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BCI
quarta-feira, 15 maio 2019 06:35

Descentralização fiscal desenquadrada do actual contexto de gestão de finanças públicas - CIP

O Centro de Integridade Pública (CIP) defende que o contexto actual das finanças públicas não favorece uma descentralização activa dos recursos. A “tese” está expressa numa recente análise, publicada semana finda, por aquela organização da sociedade civil, sobre a descentralização fiscal, no quadro da aprovação do pacote de governação descentralizada pela Assembleia da República (AR), inserida na revisão pontual da Constituição da República, aprovada no ano passado.

 

De acordo com a análise, que teve como objecto de estudo os municípios, a descentralização requer uma mudança de autoridade e recursos, de cima para baixo, do governo central para os governos “sub-nacionais”, aumentando, assim, as fontes de receita e as responsabilidades da despesa ao nível “sub-nacional”.

 

A análise, da autoria de Celeste Filipe, refere ainda que nos governos democráticos descentralizados o controlo sobre o uso dos recursos muda dos governos centrais para os cidadãos e eleitores, que são os derradeiros usuários dos bens e serviços.

 

Durante a pesquisa da actual situação das finanças municipais, a investigação constatou que ainda há factores que tornam o presente modelo de gestão precário, opaco e pouco escrutinado. De acordo com o documento, isso deve-se ao facto de o sistema de transferências para os municípios, através do Fundo de Compensação Autárquico (FCA), ser pouco transparente, pouco previsível e estimular ainda mais as desigualdades sociais entre os diferentes municípios.

 

“É que, em vez de se seguir a fórmula previamente definida, baseada no tamanho da população e na área territorial, actualmente as transferências são baseadas noutros indicadores não divulgados”, refere a análise.

 

De acordo com a pesquisa, dos cálculos feitos para os quatro anos (2015 a 2018), baseados na fórmula e comparados com os montantes transferidos para cada uma das 53 autarquias, foi possível constatar que há autarquias que estão a receber muito menos do que deviam (caso da cidade de Tete e vila de Quissico, com diferenças médias negativas de cerca de 44,3 e 26,3 milhões de Meticais, respectivamente) e outros que se “beneficiaram positivamente (Maputo Cidade e Cidade da Beira, com a diferença média positiva de 97,9 e 62,3 milhões de Meticais, respectivamente).

 

“Se o objectivo principal das transferências aos municípios é reduzir as assimetrias regionais, este modelo actualmente implementado, em Moçambique, só promove a ineficiência alocativa”, afirma a análise, tomando como exemplo o Município de Maputo que, pelo facto de colectar mais receitas, “tem recebido quase 100 milhões de Meticais a mais, através do FCA”.

 

“Este facto levanta questões sérias sobre a necessidade de se implementar reformas urgentes na administração pública no sentido de torná-la mais transparente, estável e previsível”, defende.

 

Por outro lado, explica o documento, os municípios ainda não foram integrados no Sistema de Administração Financeira do Estado (só este ano é que o Sistema Integrado de Gestão Financeira Autárquica está em fase piloto nos municípios da província e cidade de Maputo), fazendo com que os processos sejam tratados à margem do SISTAFE.

 

“Este aspecto, associado ao facto de os mecanismos de fiscalização serem quase escassos, uma vez que o Tribunal Administrativo, em média, audita um município por ano, mostram o nível de debilidade em que se encontram as finanças locais”, defende o documento. Por essa razão, a análise entende ser urgente que “para existir autonomia dos órgãos de governação provincial e/ou distrital, o país precisará aprimorar os sistemas de monitoria, fiscalização e prestação de contas sob pena deste passo, recentemente dado, não ser suficientemente dinâmico e activo”.

 

Na sua análise, a pesquisadora diz haver necessidade do Executivo definir o horizonte temporal e as etapas do processo de integração dos municípios no SISTAFE para se efectivar uma descentralização activa e dinâmica. Assim, propõe que a definição e aprovação de legislação aplicável para operacionalizar a descentralização fiscal de modo a clarificar, entre outras questões, quem faz o quê no que tange à execução da despesa (passa por um mapeamento de competências a nível nacional para se identificar necessidades de capacitação dos recursos humanos).

 

A outra questão a clarificar é perceber quais serão as taxas de imposto que devem deixar de ser cobradas a nível central e podem passar para os governos provinciais e que outras taxas podem ser introduzidas para alargar a base tributária (levantamento de taxas cobráveis a nível provincial e recursos necessários para tal).

 

Por fim, a referida legislação irá também elucidar como os recursos do nível “sub-nacional” podem ser suplementados pelo nível central de modo a financiar a provisão de serviços públicos (sistema de transferências intergovernamental transparente); e quais devem ser os mecanismos usados para contrair dívida (vide o esquema) e financiar os níveis sub-nacionais. (Abílio Maolela)

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