Os madodas da aldeia estavam, então, todos ali reunidos. Todos os 18 homens de idades acima dos sessenta anos da aldeia de Nwamati encontravam-se naquele momento ali embaixo daquela colossal sombra da mafurreira, sentados em cima de troncos de árvore grandes feitos bancos desde tempos imemoriais. Aquela era a terceira tarde, desde quarta-feira. As audiências, como dizemos hoje, eram somente nas tardes, das 14:30 para baixo, até não mais de 17:30 horas.
Consta que o velho Nwamati lidera a comunidade há mais de três gerações, tendo o exercício da soberania começado com o seu avô e depois passado para o pai e agora era ele, um homem agora na casa dos 75 anos, estatura mediana, mas com uma vitalidade de espantar.Consta que o velho Nwamati lidera a comunidade há mais de três gerações, tendo o exercício da soberania começado com o seu avô e depois passado para o pai e agora era ele, um homem agora na casa dos 75 anos, estatura mediana, mas com uma vitalidade de espantar.
A bandla lembrava as nossas salas de reunião em forma circular, com o líder no meio. No caso, era uma semi-circular. A cadeira feita essencialmente de paus, mas muito cômoda, do líder constituía o epicentro do semicírculo. De um e de outro lado, eram os bancos de troncos grandes que estavam prostradas no chão, sem precisar de pés ou de bases. Mas sentava-se comodamente e durante horas e horas! Mas o local não servia apenas para a resolução de problemas, mas também para outras cerimônias, como a de ukanhi, e convívios diversos.
Pois ali estavam os 18 madodas convocados de forma urgente na tarde quase noite de terça-feira pelo líder Nwamati para dirimir “um problema muito grave e urgente” do recentemente tornado criador de gado bovino Mudaukani na zona. Aliás, diga-se que os 18 velhos ali presentes eram na sua maioria criadores ou de gado bovino, ou de caprino e ovino, ou dos três tipos ao mesmo tempo; ou grandes agricultores, ou detinham outro tipo de influências. Eram, em suma, os mais influentes da região. Incluindo o velho Mathe, na casa dos 70 anos, cinco mulheres, neste caso o réu, na nossa linguagem jurídica portuguesa. Pelo que todos tinham experiência bastante de questões relacionadas com gado, agricultura, problemas sociais, etc. Aliás, alguém só se torna doda se socialmente for influente; caso contrário, mesmo que tenha 90 anos, não é considerado e não entra no clube dos dirimidores de problemas!Pois ali estavam os 18 madodas convocados de forma urgente na tarde quase noite de terça-feira pelo líder Nwamati para dirimir “um problema muito grave e urgente” do recentemente tornado criador de gado bovino Mudaukani na zona. Aliás, diga-se que os 18 velhos ali presentes eram na sua maioria criadores ou de gado bovino, ou de caprino e ovino, ou dos três tipos ao mesmo tempo; ou grandes agricultores, ou detinham outro tipo de influências. Eram, em suma, os mais influentes da região. Incluindo o velho Mathe, na casa dos 70 anos, cinco mulheres, neste caso o réu, na nossa linguagem jurídica portuguesa. Pelo que todos tinham experiência bastante de questões relacionadas com gado, agricultura, problemas sociais, etc. Aliás, alguém só se torna doda se socialmente for influente; caso contrário, mesmo que tenha 90 anos, não é considerado e não entra no clube dos dirimidores de problemas!
Mudaukani acabava de ascender ao clube de criadores de gado bovino na zona de Nwamati, graças às já doze cabeças que o filho, a trabalhar nas minas sul-africanas, tinha conseguido comprar com o dinheiro ganho no trabalho nas minas de Tembisa e deixado na guarida dele faziam quatro anos, numa das suas vindas de livi (licença para férias aos mineiros). Começou com sete cabeças e foram crescendo até àquele número. A partir de então, Mudaukani já pertencia ao clube dos verdadeiros madodas. É que, para ser madoda, tinha que ser criador de verdade, ter por aí gado que ascendia a 15, 20 cabeças por um considerável período de tempo e ter, pelo menos, três esposas. Mudaukani acabava de ascender ao clube de criadores de gado bovino na zona de Nwamati, graças às já doze cabeças que o filho, a trabalhar nas minas sul-africanas, tinha conseguido comprar com o dinheiro ganho no trabalho nas minas de Tembisa e deixado na guarida dele faziam quatro anos, numa das suas vindas de livi (licença para férias aos mineiros). Começou com sete cabeças e foram crescendo até àquele número. A partir de então, Mudaukani já pertencia ao clube dos verdadeiros madodas. É que, para ser madoda, tinha que ser criador de verdade, ter por aí gado que ascendia a 15, 20 cabeças por um considerável período de tempo e ter, pelo menos, três esposas.
Num belo dia, a pequena manada de Mudaukani foi calhar com a do velho Mathe no rio a beberem água. Mathe tinha mais de 20 cabeças, entre vacas, touros, novilhos e vitelos. Até hoje, nenhum criador revela o verdadeiro número das cabeças que possui. E eis que o touro principal da manada do velho Mathe ataca uma das vacas da manada de Mudaukani. E aí começou a guerra… mundial! O principal touro entra em guerra com o também principal touro da manada do velho Mathe! A guerra foi total e… sem tréguas! A luta foi titânica e nisso o touro do Mathe atinge a perna direita frontal do touro de Mudaukani e parte-a!… e o touro ficou estatelado no rio até…hoje!Num belo dia, a pequena manada de Mudaukani foi calhar com a do velho Mathe no rio a beberem água. Mathe tinha mais de 20 cabeças, entre vacas, touros, novilhos e vitelos. Até hoje, nenhum criador revela o verdadeiro número das cabeças que possui. E eis que o touro principal da manada do velho Mathe ataca uma das vacas da manada de Mudaukani. E aí começou a guerra… mundial! O principal touro entra em guerra com o também principal touro da manada do velho Mathe! A guerra foi total e… sem tréguas! A luta foi titânica e nisso o touro do Mathe atinge a perna direita frontal do touro de Mudaukani e parte-a!… e o touro ficou estatelado no rio até…hoje!
Mudaukani, sentindo-se, bastante ofendido, com incalculáveis prejuízos causados, foi apresentar queixa ao líder Nwamati e exigir que o velho Mathe lhe compense o grande dano com outro touro!Mudaukani, sentindo-se, bastante ofendido, com incalculáveis prejuízos causados, foi apresentar queixa ao líder Nwamati e exigir que o velho Mathe lhe compense o grande dano com outro touro!
A assembleia dos madodas ali estava a dirimir o problema, já indo na terceira audiência. A assembleia dos madodas ali estava a dirimir o problema, já indo na terceira audiência.
O líder ouviu a apresentação da queixa e entregou o caso ao que hoje chamamos plenário! As opiniões dividiram-se. Umas, considerando que o touro do velho Mathe era culpado e, portanto, havia espaço de o touro ferido ser reposto; outras, a considerarem que os pastores são culpados por terem levado as manadas a irem beber água ao mesmo tempo e que portanto deviam ser responsabilizados; e outras ainda a considerarem que o incidente tinha sido fortuito e que não havia nada a fazer. O líder ouviu a apresentação da queixa e entregou o caso ao que hoje chamamos plenário! As opiniões dividiram-se. Umas, considerando que o touro do velho Mathe era culpado e, portanto, havia espaço de o touro ferido ser reposto; outras, a considerarem que os pastores são culpados por terem levado as manadas a irem beber água ao mesmo tempo e que portanto deviam ser responsabilizados; e outras ainda a considerarem que o incidente tinha sido fortuito e que não havia nada a fazer.
Aquele era a terceira tarde do que hoje chamaríamos de julgamento do “caso do touro do Mathe”! E a exortação do líder era que naquele dia tinha que sair dali uma decisão, tipo sentença!, pois o caso estava a arrastar-se por muito tempo e havia que se decidir sobre o que fazer com o touro estatelado perto do rio. O ambiente, ainda que houvesse posições divergentes, era calmo e sereno. Próprio de pessoas bem maduras e socialmente responsáveis. Nisso, o velho Nwamati lembra-se de que durante esses três dias de audiência não concedera palavra ao acusado, o velho Mathe!… uma omissão bastante grave, inconcebível e inaceitável! E concede-lha.Aquele era a terceira tarde do que hoje chamaríamos de julgamento do “caso do touro do Mathe”! E a exortação do líder era que naquele dia tinha que sair dali uma decisão, tipo sentença!, pois o caso estava a arrastar-se por muito tempo e havia que se decidir sobre o que fazer com o touro estatelado perto do rio. O ambiente, ainda que houvesse posições divergentes, era calmo e sereno. Próprio de pessoas bem maduras e socialmente responsáveis. Nisso, o velho Nwamati lembra-se de que durante esses três dias de audiência não concedera palavra ao acusado, o velho Mathe!… uma omissão bastante grave, inconcebível e inaceitável! E concede-lha.
Calmo, ponderado, com uma fala bastante pausada, o velho Mathe muito não disse senão que “para uma sentença justa e racional devíamos saber porquê os touros lutaram, pelo que devíamos a eles perguntar e daí fazermos o juízo final…”Calmo, ponderado, com uma fala bastante pausada, o velho Mathe muito não disse senão que “para uma sentença justa e racional devíamos saber porquê os touros lutaram, pelo que devíamos a eles perguntar e daí fazermos o juízo final…”
O julgamento terminou.O julgamento terminou.
ME Mabunda