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terça-feira, 10 setembro 2019 05:11

Ciclone Idai e Kenneth: Mais da metade dos pacientes com HIV/SIDA abandonaram tratamento em zonas afectadas

Em Abril do corrente ano, o ciclone Kenneth entrou pela costa da província de Cabo Delgado, na parte norte de Moçambique e abateu a casa da Laura Cossa (nome fictício) na vila de Macomia.

 

Laura, que tem 38 anos, é mãe de quatro filhos, vive com o marido e o filho mais novo, entretanto, a jovem vive com HIV/SIDA e três dos seus filhos também são seropositivos. A preocupação em refazer sua casa e procurar o que comer fez com que a família abandonasse os tratamentos antirretrovirais.

 

Esta é uma das várias estórias que se contam das zonas afectadas pelos ciclones Idai e Kenneth. De acordo com informações disponíveis no site oficial da ONU News, grande parte dos locais fustigados pelos dois ciclones, apontam que houve uma redução de 50 por cento no número de acompanhamento e o número de pessoas em tratamento também caiu para mais da metade.

 

site indica que, um mês depois do ciclone Kenneth, Laura e sua família receberam a visita de Melita Baka, activista comunitária de uma iniciativa apoiada pela ONU e a Fundação Ariel Glase contra o Sida Pediátrico.

 

A activista comunitária faz um acompanhamento da Laura e dos seus filhos, há vários anos. Quando ela chegou, Laura explicou-lhe que não estava tomando a medicação porque tinha perdido o cartão de identificação hospitalar e que, neste momento, está mais preocupada em tentar sobreviver.

 

“Nós tivemos muitas dificuldades no campo porque, para muitos pacientes, a prioridade era procurar alimentação e abrigo, não o tratamento, então tivemos de andar de casa em casa. Muitos mudaram de residência, alguns reiniciaram, mas outros não”, explicou Melita, citada pela ONU.

 

Mesmo antes dos desastres naturais, o Programa Mundial de Alimentação (PMA) estimava que 80 por cento dos moçambicanos não conseguiam ter uma dieta adequada. Em Julho, a agência informou que 1,9 milhão de afectados pelos ciclones estão em risco de ter falta de comida se não existir ajuda internacional urgente.

 

Segundo a directora do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/SIDA, Onusida, em Moçambique, Eva Kiwango, o país “tem uma epidemia generalizada de HIV.” Segundo os últimos dados da agência, 2,2 milhões de pessoas em todo o país vivem com o vírus, o que representa mais de 7,4 por cento da população.

 

Em 2018, aconteceram cerca de 150 mil novas infecções e 54 mil mortes, o que provocou uma descida na esperança média de vida para 53,7 anos. Eva Kiwango diz: “o maior desafio é fechar a torneira das novas infecções, com uma aposta muito forte na prevenção.”

 

Em Macomia, Laura descobriu que vivia com o vírus há apenas quatro anos. A moçambicana foi mãe aos 13 anos. Em 2015, dois dos seus filhos adultos receberam um diagnóstico positivo e ela decidiu fazer o teste. O filho mais novo já tinha sido contaminado durante a gravidez ou parto. Entretanto, em Moçambique, o vírus já deixou 1,1 milhão de crianças órfãs.

 

O Estado moçambicano oferece os medicamentos antivirais, mas mesmo assim existem dificuldades na sua implementação. Apenas 56 por cento das pessoas com diagnóstico positivo tomam os medicamentos. A taxa é ligeiramente mais alta entre as crianças, cerca de 60 por cento. Somente 68 por cento das pessoas que iniciam o tratamento continuam seguindo o plano um ano depois.

 

Por outro lado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que irá demorar cinco anos a recuperar toda a infra-estrutura de saúde danificada. Durante os dois ciclones, 113 unidades sanitárias foram parcial ou totalmente danificadas, incluindo equipamentos, mobiliário, medicamentos essenciais e produtos.

 

A coordenadora residente da ONU no país, Myrta Kaulard, diz: “durante um desastre natural, as pessoas mais vulneráveis sofrem sempre os piores impactos.” Segundo ela, “estas pessoas podem ser alguém com deficiência, idosos, pessoas mais novas ou doentes”, como as pessoas que vivem com HIV/SIDA. (Marta Afonso)

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