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quarta-feira, 15 abril 2020 07:08

Comentário: Banco Central rema contra medidas de mitigação do impacto da Covid-19 na economia

O Banco de Moçambique está a remar contra medidas que tem vindo a tomar para mitigar os impactos da crise provocada pela Covid-19, na economia do país. Em causa está a contínua emissão desenfreada de Bilhetes de Tesouro (BT), títulos da dívida pública que, por excelência, sugam a liquidez (dinheiro) no mercado, tornando, por consequência, caro o crédito às famílias e empresas na banca comercial.

 

Contraditório: é assim como “Carta” define o comportamento do regulador do sistema financeiro moçambicano, o Banco Central, quando impõe medidas cujo fito é, em geral, mitigar os efeitos da propagação da Covid-19 na economia do país.

 

De entre várias medidas, entre os dias 18 e 22 de Março passado, a instituição impôs a redução da taxa de reservas obrigatórias sobre depósitos dos clientes dos bancos comerciais em moeda nacional e estrangeira em 150 pontos bases (1,50 pontos percentuais) para 11,50% e 34,50%, respectivamente.

 

Há dias, o Banco Central determinou também a não obrigatoriedade de constituição de provisões para créditos de cobrança duvidosa pelos bancos comerciais, no caso de renegociação da dívida com os clientes afectados pela Covid-19, antes do vencimento do empréstimo, a partir de 23 de Março de 2020 até 23 de Dezembro de 2020.

 

O “nosso banco” introduziu ainda uma linha de financiamento em moeda estrangeira para os bancos comerciais autorizados a transaccionar moeda estrangeira, no valor de 500 milhões de USD, por um período de nove meses, a partir de 23 de Março de 2020.

 

Aos olhos da “Carta”, essas medidas são plausíveis, embora para muitos agentes económicos se mostrem ainda insuficientes e relativamente difíceis de materializar o objectivo do regulador: mitigar os impactos da crise provocada pela Covid-19, na economia do país. Por exemplo, a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) considera que, ao invés de emprestar aos bancos comerciais, os 500 milhões de USD (o que não é muito acessível), o Banco de Moçambique poderia facultar os fundos por meio de venda directa ao mercado, algo que facilitaria o acesso por parte dos agentes económicos, com destaque para os importadores ou exportadores de bens.

 

Embora plausíveis, as medidas do Banco de Moçambique são contraditórias e, por consequência, inúteis para o objectivo da instituição. Ora vejamos, as decisões acima referidas visam, geralmente, aumentar a liquidez, ou seja, a circulação do dinheiro no sistema financeiro e económico moçambicano nessa crise mundial provocada pela Covid-19.

 

Enaltecendo o impacto das medidas que tem vido a tomar, num artigo publicado recentemente, o Banco Central diz, por exemplo, que ao aceder à linha de financiamento de 500 milhões de USD, os bancos comerciais terão mais liquidez (dinheiro) em moeda estrangeira, podendo vendê-la aos seus clientes para a realização de importações.

 

“Ao vender moeda estrangeira aos seus clientes, os bancos comerciais aumentam a sua disponibilidade no mercado, reduzindo a oscilação da taxa de câmbio e, por essa via, promover a estabilidade do preço dos bens e serviços (inflação baixa e estável), o principal objectivo do Banco de Moçambique”, acrescenta a instituição, em nota disponível na sua página oficial da internet.

 

Ora, mesmo ciente desses benefícios para os empresários e famílias, o Banco de Moçambique faz ouvidos moucos e rema contra medidas que toma para a mitigação dos efeitos da Covid-19 na economia moçambicana. A emissão desenfreada de Bilhetes de Tesouro (títulos de dívida pública) é o comportamento que leva o Banco Central deitar por terra todo o esforço que imprime para minimizar o impacto nefasto provocado pela pandemia do novo coronavírus no sistema financeiro e económico do país. Embora o Banco Central reconheça que a emissão recorrente de Bilhetes de Tesouro aumenta a dívida interna, voltou a emiti-los no dia 10 de Abril corrente, um comportamento de tamanha afronta para o bom crescimento económico do país. É que os Bilhetes de Tesouro, geralmente adquiridos por bancos comerciais, são por excelência sugadores de dinheiro no mercado e, por consequência, o crédito às empresas e família torna-se muito caro.

 

As instituições financeiras optam por comprar Bilhetes de Tesouro, em vez de emprestar o dinheiro à economia (empresas e família), pois, entre privados e Estado, consideram que o último apresenta melhores garantias de pagar a dívida. Ao fazer isso, por influência do Banco de Moçambique, as instituições financeiras minam o desenvolvimento desejado da economia.

 

Verdade é que a emissão de títulos da dívida pública não vai parar tão breve. Em causa está o facto de o Banco de Moçambique (ou Estado) recorrer aos Bilhetes de Tesouro e não só para financiar o défice das contas públicas geridas pelo Governo que, em 2016, viu os doadores a cancelarem a ajuda com a descoberta do escândalo das “dívidas ocultas”, avaliadas em mais de 2 mil milhões de USD.

 

Como consequência da suspensão de financiamentos directos ao Orçamento de Estado por parte dos parceiros internacionais, a emissão desenfreada de diversos títulos da dívida pública ganha espaço, a partir de 2017.

 

Desde Junho de 2017 a esta parte, o Banco de Moçambique já emitiu 34 Bilhetes de Tesouro e este movimento, infelizmente, irá continuar, enquanto o Governo não tiver outras alternativas de autofinanciamento, bem como a retoma da ajuda por parte dos doadores. Face a essa realidade, “Carta” depreende que o Banco Central está a remar contra medidas que tem vindo a tomar para mitigar os impactos da crise provocada pela Covid-19, na economia do país. (Evaristo Chilingue)

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