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quinta-feira, 09 abril 2020 09:17

Covid-19: IESE questiona eficácia das medidas tomadas pelo BM

Depois de ter avançado que a economia nacional irá perder, por dia, 2.1 mil milhões de Meticais, caso o país opte pelo confinamento total, o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), uma organização de pesquisa independente, defende ser questionável a eficácia das medidas tomadas pelo Banco de Moçambique (BM) para fazer face aos efeitos da Covid-19, no sistema financeiro.

 

Na análise, que incide sobre a redução das taxas de reservas obrigatórias (em 150 pontos bases, em moeda nacional e estrangeira), a introdução de uma linha de financiamento em moeda estrangeira para os bancos comerciais (500 milhões de USD) e a não obrigatoriedade de constituição de provisões pelos bancos comerciais, a organização afirma que as medidas tomadas pelo Banco Central “baseiam-se em pressupostos simplistas e monetaristas convencionais (de curto prazo), assentes no controlo da massa monetária, da inflação e da taxa de câmbio”.

 

“Além disso, estas medidas pouco enfrentam o tipo de estrutura económica, as suas tensões e contradições, incluindo a sua inconsistência interna e com a política fiscal. Com isto, o artigo [análise] defende que o tipo de estrutura económica do país impõe restrições à eficácia destas medidas”, defende o IESE, em mais uma edição do seu Boletim (IDEIAS), publicada esta quarta-feira.

 

Por exemplo, no que tange à redução do coeficiente das Reservas Obrigatórias, o IESE sublinha que, ao tomar esta medida, o BM espera que os bancos comerciais tenham mais dinheiro disponível para aplicarem de forma rentável e expandir o crédito à economia, pois, a redução das Reservas Obrigatórias permite ao Banco Central libertar liquidez para o sistema financeiro, aumentando a quantidade de moeda em circulação na economia.

 

Entretanto, questiona: “até que ponto esta medida terá efeito na economia real, isto é, no sector produtivo e, em última instância, no acesso a bens e serviços básicos de consumo para as famílias?”

 

Quanto a não obrigatoriedade dos bancos comerciais em constituir provisões, o IESE entende que o Banco Central pretende “proteger o sistema financeiro e os riscos de aumento dos rácios de solvabilidade e de crédito malparado”. A medida, acrescenta, poderá aliviar a pressão das empresas e famílias que têm financiamento na banca nacional, reduzindo, desta forma, os riscos de as empresas não conseguirem manter os seus custos operacionais e do serviço da dívida.

 

Porém, manifesta preocupação sobre até que ponto as empresas “poderão se restruturar para fazer face a esta pandemia, uma vez que, a curto prazo, os factores de produção são relativamente fixos e a capacidade de restruturar a produção é reduzida”. “Portanto, é pouco provável que as empresas tenham capacidade para tal”, defende a fonte, sublinhando, no entanto, que para as famílias a medida permitirá aliviar a quebra de rendimento e, desta forma, amortecer os níveis de procura por bens e serviços.

 

“Até que ponto estas medidas são eficazes? Serão elas suficientes, ou medidas adicionais precisam ser tomadas, incluindo do lado fiscal, para que os efeitos na economia real sejam visíveis? O que as restrições de oferta a nível global podem significar no contexto destas medidas?”, pergunta o IESE, esclarecendo que ao levantar estas questões não pretende aferir se as medidas tomadas pelo BM são ou não acertadas, mas “reflectir sobre as mesmas e os mecanismos da sua transmissão, pensando na estrutura da economia de Moçambique e para a actual conjuntura global”.

 

“Estas medidas pouco tomam em consideração a essência da natureza estrutural da economia, que inclui a sua dependência em relação à exportação de produtos primários, importações de bens básicos de consumo, investimento directo estrangeiro e as suas tensões e contradições, incluindo com a própria Política Monetária, a sua inconsistência interna e entre esta e a Política Fiscal. Portanto, independentemente de quais forem as medidas, os elementos e questões estruturais da economia vão, em última instância, afectar a capacidade de resposta destas medidas”, considera a fonte.

 

A fonte anota que, por exemplo, a redução do coeficiente das Reservas Obrigatórias não significa a transferência da liquidez para o sector produtivo e para as famílias, pois, a propagação da Covid-19 está a gerar redução no volume de negócios das empresas.

 

“Consequentemente, as empresas poderão demandar menos recursos para financiar as suas actividades, pois, as perspectivas de receitas são reduzidas. A procura pelos serviços financeiros pelas empresas concentrar-se-á, possivelmente, na reestruturação do crédito e não necessariamente na emissão de novos financiamentos para investimento”, defende a análise, acrescentando também que, apesar da dependência na importação de bens básicos de consumo, uma maior liquidez no sistema financeiro não garante, automaticamente, acesso a mais crédito, a nível das famílias porque, “com a queda da actividade económica, as famílias experimentam uma redução nos seus rendimentos”.

 

Por isso, o IESE entende que este excesso de liquidez poderá aumentar o financiamento da despesa pública com recurso à emissão de títulos de dívida pública interna, dada a incapacidade financeira do Estado. “Portanto, dada a apetência dos bancos em financiar títulos de dívida pública, é provável que grande parte destes recursos seja desviada das empresas e famílias para financiar despesa pública não produtiva, isto é, criando um crowding-out do investimento privado produtivo (menor disponibilidade de recursos financeiros para o sector produtivo)”, afirma.

 

Para o IESE, o controlo da inflação, objectivo primário da Política Monetária, vai depender, em última instância, da capacidade de oferta de bens e serviços e dos preços praticados por parte dos parceiros comerciais – que também enfrentam os efeitos causados por esta pandemia – dos quais dependem as importações essenciais para o funcionamento da nossa economia. (Carta)

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