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sexta-feira, 14 junho 2019 06:49

Juiz apodera-se indevidamente de compensações, recebe subornos para soltar e apenas é mandado cessar funções provisoriamente

De aplicador da lei a um predador insaciável! O trecho vem a propósito do caso que tem à cabeça o magistrado judicial de nome Samuel Domingos Caetano do Rosário, do Tribunal Judicial do Distrito de Changara, província de Tete, que, no lugar de ater-se cega e escrupulosamente na aplicação da lei, tal como jurara à data que assumira as funções, transformou-se num “verdadeiro felino insaciável”.

 

É que Samuel do Rosário, juiz de Direito D, naquele tribunal distrital, apoderou-se indevidamente de 246.669 MT, dos quais 205.077 são referentes a compensações por mortes e o remanescente, no caso 39.592, 00 MT por ter ordenado a soltura de um cidadão de nacionalidade zimbabueana de nome Caination Kennedy Makowa, no dia 4 de Abril de 2018.

 

Estas infracções, tal como refere a deliberação da última sessão plenária do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) em posse da “Carta”, valeram ao magistrado uma cessação imediata de funções e de forma provisória. Para seu lugar, como alude o documento em nossa posse, de forma, igualmente, temporária, foi indicado Ivandro Paulo Gabriel, Juiz de Direito D.

 

A decisão resulta do processo de inquérito no 16/2018 em que é inquirido Samuel Domingos Caetano do Rosário que, para o órgão (CSMJ), as suas atitudes “relevam falta de honestidade, seriedade e dignidade e são atentatórias ao prestígio e dignidade da função que exerce”.

 

Aliás, para além da cessação imediata de funções, embora que provisória, ordenou a extracção de cópias dos autos e a sua remessa ao Ministério Público, por haver elementos que indiciam o cometimento de infracções de natureza criminal.

 

A apreciação ao processo de inquérito foi feita na I sessão plenária do CSMJ, que decorreu de 28 a 31 de Maio último, no distrito de Bilene, província de Gaza. A reunião foi orientada pelo Juiz Presidente do Tribunal Supremo, Adelino Muchanga, na qualidade de presidente do órgão.  

 

Como é que Samuel Domingos Caetano do Rosário apoderou-se dos valores 

 

Samuel do Rosário conseguiu os fundos no âmbito dos processos no 74/2017 (em que se apoderou de 38.681,00MT); do no 56/2017 (48.348,00 MT) do no 39/2016 (118.048,00 MT), estes três referentes a compensações por mortes e, por fim, nos autos de instrução preparatória no83/0504/P/2018.

 

No processo no 74/2017, tal como refere o documento, o magistrado apoderou-se de 38.681. 00 MT, num bolo global de 138. 681,00 MT, da pertença de António José Mapai pela morte da sua companheira de nome Amélia Kenate.

 

Para ficar com uma parte do dinheiro, Samuel do Rosário, de cunho próprio e em seu gabinete, preencheu o cheque e entregou ao beneficiário, no caso António Mapai, ordenando-o que fosse levantar o dinheiro na agência bancária do Millennium Bim e regressasse com os valores ao Tribunal.

 

De forma cega e religiosa, António Mapai cumpriu a ordem do juiz. Depois de sacar o dinheiro da agência bancária retromencionada, Mapai regressou ao tribunal e dirigiu-se ao gabinete do juiz e, já no interior, estando apenas os dois, entregou a quantia sacada ao juiz, tendo este último, depois de conferir, apenas lhe entregue 100 mil e, de seguida, apoderando-se do remanescente sob o argumento de que seria usado para pagamento das despesas do tribunal. Samuel do Rosário foi quem assinou o termo de entrega.

 

Para o caso do processo no 56/2017, Do Rosário ficou com 48.348,00 MT dos 178.348, 00 MT da indemnização que Morine Paulino Guerra tinha direito de receber pela morte do seu companheiro, Savimbe Adamo Pedro Bomba, usando em benefício próprio e em prejuízo da cidadã.

 

Após exarar o despacho em que ordenava notificação da exequente Morine Paulo Guerra para requerer a quantia indemnizatória, o juiz ordenou ao escrivão para emitir um cheque a favor da exequente e lhe entregasse para que desse àquela numa segunda-feira, 09 de Abril de 2018, porque sabia que o escrivão não estaria presente. O escrivão acatou a ordem do juiz e passou o cheque no valor de 178.348. 00MT.

 

Na dita segunda-feira, o juiz entregou, no seu gabinete, o cheque a Morine Guerra ordenando-a que procedesse ao levantamento do dinheiro numa agência bancária e, de seguida, regressasse ao tribunal para falar com ele. E porque a sua palavra confundia-se com a lei, Morine Guerra, acompanhada pelo irmão do seu falecido marido, de nome Egídio Adamo, levantaram o dinheiro e regressaram ao tribunal, tendo apenas a exequente entrado no gabinete do juiz Samuel do Rosário.

 

E porque o plano era mesmo subtrair o dinheiro, o juiz ordenou que Morine Guerra fosse chamar o seu cunhado que ficara do lado de fora do seu gabinete e, nesse instante, aproveitando-se da ausência desta, tirou uma parte do valor, no caso 48.348,00 MT.

 

Após receber o plástico, a cidadã não voltou a conferir o valor, saiu do gabinete na companhia do seu cunhado e foram, imediatamente, à casa dos seus sogros para entregar o valor e foi quando, ao abrir o saco plástico, isto na presença do cunhado, este que a acompanhara ao tribunal e ao banco, e do seu sogro, aperceberam-se que o valor estava incompleto.

 

Num outro processo, concretamente o no 39/2016, Samuel do Rosário levantou no dia 27 de Fevereiro de 2018, na boca do caixa do Banco Millennium Bim, com cheque que ordenou que se emitisse ao portador, usando para o feito a sua licença de condução, 118.048,00MT, refentes à compensação pela morte da menor de nome Gorete António Sinal.

 

Do Rosário usou o valor em benefício próprio prejudicando o legítimo beneficiário, identificado na deliberação do CSMJ, pelo nome Manuel Elias Andissene. Entretanto, mais tarde, o Juiz veio a devolver o valor por ordens do Juiz Presidente do Tribunal Judicial da província de Tete, Fernando José Pantie.  Já nos autos de instrução preparatória no 83/0504/P/2018, Samuel do Rosário ordenou a soltura de um cidadão Zimbabueano de nome Caination Kennedy Makowa, no dia 4 de Abril de 2018, isto depois de ter recebido 50 mil meticais.

 

Do valor global (50 mil), refere a deliberação do CSMJ, apenas 10.408,00 MT foram depositados pelo empregado de Samuel do Rosário de nome Zito Filipe, nas contas tituladas pelo tribunal, e os remanescentes 39.592, 00 MT fez seus em benefício próprio, em prejuízo da instituição.

 

Tudo começou a 26 de Março de 2018, quando Frarai Tsongora, familiar de Caination Kennedy Makowa requereu a liberdade provisória sob caução sem que tivessem sido alterados quaisquer fundamentos que validaram a sua captura. Ainda no mesmo dia, Samuel do Rosário exarou um novo despacho anuindo ao pedido e arbitrou uma caução de 50 mil MT, sendo 45 mil MT económica e 5 mil MT carcerária.

 

Três dias depois, isto no dia 29 de Março, o escrivão do Tribunal Judicial do Distrito de Chabngara requisitou o processo à Procuradoria Distrital de Changara, para onde havia sido remetido, e Samuel do Rosário mandou juntar aos autos documentos por ele forjados, um pedido de redução da caução para 10 mil MT com assinatura falsificada do familiar do arguido (nome e apelido mal escritos incluindo uma rasura no nome).

 

Seguidamente, Do Rosário exarou o despacho aceitando o pedido, parcialmente, mas paradoxalmente, anota o documento que temos vindo a citar, reduziu a mesma caução supostamente requerida para o mesmo valor de 10 mil MT.

 

No dia de 3 de Abril de 2018, Samuel do Rosário mandou o seu empregado Zito Filipe para proceder ao depósito no banco Millennium Bim de Changara apenas de 10.000,00 MT de caução e 408, 00 MT nas contas tituladas pelo tribunal e, depois disso, mandou juntar os autos aos talões de depósito e proferiu um despacho ordenando a soltura de Caination Kennedy Makowa, ainda no mesmo dia. (Ilódio Bata)

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