“(Item 1): Governar o mundo e controlar as riquezas do planeta - nossa política é dividir e conquistar, dominar, explorar e saquear para encher nossos Bancos e torná-los os mais poderosos do mundo; (Item 2): nenhum país do terceiro mundo é um estado soberano e independente; (Item 3): todo o poder nos países do terceiro mundo emana de nós, que o exercemos pressionando os líderes que são apenas nossos fantoches. Nenhum corpo no terceiro mundo pode assumir o seu exercício; (Item 4): todos os países do terceiro mundo são divisíveis e suas fronteiras móveis de acordo com nossa vontade. O respeito pela integridade territorial não existe para o terceiro mundo; (Item 5): todos os ditadores devem colocar suas fortunas em nossos Bancos para a segurança de nossos interesses. Esta fortuna será usada para doações e créditos concedidos por nós como crédito e ajuda ao desenvolvimento de países do terceiro mundo”.
In Carta do Imperialismo, Provisão Geral, Museu Real da África Central em Tervuren, Bélgica.
Na minha opinião, os problemas de África e de Moçambique devem ser vistos com base na chamada “Carta do Imperialismo”, concebida em Washington durante o comércio de escravos e negociada na Conferência de Berlim em 1885, aquando da partilha da África, uma partilha, como reza a história, sem os próprios africanos. Desde então, África tem sido aquilo que os europeus querem que seja e a eliminação de dirigentes lúcidos e comprometidos com os seus povos faz parte da estratégia traçada em Washington antes da partilha da África.
Quando no Item 5 se diz taxativamente: “todos os ditadores devem colocar suas fortunas em nossos Bancos para a segurança de nossos interesses. Esta fortuna será usada para doações e créditos concedidos por nós como crédito e ajuda ao desenvolvimento dos países do terceiro mundo”, isso espelha a realidade de hoje, em que quase todos os dirigentes africanos têm as suas fortunas nas antigas metrópoles ou em outros paraísos fiscais. A história recente mostra-nos, por exemplo, o destino da elite política de Angola em Portugal. O que lhe aconteceu? E nos outros países do mundo, incluindo Moçambique, a “novela” das dívidas ocultas mostra, igualmente, onde a fortuna de alguns moçambicanos se encontra domiciliada.
Também encontramos nessa “Carta do Imperialismo”, no Capítulo do “Regime Político”, Item 6, o seguinte: “todo o Governo e o Poder estabelecido por nós é legal, legítimo e democrático. Mas qualquer outro poder ou Governo que não emane de nós é ilegal, ilegítimo e ditatorial, qualquer que seja sua forma e legitimidade. Já no Item 7: qualquer poder que oponha a menos resistência às nossas injunções perde assim a sua legitimidade e a sua credibilidade. Ele deve desaparecer”. Ora, se dúvidas existiam, com este item sobre a Governação Política da “Carta do Imperialismo”, creio que foram dissipadas.
O caso do Níger é o exemplo paradigmático neste momento. Se o Golpe de Estado é legítimo ou não, não deve ser o ocidente a dizer ou a avalizar, é o povo do Níger que se deve pronunciar. Por aquilo que é o carinho que os golpistas recebem do seu povo, pode se assumir que este povo se revê nos militares do Níger. Contudo, tendo em conta o princípio segundo o qual “qualquer outro poder ou Governo que não emane em nós é ilegal, ilegítimo e ditatorial”, aqui temos a prova da aplicação à risca da chamada “Carta do Imperialismo”.
Os países africanos mobilizam-se para atacar os militares do Níger com o apoio, claro, da Europa e dizem de boca cheia que o “Golpe é ilegal”. Falta dizer que “não emana da Europa”. Os golpistas pretendem, desde já, verem-se livres das relações neocoloniais da França, seu antigo colonizador, que se retirou das colónias com base no acordo que oferece vantagem à França em detrimento dos cidadãos do Níger.
Muitos meus concidadãos não irão concordar, decerto, tal é a forma alienada em que estamos, mas as chamadas “dívidas ocultas”, segundo os contratantes, tinham um fim nobre, que colocava em causa os interesses ocidentais, em particular os que exploram a Bacia do Rovuma.
Moçambique queria se ver livre do sistema de monitoria de segurança montado por eles, que, segundo suas declarações, drenava milhares de USD semanalmente.
Também é verdade que usaram a parte fraca de nós moçambicanos, nomeadamente a vontade do enriquecimento fácil e de viver fora dos padrões dos nossos próprios rendimentos e puseram-se a facilitar tudo.
Se é verdade que, para a contratação da dívida por um Estado, é imperioso que a sua Assembleia aprove e que essa aprovação faça parte dos documentos a apresentar aos Bancos Europeus, por que razão eles aceitaram fazer a entrega do dinheiro sem que esse requisito fosse preenchido. Mas, no lugar de questionarmos isso, ficamos com vozes roucas, acusando em exclusivo os nossos de corruptos. Onde andam os corruptores? Esta equação tem os dois lados, os corruptos e os corruptores. Entretanto, aqui, mais uma vez, como a segurança marítima a aplicar não era do interesse europeu, teria de cair de qualquer jeito, por bem ou por mal e estamos nós aqui presos e dependentes deles.
As companhias que exploram a Bacia do Rovuma retiraram-se num momento crucial para Moçambique, quando tudo indicava que, mais dias menos dias, iria iniciar a exploração de Gás e tudo indicava um encaixe financeiro que pudesse livrar Moçambique da dependência Orçamental. E o que fizeram? Retiraram-nos o financiamento directo ao Orçamento do Estado. Pensavam que Moçambique iria “baquear” através da dívida interna. É verdade que falamos de esgotamento da capacidade de endividamento, mas isso também é normal.
Este bloqueio europeu e das instituições das Nações Unidas fez com que o desenvolvimento de Moçambique estagnasse, devido ao elevado custo do dinheiro. As instituições bancárias e outras de carácter de financeiro deram privilégio ao endividamento do Estado no lugar de injectar dinheiro à economia. Duas razões levaram a esta decisão, a garantia de que o Estado mais cedo ou tarde iria pagar os juros altos cobrados aos Bilhetes de Tesouro. Tudo isto foi feito de caso pensado, mas, internamente, aqueles que deveriam raciocinar através do olho de nação parece que ficam do outro lado, do lado dos subscritores da “Carta do Imperialismo”.
Como se não bastasse o acima exposto, a “Carta do Imperialismo” tem na sua terceira parte o capítulo que diz: “Tratados e Acordos (Item 8) - não negociamos acordos e tratados com países do terceiro mundo, impomos o que queremos e eles se submetem à nossa vontade”. (Item 9): “qualquer acordo concluído com outro país ou negociação sem o nosso aval é nulo e sem efeito”. No capítulo sobre Direitos Fundamentais, no seu Item 10, diz assim: “onde existem nossos interesses, os países do terceiro mundo não têm direitos, nos países do Sul, os nossos interesses vêm antes da Lei e do direito internacional”.
Ora irmãos africanos e moçambicanos em particular! Depois desta leitura, quais são as ilações a tirar desta “Carta do Imperialismo”? Continuamos à procura dos culpados do nosso insucesso ou devemos nos concentrar na fórmula para sair deste ciclo vicioso criado por essa famosa Carta! Continuamos a pensar que a morte de dirigentes africanos é outro infortúnio ou é algo pensado há bastante tempo!? No caso de Moçambique, a Agricultura definida constitucionalmente como sendo a “base do desenvolvimento” não sai do papel por incapacidade ou porque efectivamente estamos manietados. O ocidente, com destaque nos europeus, não quer o nosso desenvolvimento, por isso nos bloqueiam em tudo!