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BCI
segunda-feira, 24 maio 2021 07:34

A caça furtiva e a dinâmica dos sindicatos do crime organizado em Moçambique e no exterior – I

É uma indústria criminosa sofisticada a custo da protecção política e judicial dos integrantes metamorfizados de região em região. Um trabalho realizado pela "Carta", nos últimos meses, junto de actores anónimos que tudo fazem para combater esta tipologia de crime transfronteiriço, que até 2018/19 estava focalizada em cornos de rinoceronte, pangolim e dentes de marfim de elefantes, cujos valores avultados eram movimentados dos corredores do triângulo dourado na Ásia para dizimar elefantes da Reserva Nacional do Niassa e os rinocerontes na linha transfronteiriça do Grande Limpopo entre Moçambique, África do Sul e Zimbabué e os leões e pangolins do Parque Nacional da Gorongosa, revela os contornos deste crime.

 

Conforme consta do Manual do Programa Kheta (escolha), implementado pelo Fundo Mundial da Natureza (WWF), com o financiamento da USAID, 35 mil elefantes, 18 mil rinocerontes brancos e mais de 1.900 rinocerontes pretos na África do Sul foram dizimados nas últimas décadas para alimentar o submundo do sindicato do crime organizado da caça furtiva, facto que ditou a criação de um programa de cinco anos (2018-2022) para devolver e aumentar o número de animais.

 

Com a cooperação e engajamento entre os países acima mencionados, o número de caçadores furtivos de rinocerontes e elefantes reduziu drasticamente nos últimos anos. Fontes do sector explicam que os sindicatos passaram a caçar ou envenenar leões e leopardos, sendo que as garras, pele e dentes passaram a ser mais rentáveis que o corno e o marfim.

 

Embora haja raridade destes animais, aliado ao fecho da circulação dos grandes compradores nos países destinatários, como Tailândia, China e Vietname e o compromisso dos respectivos governos, os integrantes do sindicato do crime organizado da caça furtiva tiveram de encontrar outras fórmulas.

 

De acordo com um especialista em protecção da vida selvagem, em Moçambique existem diferentes hierarquias do sindicato do crime organizado da caça furtiva, cujos "big boss" se encontram baseados na cidade de Maputo. Estes fornecem armamento pesado, valores monetários avultados e retiram os troféus do território nacional para os países do triângulo dourado.

 

Segundo explicou a fonte, embora haja abrandamento, o facto é que, na pérola do Índico, fazem parte do contrabando de espécies protegidas generais, procuradores, empresários e políticos, que fornecem armas de fogo com calibres de alta precisão.

 

A fonte revelou que o material é fornecido novo e é de elevado custo. Tal como as armas que são "novinhas", as notas usadas no pagamento aos caçadores furtivos também são novas. Ou seja, é como se nunca tivessem sido usadas, de modo a não serem rastreadas, caso os furtivos venham a ser detidos pelas autoridades policiais.

 

Durante a investigação, constatamos que o circuito de informantes, no submundo do sindicato do crime organizado da caça furtiva, é rápido e dinâmico, ou seja, não importa onde estejas, qualquer informação, produto ou pistas do animal que tiveres és pago e, em caso de não cooperação com o sistema do sindicato, és emboscado e assassinado. Os mandantes do crime de caça furtiva possuem vários negócios supostamente lícitos, havendo alguns que chegam a altos cargos nas organizações empresariais, federações desportivas, Assembleia da República, Procuradoria-Geral da República, Ministério do Interior e partidos políticos.

 

Nas últimas duas décadas, a caça furtiva enriqueceu muita gente, assim como destruiu muitas vidas, conforme ilustram os seus rastros nos distritos de Moamba e Magude (na província de Maputo), Massingir, Chókwè, Mapai, Mabalane e Chicualacuala (província de Gaza) e nos distritos da zona tampão da Reserva Especial do Niassa. Aliás, em tempos, alguns cidadãos envolvidos na actividade chegaram a ter 40 milhões meticais nas suas contas bancárias sem nunca terem trabalhado e muito menos desenvolvido qualquer actividade lucrativa. Entretanto, de repente caíram na desgraça, fazendo valer o adágio popular: “quando a esmola é demais, até o santo desconfia”.

 

Refira-se que um estudo realizado pela Global China House, divulgado em 2019, aponta Japão, Coreia do Sul, Malásia, Taiwan e Myanmar, como alguns países onde há registo de contrabando de rinoceronte.

 

Sublinhar que o pangolim saqueado dos parques de Moçambique é mais comercializado em Singapura. O pangolim que chega à China é traficado a partir dos grupos que actuam a partir da Nigéria, Tanzânia, Malawi e outros países. (Omardine Omar)

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