Já se passaram meses desde que os bancos decidiram apertar o cerco ao uso dos cartões de crédito e débito para efectuar pagamentos fora de Moçambique e, mesmo após o Banco de Moçambique anunciar o levantamento dessas restrições, muitos cidadãos continuam a ver os seus cartões rejeitados ou limitados, ficando “pendurados” ao tentar adquirir determinados serviços e produtos no exterior.
Os relatos são trazidos por moçambicanos que se encontram na China, África do Sul e em outros países, e que não conseguem realizar transacções bancárias com os seus cartões. Ao tentarem realizar pagamentos, relatam, recebem mensagens dos seus bancos informando que é proibido usar cartões bancários para importar mercadorias com fins comerciais, mesmo quando o objectivo é apenas comprar algo para consumo próprio.
“Na sexta-feira da semana passada, fiz uma viagem para a África do Sul para comprar roupa para os meus filhos. Como não queria levar dinheiro em mão, optei por pagar com cartão nos terminais POS. Até então, tudo corria bem. Em todas as lojas de roupa por onde passei, o meu cartão funcionou sem problemas. Porém, tudo mudou quando cheguei a um posto de combustível onde o pagamento a cartão foi recusado. A seguir, fui até ao ATM mais próximo, mas também não consegui levantar dinheiro. Tentei os cartões do Standard Bank e do BCI, e ambos foram recusados. Tive de depender de um amigo que me enviou algum valor via M-Pesa. Foi bastante constrangedor ter de pedir ajuda nessa situação”, contou frustrado Hilário Mafume.
Albertina Manguele, residente no bairro da Matola-Gare, que decidiu fazer compras em Nkomati, na África do Sul, também foi apanhada em contrapé. Ela saiu de casa com poucos rands, contando com o uso do cartão para completar as despesas.
“Fiquei chocada ao entrar em várias lojas e ver placas informando que não aceitam cartões do BIM e do BCI. Para o meu azar, eram os únicos que eu levava. O que mais me doeu foi quando entrei num restaurante para comer alguma coisa, depois de andar o dia todo sem conseguir comprar nada, e também não consegui pagar. Entrei no Nkomati às 6h00 e só consegui a primeira refeição às 16h00, porque não podia usar o meu próprio dinheiro fora do país. Socorro! Pedimos a quem de direito que organize esta selva”, disse Manguele.
“Aqui na China acontece o mesmo. Estamos a viver dias extremamente complicados. Como continuar a sobreviver no estrangeiro se não podemos usar os nossos cartões? Não conseguimos pagar alimentação, transporte e nem fazer as nossas compras habituais. Porque os bancos não limitam o valor diário de transacções em vez de nos impedir de usar os nossos cartões?”, questionou Benedita Macamo, que está actualmente na China.
Laicínia Argel Milice, estudante, também residente na China, relatou entre lágrimas que exige ser tratada com dignidade. “Não quero mendigar ao governo aquilo que é fruto do meu próprio suor. Corremos o risco de ser expulsos das residências onde vivemos, porque estamos há dias sem conseguir dinheiro para pagar a renda. Só estamos a pedir acesso ao nosso próprio dinheiro”, disse, com sentimento de raiva.
Lembre-se que o Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, declarou na semana passada que as restrições já foram oficialmente levantadas. No entanto, os moçambicanos continuam a enfrentar dificuldades graves para realizar transacções no exterior através dos seus cartões.