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quarta-feira, 01 março 2023 07:16

O canhu interrompido!

Escrito por

MoisesMabundaNova3333

Estávamos em fim de uma manhã em pleno Janeiro, onze e tal. Sol e calor eram intensos. Era dia 20!... Em casa do amigo Nhambire, algures na Matola Rio, para saborearmos um canhu. Era o primeiro do ano a ser tomado em grupo. A malta toda convidada, quase todos eles amigos, já estava ali, no primeiro copo… os mais gulosos já no segundo! A tecnologia… ultimamente, sempre a tecnologia, lembra que estou a perder um evento. Tinha-o posto na agenda, mas, ávido da bebida sagrada na zona sul do país, dele me esquecera. Abro o link, acedo ao canal e dou de caras com o evento: Simpósio Armando Emílio Guebuza, 80 anos!

 

Uma obra de arte, parecia uma sala de grande exposição. Excelente cenário, sala maravilhosamente bem concebida e decorada, wall banner artisticamente maravilha, um regalo à vista; o alinhamento do programa, anunciado pelo nosso confrade Chavana, magistral e oradores de primeira água. Continuei fisicamente no canhu, mas… concentradamente no peqenino ecrã do celular a acompanhar o simpósio. Na prática, abandonei a sessão do canhu do Nhambire! Era impossível ficar indiferente! Como o mundo mudou! Antigamente, só a presença física é que valia e, para tal, era preciso andar bem atrás dos convites… vimos de longe!

 

O evento levou toda a tarde, painel atrás de painel, orador/a atrás de orador/a. Houve de tudo: desde grandes interpretações artísticas como a de Xico Antônio, a excelentes comunicações e ou apresentações de acadêmicos de topo. Lá se ouviu de tudo: desde abordagens mais ou menos equilibradas a adorações, adulações, sacralizações ou endeusamentos. Houve quem chamou de simpósio de guebuzistas para adulação a Armando Guebuza, uma verdadeira procissão de endeusamento ao antigo chefe de estado! Opiniões e opiniões!

 

Um dos momentos mais altos, senão o mais alto, foi a intervenção algo enigmática do próprio homenageado. Naquela sua contundência verbal peculiar, não se fez de rogado nem piedoso: “...se o colonialismo português não conseguiu calar-nos, vencer as nossas convicções, não são os nossos camaradas que vão conseguir fazer…” - disparou um… B21!, para os estudiosos decifrarem. Eixxxi!... - como diria alguém indignado.

 

Podemos comparar o colonialismo aos camaradas do partido? Talvez. O ex-presidente terá muito provavelmente elementos suficientes para uma inusitada comparação. Não será algo exagerada? Talvez, mas, uma vez mais, o ex-chefe de estado terá as suas razões!

 

Agora, olhando para o conteúdo da proposição, será que é possível calar alguém? Será possível arrancar de alguém as suas convicções íntimas? Em devido tempo, Ernest Hemingway já contribuiu para uma possível resposta a esta pergunta: “Um homem pode ser destruído, mas nunca derrotado”! - disse o grande escritor americano. Acredito profundamente que, de facto, um homem com convicções pode ser destruído, sim, mas nunca vencido.

 

Mas, mais ainda: será que é possível calar a um antigo chefe de estado? É possível calar alguém com milhões e milhões de seguidores, alguns dos quais vimo-los no simpósio despindo-se até de suas personalidades e academicidades e endeusa-lo freneticamente? Não acredito. Não creio que seja possível calar a um homem modelo para meio mundo. Não creio que seja possível calar um homem de convicções muito fortes quanto Armando Guebuza, que, como disse, nem o colonialismo o conseguiu, menos os seus camaradas (incluindo Samora Machel) ao longo destes anos todos de militância.

 

Outrossim, também acredito que nenhum dos seus camaradas tenha a mais pequena intenção de calar Guebuza, ou arrancar-lhe as convicções. Pode haver divergências de todo o tamanho, mas… calar-lhe! I don’t think so! Visão míope?... talvez!

 

Compreendo e muito bem que o antigo chefe de estado, humano afinal de contas, peregrino, com sentimentos e emoções, esteja profundamente abalado com muitos desenvolvimentos de vária índole ocorridos após a sua saída do poder. Quem não estaria? Alguns de nós muito provavelmente colapsariam. Mas ele (e a família) aguentaram e continuam aguentando. São fortes, como bem o disse. Por isso, compreende-se perfeitamente o desabafo, não tanto mais do que isso... Não acredito que, com a idade que tem, ainda queira continuar a falar alto, ou muito alto.

 

Já falou alto bastante. Mais ou menos 80 anos, dado que começou muito cedo a… falar! Merece descanso. Mas merece também não ser calado!

 

Sir Motors

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