Depois da Escola Prática da Polícia da República de Moçambique (PRM) de Matalane, na província de Maputo, onde os instrutores abusavam das suas instruendas, agora é a vez do Estabelecimento Penitenciário Especial para Mulheres de Maputo, conhecida como Cadeia Feminina de Ndlavela, explorar sexualmente as reclusas.
De acordo com um estudo realizado pelo Centro de Integridade Pública (CIP), uma organização da sociedade civil que se dedica à defesa da integridade e transparência na gestão do erário, o Estabelecimento Penitenciário Especial para Mulheres de Maputo transformou-se num antro de prostituição, com as reclusas a serem submetidas à exploração sexual, num negócio controlado pelos guardas prisionais e que movimenta entre 3 a 30 mil Meticais, dependendo do local marcado para o encontro, da duração das sessões e da qualidade do produto.
“As mais novas são as mais solicitadas e mais caras”, revela o CIP, citando parte de uma conversa que os seus investigadores mantiveram com um guarda prisional durante a pesquisa. A organização assegura que os seus pesquisadores fizeram-se passar por clientes e infiltraram-se na rede de exploração sexual de reclusas e, por três ocasiões (durante cinco meses), solicitaram e foram-lhes entregues jovens reclusas que cumprem penas naquela cadeia a troco de pagamentos de valores monetários a guardas prisionais.
“Na primeira ocasião, as reclusas foram retiradas pelos guardas prisionais da Cadeia Feminina de Ndlavela para o Hospital Central de Maputo, fingindo que iam a uma consulta médica. Do hospital, as vítimas foram entregues aos investigadores do CIP, disfarçados de clientes. Em outras duas ocasiões, as reclusas foram retiradas da Cadeia pelos guardas e entregues aos investigadores do CIP numa pensão localizada a poucos metros do estabelecimento penitenciário. Ao todo, houve contacto com cinco reclusas que ainda cumprem penas de prisão na Cadeia Feminina de Ndlavela”, afirma a organização, sublinhando que, na segunda fase, foram entrevistadas quatro antigas reclusas, que livremente contaram a sua experiência durante os anos de cadeia.
De acordo com o estudo publicado ontem, das três vezes que os investigadores do CIP solicitaram reclusas, o preço pago foi diferente, porém, com um denominador: o dinheiro é partilhado entre os guardas envolvidos no esquema, entre eles, o oficial de serviço, chefe do recinto e os guardas das torres de controlo.
“Pombinhas” ou “coelhinhas” são, segundo o CIP, alguns dos termos usados pelos guardas prisionais para se referir às mulheres reclusas durante a interacção com os clientes.
“O interessado em manter relações sexuais com reclusas deve negociar com os guardas da penitenciária alguns dias antes (…) ou com alguém da sua confiança para intermedeiar a negociação para a retirada das reclusas da cadeia. Geralmente, os clientes são pessoas de confiança do guarda com quem se negoceia”, detalha a fonte, sublinhando que o negócio flui normalmente nos dias em que o “guarda-negociante” estiver de serviço. Realça também haver reclusas que são submetidas a este cenário durante três a quatro dias por semana.
Segundo o CIP, o negócio é antigo, sendo que a reclusa que não aceita entrar no esquema sofre ameaças. Aliás, há estórias de reclusas que foram agredidas fisicamente após recusarem-se envolver sexualmente com pessoas estranhas.
“Uma Comissão de Inquérito Independente, integrando diferentes órgãos e instituições do Estado, incluindo o Ministério Público, a Assembleia da República e organizações de defesa dos direitos humanos, deve ser constituída com urgência para investigar o caso de exploração sexual de reclusas na Cadeia Feminina de Ndlavela e produzir recomendações para a protecção das reclusas deste estabelecimento prisional e dos demais espalhados pelo país. Investigações similares devem ser conduzidas pelas autoridades em outros estabelecimentos prisionais onde estão encarceradas mulheres para apurar se não ocorrem situações similares às de Ndlavela”, defende o CIP. (Carta)