Se dúvidas havia de que Moçambique se tornou num Estado autoritário, tal como classifica o Índice da Democracia referente a 2020, produzido pela firma inglesa The Economist Intelligence Unit, estas ficaram dissipadas esta terça-feira.
Como em outras ocasiões, um forte contingente policial foi mobilizado, na manhã de ontem, para repelir uma manifestação pacífica, convocada por estudantes da Universidade Eduardo Mondlane, a mais antiga instituição do ensino superior do país, com objectivo de “contestar e repudiar” o que consideram de “regalias exacerbadas” constantes do projecto de Lei que aprova o Estatuto do Funcionário e Agente Parlamentar.
De acordo com o comunicado de imprensa partilhado com a comunicação social, na noite de segunda-feira, a concentração estava marcada para as 07:00 horas, na Praça da Independência, e a manifestação ia desaguar na Assembleia da República. Porém, até às 06:00 horas, a Praça da Independência estava tomada pelos diferentes ramos da Polícia da República de Moçambique (PRM), com destaque para as Unidades de Intervenção Rápida e Canina. O mesmo acontecia com o edifício do Parlamento.
Movidos pelo espírito de cidadania e empunhando dísticos com mensagens como “não ao roubo legalizado”, os estudantes ainda tentaram manifestar-se, mas a Polícia estava disposta a boicotar o encontro, tendo obstruído a passagem, alegando que a mesma carecia de autorização.
Perante a insistência dos jovens, a Polícia usou da força e deteve um estudante, de nome Valdo Nhamoneque. O “infractor” foi encaminhado às celas da 7ª Esquadra da PRM, na Cidade de Maputo, porém, acabou sendo libertado, após intervenção de algumas Organizações da Sociedade Civil. Aliás, alguns estudantes deslocaram-se à 7ª Esquadra da PRM a fim de demonstrar a sua revolta com a situação.
Entretanto, um comunicado da Associação dos Estudantes Universitários (AEU-UEM), partilhado na noite da mesma segunda-feira, distanciava-se da referida manifestação, alegando que a mesma não tinha sido por si convocada. Porém, “Carta” apurou que a direcção da AEU-UEM terá sido pressionada, pelo partido no poder, a desconvocar a manifestação. Sublinhe-se que a Frelimo continua a manter controlo sobre as organizações estudantis do país, assim como pelas organizações sindicais.
Sublinhar que o Estatuto do Funcionário e Agente Parlamentar, aprovado, semana finda, na generalidade e por consenso, tem sido alvo de diversas críticas por ser considerado desajustado à realidade social e económica do país.
Aliás, ainda ontem, a Polícia tentou impedir a submissão, junto da Assembleia da República, de uma petição da sociedade civil que também contesta as “mordomias” a serem atribuídas aos funcionários do Parlamento. (Marta Afonso)