulgada pelo Presidente da República esta semana. Acho que vai dar alguma adrenalina nessa cena de publicar imagens ou informações escondidas. Para falar a verdade, gravar ou publicar informação oculta não tinha piada. Faltava um Código Penal para dar uma apimentadinha. Faltava uma lei para aferir se o conteúdo publicado doeu ou não.

 

Nos nossos tempos de moleque roubavamos mangas, laranjas, goiabas, bananas e cana-doces de vizinhos. Os cotas ficavam "putos da vida" connosco e nós gramavamos maningue. E íamos roubar frutas daqueles cotas mais nervosos e temidos do bairro. Se tivesse cães maus em casa, melhor ainda. Era mais apetitoso. Ser mau e guarnecido era um bom chamariz. Era convidativo. Não havia nada mais relaxante do que ouvir a vizinha a insultar todo o bairro por causa de goiabas que você comeu sozinho a noite. Possas! A vizinha a disparar para tudo quanto é canto e você ali a ouvir numa "relex".

 

Vocês não fazem ideia de quão excitado estava o camarada que gravou o audio "eu não conheço o Nhangumele" na sessão do Comité Central. O néctar daquele audio é saber que foi feito e publicado à revelia. É saber que, se Guebas encontrasse o gajo, iria lhe dar umas boas sovas. Ou seja, se aquele audio tivesse sido gravado e publicado pelos canais oficiais do partido, não teria tido a piada que teve.

 

Confesso que estou muito excitado com essa tal promulgação. Esse tipo de coisas são "naicis". É como bolar uma "beibi": quanto mais difícil, melhor. A gente morre aí mesmo. A "drena" é outra. Se tiver irmãos que "djimam", é outra pontuação. Se o pai for polícia ou militar, yuuu "não-vala-pena".

 

O proibido é apetitoso. Nessa cena de áudios, vídeos, textos e afins só faltava mesmo uma lei que atrapalha para a coisa ter mais sal. Há uns anos inventaram uma lei de audiovisual e cinema que diziam que iria combater à pirataria. Hoje, feitas as contas, os estúdios do gueto aumentaram drasticamente. Aliás, hoje até vende-se disco pirata na esquadra.

 

Agora vai ter alguma piada gravar alguém escondido. Ter o prazer de ver um gajo a procurar advogados, com papelada do tribunal para cima e para baixo, tentado processar o gajo que lhe vazou o audio e você ali numa "relex" a palitar um atum imginario. Vai valer a pena o esforço. Não vou esconder, eu gosto de adrenalina.

 

- Co'licença!

quarta-feira, 18 dezembro 2019 06:51

Este Moçambique é nosso

Moçambique está eufórico pela vitória do Clube Ferroviário de Maputo à Taça de Clubes Campeões africanos de basquetebol em seniores femininos. Moçambique está em festa. Estamos em festa sem distinção de clube, raça, religião, gênero, altura, etnia, tamanho do pé, cabelo, escolaridade, etecetera. O Ferroviário uniu-nos. Hoje somos um só Moçambique. Somos todos moçambicanos.

 

Este Moçambique é nosso, e todos nós o queremos bem. Isto a propósito daqueles que acham que quando se exige que o bom nome de Moçambique seja cada vez mais lapidado e promovido é sinónimo de rebeldia. Aqueles compatriotas que pensam que o nome de Moçambique pode ser chamuscado, vulgarizado e qualquerizado sob o olhar impávido e sereno do seu povo. Aqueles concidadãos que pensam que a má fama de Moçambique além fronteiras deve nos agradar. Aqueles moçambicanos que não se indignam com a calhordice, com a canalhice, com a infâmia, com a humilhação, com a baixeza, com a mesquinhez, com a sordidez, com a sacanagem. 

 

Este Moçambique é nosso. Não estamos contra Moçambique nem contra os moçambicanos. Não somos inimigos da nossa própria pátria. Não conspiramos contra nós próprios. A nossa luta pela transparência e pela justiça social é por patriotismo. Não somos apóstolos da desgraça, mas também não queremos celebrar desgraça. Não queremos puxar saco de ninguém.

 

Quando exigimos que os Mambas vençam, não estamos contra a Federação Moçambicana de Futebol nem contra os dirigentes. Não estamos contra a ministra nem contra o seleciona-a-dor. Queremos apenas que a nossa seleção nos dignifique. Queremos estar entre os bem-falados. Queremos estar no pódio também. Tudo ao nosso nível, sem sonhar alto, sem marcar um passo maior que a perna. Queremos sonhar um sonho sonhável. 

 

Quando exigimos justiça sobre as dívidas ocultas, não estamos contra o Presidente da República, nem contra a Procuradoria-Geral da República. Quando exigimos que os gatunos sejam exemplarmente punidos, não estamos com inveja de quem-quer-que-seja. Antes desses gajos serem gatunos a vida deles nunca foi do nosso interesse. Nem os conhecíamos. Nunca estiveram na nossa agenda. 

 

Quando exigimos que Moçambique esteja melhor posicionado nos índices internacionais, é porque gostamos deste país. É porque queremos o melhor para nós. É porque queremos sair da cauda de tudo quanto é tabela classificativa. Não queremos a fama de um país "nhangumelizado". Não queremos ser conhecidos como o país que luta para resgatar "Chopsticks" da vida. Se tivermos que lutar contra a África do Sul ou contra os Estados Unidos que não seja por causa de um ladrão. 

 

Este país é nosso. É verdade que temos as nossas diferenças, mas quando Moçambique está no pódio unimo-nos, porque é esse o nosso desejo como povo. E é isso que cria (digo, devia criar) o belo em nós. É assim que uma dúzia de cores fazem o arco íris. É assim que as cinco cores fazem a nossa bandeira.

 

É assim que o Clube Ferroviário de Maputo faz connosco. Hoje o Ferroviário é o clube de todos nós. E é isso que queremos. Este Moçambique é nosso... muito nosso. Se nós não lutarmos por ele, ninguém o fará por nós. É por amor. Não estamos contra ninguém. Queremos apenas arrumar a casa e nesse processo as vezes temos de sacudir a poeira. E como diz o pai de Boustani, há muita poeira. 

 

Parabéns ao Clube Ferroviário de Maputo pela vitória. Meninas, não é apenas a vossa vitória que nos orgulha, é, acima de tudo, a vossa luta, a vossa persistência e a vossa abnegação em levar o nome de Moçambique ao topo. O que nos orgulha é a vossa negação à qualquerização. É a vossa briga pela NOSSA honra que nos enche de amor-próprio.

 

Obrigado por nos fazerem uma nação! Num momento conturbado como este a UNIÃO faz-nos muita falta. 

 

- Co'licença!

terça-feira, 17 dezembro 2019 13:09

Samukhela

A primeira coisa que fiz, ao entrar no pequeno autocarro que vai-nos levar a Massinga, foi olhar para o condutor no sentido de tentar avaliar a sua compostura global. Estou sentado no banco da frente, lado a lado com o dito cujo, do qual ainda não tirei nenhuma ilação. Ele tem a cadeira reclinada, com os dois braços a servirem de almofada, mas logo que se apercebeu da minha presença, mudou de posição. Endireitou o encosto, levando de seguida as mãos ao voltante de uma viatura que está inerte, à espera de completar a lotação. 

 

Virou-se para mim e saudou-me cordialmente, transmitindo a imagem de uma pessoa educada. É um velhote que já deve ter passado, de algum modo, a fasquia dos sessenta, porém nota-se ainda nele,  a robustez física de alguém com capacidade para enfrentar o asfalto e seus perigos. Mas essa é apenas a minha impressão, aliás, ainda nem sequer estamos em movimento, para aferir se tudo aquilo que sinto deste personagem, vai entrar em consonância com a realidade, quando estivermos  por sobre as pedras do caminho.

 

Estamos na Terminal da Maxixe, um lugar de bulício como toda esta urbe em alucinante crescimento. Lá fora não faltam os vendedores ambulantes que não páram de bater à nossa janela propondo-nos qualquer coisa para comprar. A canção dos cobradores, vulgo “mangueme” em bitonga, não tem pausa enquanto as pequenas viaturas não estiverem lotadas. É uma linda canção cantada por várias vozes joviais, que estão ali  na luta pela vida: Massingaaaaa! Vilankulooooooo! Inhassoroooooo! Chicuqueeeeee! Morrumbeneeeeee! E a imagem dos veículos perfilados, também é bela. Parece a arrumação dos versos que vão compor uma quadra para Rosa Chicuachula, de Amin Nordin.

 

Já estamos a partir, como uma aeronave que rola lentamente até ao fim da pista, para de lá convocar a força máxima dos motores. Dentro do carro há um silêncio, e se esta manifestação não se chama silêncio, então é um agradável sussurro. Parece o murmúrio do próprio mar que se estende aqui à nossa frente, com a cidade de Inhambane do outro lado. Isto é uma levitação.

 

O condutor apela-me ao aperto do cinto de segurança, e já livre do frenesim, próprio das cidades moçambicanas onde todos vendem e todos querem comprar, eis que liga o aparelho de música, que não vai, mesmo assim, perturbar o silêncio que reina aqui dentro. É Gimo Remane que canta para uma plateia em movimento, levada por um velhote sereno, como tudo o que está a sua volta. A música de Gimo não abalroa, quanto mais não fosse, ela sai de um volume quase imperceptível, como as próprias vozes dos utentes deste pequeno autocarro que desliza suave. Ou seja, há três silêncios audíveis neste interior, o do motor do carro, dos passageiros, e de Samukhela, a música desse makhuwa que nos embala. 

 

Naquele ambiente as palavras serão supérfluas. Para quê as palavras, se elas estão completas nesta música! Para quê as palavras, se o silêncio já nos chega, como o próprio amor, que não se faz com palavras, mas com o silêncio e o doce gemido! O resto foi uma viagem leve, que terminou com a nossa chegada ao lugar mais efervescente da província de Inhambane, ouvindo Sibongile Khumalo, no seu retumbante  Mountain shade.