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quarta-feira, 11 março 2020 06:02

Julgamento “Caso LAM-Executive”: Uma sessão em que Réu, Juiz e MP quase se “pegaram pelas golas”

Iniciou, conforme agendado, na 7ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo (TJCM), o Julgamento do “Caso LAM-Executive”. Depois de sucessivos adiamentos, esta terça-feira, o julgamento finalmente conheceu o seu arranque. E porque a expectativa era tanta, o julgamento não podia ter começado de forma diferente.

 

O antigo Presidente da Comissão Executiva (PCE) das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), António Pinto, réu no caso, quase “saiu às golas” com o juiz da causa e com o magistrado do Ministério Público (MP). O cerne das desinteligências foi a forma muito pouco “polite” e as respostas contraditórias do antigo PCE da companhia aérea de bandeira, quando instado a se pronunciar sobre factos constantes da acusação do MP.

 

No “caso LAM-Executive” estão também no banco dos réus Hélder Fumo (antigo administrador Financeiro) e Sheila Temporário (directora-geral da Executive).

 

Depois da leitura da acusação, o juiz Rui Dauane convidou o réu António Pinto a pronunciar-se sobre os factos de que é acusado. Debalde! Pinto, cujo depoimento só terminou ao princípio da tarde de ontem, não conseguiu responder com exatidão as perguntas que lhe foram colocadas, levando o juiz à beira de um “ataque de nervos”.

 

E quando não era o juiz e o representante do Ministério Público a perderem a “paciência” com o réu, era o próprio António Pinto (réu) a fazê-lo com os dois magistrados.

 

Houve até vezes, em que Rui Dauane teve de pedir António Pinto para se acalmar e centrar a sua atenção em responder as perguntas que lhe haviam sido colocadas. E como se isso não bastasse, o antigo PCE da LAM chegou mesmo, por diversas vezes, a interpelar a mesa (do Juiz) para pedir a palavra sob o pretexto de que alegadamente queria prestar algum esclarecimento adicional.

 

O juiz da causa teve quase sempre, durante a sessão, de insistir nas perguntas ao réu, isto porque as repostas eram sempre contrárias ao que lhe fora perguntado. Perante a insistência daquele magistrado judicial, Pinto, visivelmente incomodado, optou sempre por dar respostas inconclusivas.

 

Nalgumas situações, António Pinto socorreu-se do clássico “não me recordo” para responder as questões colocadas pelo juiz ou pelo magistrado do MP, acto que deixava ambos agastados, visto que algumas perguntas resultavam de respostas que ele próprio dera anteriormente.

 

António Pinto, de 59 anos de idade, é acusado do crime de peculato pelo seu envolvimento no esquema de dissipação de fundos da companhia aérea de bandeira, a LAM. Em causa está o desaparecimento de 50 milhões de meticais dos cofres da LAM, num esquema que contou com a participação da empresa Executive.

 

António Pinto, que tomou posse como PCE da LAM a 15 de Fevereiro de 2016, declarou que, quando assumiu as funções na LAM, a Executive já lá estava e era responsável pela produção da revista de bordo, a Índico. Pinto acrescentou que durante o seu reinado firmou dois contratos com a Executive e previam que fosse esta empresa a cuidar da comunicação institucional da LAM, precisamente porque a equipa que encontrou, à altura da sua chegada, tal como disse, não tinha capacidade para o fazer.

 

Apesar de ter rubricado os contratos e de ser PCE e, consequentemente, assinante das contas da LAM, Pinto disse que não assinou qualquer cheque e não ordenou, de forma directa, que fossem feitos pagamentos à Executive.

 

Pinto anotou que o primeiro contrato celebrado com a Executive tinha a duração de quatro meses e o segundo de 12 meses.

 

O antigo PCE da LAM avançou que não era responsável pela avaliação dos trabalhos que eram feitos pela Executive. Tal função, disse Pinto, era exercida pelos departamentos de Comunicação e Imagem (à sua chegada Gabinete de Comunicação) e a área de Marketing. Entretanto, sob a sua alçada, enquanto PCE, tinha o departamento de Comunicação e Imagem.

 

Hélder Fumo, de 54 anos de idade, tomou posse como administrador financeiro da LAM no mesmo dia que António Pinto. Ou seja, a 15 Fevereiro de 2016. Fumo chegou à LAM pelas mãos do Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE). Entretanto, quando questionado pelo juiz sobre os contornos da sua contratação, Hélder Fumo disse que preferia não responder a pergunta.

 

Fumo começou por dizer que, quando chegou à LAM, esta companhia estava à beira da falência. O antigo administrador financeiro confirmou que, juntamente com António Pinto, rubricou dois contratos com a Executive. Em representação da Executive, disse Fumo, no primeiro contrato assinou Nuno Fernandes e no segundo Nuno Fernandes e Sheila Temporário.

 

A essência dos contratos, anotou Fumo, repousava no resgate da imagem da companhia aérea de bandeira no mercado nacional. Pelo primeiro contrato (quatro meses), que segundo Fumo, uma parte tinha a componente de marketing, a Executive embolsava pouco mais de 1 milhão de meticais por mês. Já no segundo (12 meses – que não chegou até ao fim), a Executive recebia pouco mais de 2 milhões de meticais mês por cuidar da comunicação institucional da LAM.

 

Entretanto, Hélder Fumo não conseguiu precisar quantos meses faltavam por pagar àquela firma. Sobre a natureza dos contratos, Fumo disse que ambos eram de prestação de serviços.

 

Fumo fez ainda cair a narrativa de António Pinto, segunda a qual não era responsável pela avaliação dos trabalhos que eram submetidos pela Executive, no âmbito da prestação de serviços. O antigo administrador financeiro disse que os trabalhos eram enviados ao sector financeiro e este, por sua vez, enviava para o sector competente, no caso para o PCE, que depois de avaliar autorizava que fossem pagos honorários àquela firma pelos trabalhos realizados.

 

Durante o tempo em que esteve na LAM, Hélder Fumo avançou que não autorizou ou deu aval para que fossem efectuados pagamentos a favor da Executive.

 

Por seu turno, Sheila Temporário, que trabalha na Executive desde 2016, começou por dizer que apenas participou na assinatura do segundo contrato, no caso, o da prestação de serviços de gestão da comunicação institucional.

 

Sobre este contrato, Temporário avançou que a LAM comprometia-se a pagar pouco mais de 2 milhões de meticais, durante a vigência do mesmo. O contrato tinha a duração de 12 meses. Temporário atirou que o contrato não foi cumprido na íntegra, precisamente porque chegou uma fase em que a LAM deixou de cumprir com o acordado.

 

Boa parte das questões inerentes ao contrato de quatro meses, Sheila Temporário disse que poupo poderia explicar, visto que não participou da assinatura do mesmo. Aliás, disse que sequer sabe explicar quando e em que circunstâncias iniciou a ligação entre a LAM e Executive.

 

Hélder Fumo e Sheila Temporário são, igualmente, acusados pelo Ministério Público do crime de peculato por terem participado do esquema que culminou com a dissipação de fundos da LAM. (Carta)

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