“Decidi que não posso e não farei campanha pelo ANC de Ramaphosa. Não é o ANC ao qual me juntei. Seria uma traição fazer campanha pelo ANC de Ramaphosa. A minha consciência não permitirá isso”
Jacob Zuma citado por Carta de Moçambique
“As fissuras que se foram criando no seio do ANC nunca tiveram impacto imediato, mas, a médio prazo, fazem-se sentir. É o caso de Malema. Se não tivesse convicções próprias, este partido já não existiria no plano político da África do Sul, contudo, depois de muito tempo, começa a fazer e criar problemas ao ANC. Lembrar que Julius Malema foi o Presidente da Ala Juvenil do ANC quando deixou o ANC e goza de muita popularidade. A questão que se coloca é: estará em condições Jacob Zuma de lutar para colher frutos daqui a 10 anos, ou seja, quando tiver qualquer coisa como 92 anos! Não me parece e pode ser o fim de uma carreira política com muitos solavancos à mistura”
AB
O Antigo Presidente do ANC e da África do Sul, Jacob Zuma, foi quase sempre uma figura controversa no seio do próprio ANC. Nascido a 12 de Abril de 1942, Jacob Zuma filiou-se ao Partido ANC aos 17 anos, ou seja, em 1959. Em 1963, integra o braço armado do ANC, Umkonte Wa Sizwa e, no mesmo ano, é preso a tentar sair do País, com mais 45 camaradas e recrutas do ANC. Acusado de conspirar contra o Governo do Apartheid, foi condenado a 10 anos de prisão, que cumpriu em Robben Island, no mesmo local onde Nelson Mandela se encontrava a cumprir a sua pena.
Saiu da prisão em 1973 e, entre 1973 e 1975, esteve na frente interna de mobilização de membros do ANC em Kwazulo Natal, sua terra natal. Em 1975, foge e exila-se no exterior e, entre os países onde mais viveu nesse período, destaque vai para a Swazilândia, Moçambique e Zâmbia, para além de outros onde desenvolvia as actividades do seu partido. Regressou à África do Sul em 1990, quando, o então Presidente da África do Sul, Frederik de Klerk decidiu não criminalizar as actividades políticas do ANC e de outras organizações.
Jacob Zuma viria a presidir o ANC em Dezembro de 1994 e, entre 1999 a 2005, serviu a nação sul-africana como vice-Presidente do País, sendo o Presidente Thabo Mbeki. A 02 de Junho de 2005, o Tribunal associa o vice-Presidente Jacob Zuma ao escândalo de Armas em associação ao empresário Schabir Shair, um escândalo que o viria a perseguir pelo período subsequente.
Contudo, Jacob Zuma foi sobrevivendo de julgamento em julgamento e, a 26 de Abril de 2009, ganha eleições com maioria absoluta, o que lhe possibilitaria ascender ao cargo de Presidente da África do Sul, tomando posse a 09 de Maio de 2009. A 07 de Maio de 2014 é reeleito Presidente da África do Sul e, a 13 de Fevereiro de 2018, após deliberação interna, o ANC exige a renúncia de Zuma, sem, no entanto, definir uma data para o cumprimento desta decisão.
Como se pode depreender, Jacob Zuma é uma figura relevante no Xadrez político do ANC e da África do sul. Desde jovem, dedicou-se à causa da Nação e, a par disso, também foi fazendo vários atropelos à ética e moral interna no ANC. Foi, igualmente, cometendo crimes de vária índole e muitas das coisas não cabem nesta reflexão e, porque podem esvaziar o papel desta figura como militante Anti-Apartheid, decidi não trazer aqui.
A minha reflexão cinge-se noutro ponto: o que estará se passando mesmo no seio do ANC? Esta é, na minha opinião, a primeira pergunta que se deve fazer, sabido que, há menos de um mês, outro veterano do ANC declarou-se incompatível com a actual conduta deste partido, QUE APELIDAM DE ANC DE Ramaphosa! Será? Mas, olhando para os países africanos no geral, sobretudo, aqueles que ascenderam à independência com base na Luta de Libertação Nacional, aí se inclui a África do Sul, embora se saiba que a luta do ANC foi contra o regime segregacionista do Apartheid.
Jacob Zuma não encontra espaço, dentro do ANC, para ajudar a endireitar aquilo que ele próprio chama de ANC de Ramaphosa! Ou pura e simplesmente, ele não quer, de certa forma, ajudar a limpar porque os “Louros” seriam colhidos por Ramaphosa, que parece seu “inimigo” de estimação. A crise no seio do ANC pode derivar do facto de alguns aparecerem como muito ricos e outros mais pobres no seio do mesmo grupo, ou seja, a luta me parece mais de divisão de poder económico do que propriamente uma luta por diferenças na direcção do partido mais antigo na nossa região.
A luta interna no seio do ANC, que extravasa o espaço interno, pode ser mau exemplo para as restantes formações políticas da região e da África no geral. Parece-me estar a gerar a incapacidade de, entre camaradas, sentarem e resolverem as diferenças. A forma desprezível como Ramaphosa se pronunciou à saída de um outro veterano do ANC pode sugerir o fim destes partidos históricos de África. Aliado a isso, estes partidos já não se reúnem como faziam Samora Machel, Julius Nyerere, Kenneth Kaunda, Robert Mugabe, Samo Juma e outros. Esses dirigentes encontravam espaço de análise sobre como geriam as suas organizações. Hoje, as coisas parecem mudar, o pior é que é para o pior!
Adelino Buque