Nos últimos tempos estamos a ser, literal e sistematicamente, inundados com a figura de Daniel Chapo, o candidato presidencial da Frelimo às eleições de Outubro próximo. Chapo é já uma vírgula nacional. Nascido em Inhaminga, distrito de Cheringoma, Sofala. Chapo chegou a este vale de lágrimas no ano em que organização que o endossa, se assumia em congresso (o Terceiro) de orientação marxista-leninista, abraçando o doce socialismo científico, na esperança certa de instalar o homem e uma sociedade novas onde cada qual viveria conforme as suas capacidades e cada qual segundo as suas necessidades. Curiosamente, o ano do início da guerra entre os moçambicanos.
Em 1994 quando Moçambique realizava as suas primeiras eleições gerais e multipartidárias, Chapo navegava ainda nas turbulentas e doces águas da puberdade, ainda não podia votar. Hoje 30 anos se passam da única eleição que ele não terá votado, e o bebé de 1977, já adulto e senhor, é um dos em quem se espera votar e, para sua felicidade, que a maioria o confie e escolha.
Na eventualidade de ser eleito, será de facto o marco da propalada transição geracional na Frelimo e no estado moçambicano. O primeiro, que vive os seus momentos mais moribundos da sua existência; sem ideologia, sem valores e o segundo, arrastado pela indefinição e incapacidade agravada pelo recuo tribalista de um partido que se diz de “massas”. “A Frelimo é o Povo!” gritava Samora, mas que guarda as ma$$as para um grupo cada vez mais reduzido.
A utopia que pairava no ar quando Chapo viu a luz do dia no agora longínquo ano é uma doce recordação de um país martirizado por um liberalismo bandido, pela consagração de uma burguesia prostituída aos sabores e encantos de grupos criminosos internacionais e pela cada vez mais ousada e desavergonhada malandragem local.
A burguesia, outrora combatida num hino “Avante operários camponeses/ na luta contra a exploração (...) Somos soldados do povo marchando em frente na luta contra a burguesia”. Hoje o revolucionário refrão foi substituído pelo liberal “pela paz, pelo progresso” vincando uma união quase incestuosa numa Frelimo bipolar onde Chapo não é nenhum extraterrestre nas metamorfoses que atravessam a história do partido e do país.
Aliás, Bob Dylan anunciara nas vésperas da queda do murro de Berlim que “the times are changing” e a Guerra Fria hoje decorre sob outros prismas e em pequenos tamanhos, onde a economia é campo fértil. Chapo pode agarrar o ceptro mas o consulado de Nyusi pode deixar-lhe de herança, tal como Guebuza deixou a Nyusi, uma realidade minada e múltiplos barris de pólvora com os rastilhos acendidos:
1.) as Dívidas Ocultas: apesar das boas notícias recentes;
2.) Cabo Delgado: onde ainda se escondem na noite os feiticeiros da estranha guerra que martiriza inocentes e fortalece um grupo específico que ainda esconde-se nas sombras; e
3.) o tráfico de drogas: que ganha mais terreno na nossa sociedade que assaltou muitas instituições e já gangrena o país.
As notícias falam de um Nyusi que levou Chapo pelas mãos para Kigali para o chancelar junto ao General Paul Kagamé, (O Mau) o verdadeiro Comandante em chefe da luta contra o terrorismo e da protecção dos interesses gauleses na região Austral de África. Uma iniciação que pode custar muito caro a Chapo.
Chapo é um dos “quadros” saídos dos bancos da Faculdade de Direito da maior e mais importante universidade pública moçambicana. Certamente, aprendeu dos seus professores e mestres, conhecimentos sólidos sobre as múltiplas dimensões da natureza do Estado de Direito democrático, do primado da lei e dos riscos da sua subversão. Não é de todo desavisado.
Outro dinamismo que nos é dado a assistir é a romaria do entrosamento apressado, nos círculos partidários de um Chapo (já) Presidente e da repetição da entronização do líder visionário no movimento associativo de “Amigos de Chapo”, “Família de Chapo”, “Tias de Chapo”, “Colegas de Chapo”, “Vizninhos de Chapo”. Tal como aconteceu com Nyusi, mas na versão exagerada da então Anyusi. Sendo, sempre, os seus mentores movidos por muito boas intenções, as tais que enchem o inferno e a terra infernizando a nossa já mísera vida.
Assiste-se nas televisões ou em leaks imprudentes, um Chapo bastante ocupado ou uma multidão bastante agitada em tê-lo como seu, ou à espera da sua atenção. Empresários, académicos, políticos, músicos, homens, mulheres e crianças, santos e pecadores. Todos estão à espera do Mano Chapo para lhe renderem as vénias e o colocarem no panteão de líder visionário e colherem os frutos dessa entronização enganadora para anos depois falarem mal dele e o acusarem de não ouvir ou de ser alguma coisa até incapaz e ambicioso.
Numa organização já assumidamente assaltada, falta apenas assaltar o próximo timoneiro e tudo está a ser feito nesse sentido. Deste lado, pedimos e alertamos, Mano Chapo, que ponha a família de lado e acima de tudo proteja os seus filhos das tóxicas poeiras do castelo do poder quando escolher seguir esses grupos de malandros e abandonar os desejos e vontades adiadas de um país e um povo que até aqui, quando não faz guerra, só tem vivido de bichas, reuniões e promessas.
Esperamos, rezamos e esperamos que seja finalmente o tão esperado Pagador de Promessas.