Decorreu, semana finda, a primeira sessão plenária efectiva de debate parlamentar, com as quatro bancadas parlamentares a discutirem as informações do Governo à Assembleia da República, as primeiras partilhadas pelo novo Executivo com o novo Parlamento.
Considerada uma nova era, onde o Governo de Daniel Chapo se propõe a fazer diferente “para obter resultados diferentes”, o Parlamento mostrou-se igual ao que já habituou a sociedade, com as bancadas parlamentares da oposição a atacar as opções governativas e a Frelimo, a maioritária, a dedicar-se aos aplausos das acções do Governo, numa demonstração clara de alinhamento (partidário) entre o poder executivo e legislativo.
Em dois dias de debate parlamentar (quarta e quinta-feira passadas), o estreante PODEMOS e os calejados Renamo e MDM centraram os seus debates na necessidade de o Governo esclarecer as razões de, até hoje (desde 2011), ainda não ter conseguido combater o crime de raptos; a falta de responsabilização na fracassada intervenção da FMA (Fly Modern Ark) na LAM (Linhas Aéreas de Moçambique); e a violência policial testemunhada durante os protestos pós-eleitorais.
Por exemplo, o estreante deputado António Jorge Acácio, do PODEMOS, questionou “como o Governo irá garantir a inclusão [aos fundos de recuperação económica] de todas as entidades vítimas de vandalização durante as manifestações, até à barraca de um simples cidadão”.
Lembre-se que, há dias, o Governo brindou um restaurante, com ligações ao partido Frelimo, em Nampula, com um cheque de 25 milhões de Meticais para sua “recuperação económica” após as manifestações populares.
Intervenções idênticas à de António Jorge Acácio foram ouvidas nos dois dias de debate da parte dos deputados da oposição. “São quase 50 anos de independência nacional e nada justifica que Moçambique, com todo o potencial, tenha acumulado dificuldades acima de dificuldades em cada sector e em cada província, com comunidades enfrentando desafios reais que não podem ser ignorados”, disse Ivone Soares, da Renamo, questionando “até quando” os moçambicanos estarão mergulhados “nesse sofrimento”.
No entanto, da maior bancada parlamentar, o cenário era diferente. A Frelimo demonstrou, mais uma vez, a sua satisfação pelo trabalho do Executivo, alegando que os resultados são inquestionáveis. Aliás, em alguns momentos, os deputados vestiam a pele de membros do Governo, relatando as realizações, incluindo o contestado processo de pagamento de horas extras.
“A nossa leitura é clara e inequívoca: os sinais são encorajadores, as acções são visíveis e o rumo é promissor”, defendeu o deputado e membro da Comissão Política da Frelimo Aires Ali, secundado por uma dezena de “camaradas”, entre eles, o jurista e ex-analista político e criminal Elísio De Souza.
“Cumpre-me encorajar o Governo que, ainda em pleno início do mandato, já demonstra, por si, várias e impactantes realizações, muito além do que era espectável. Analogicamente, pode dizer-se que é como uma criança de três meses que já deixou de gatinhar e caminha com passos firmes e decisivos”, disse o deputado eleito pelo círculo eleitoral da Zambézia.
“Nós, bancada parlamentar da Frelimo, após as apresentações do Governo, reconhecemos os passos positivos dados pelo Governo nos seus primeiros 50 dias (…)”, como a revisão em baixa dos preços do combustível, os esforços para a estabilização dos preços dos produtos de primeira necessidade e a construção de 30 salas de aulas, na província de Maputo, segundo a deputada Leonor Neves Mondlane.
Com 171 deputados, que lhe conferem maior tempo de antena, a bancada parlamentar da Frelimo foi replicando o discurso e aplausos, alternando com saudações à “sábia condução dos debates” pela Presidente da Assembleia da República, Margarida Adamugy Talapa, e à uma governação com “soluções sustentáveis” e “centradas no bem-estar dos cidadãos”.
Em todas as intervenções dos deputados do partido no poder não se ouviu quaisquer questões de insistência sobre as respostas do Governo, como, por exemplo, a falta de responsabilização no contrato celebrado entre o anterior Governo e a FMA, no quadro da revitalização da LAM. Trata-se, na verdade, de uma marca antiga e indelével no Parlamento moçambicano, onde a Frelimo aplaude (até o não pagamento do 13º salário), enquanto a oposição dedica aos ataques às decisões e políticas de governação.
Refira-se que, no quadro da revitalização da LAM pela FMA, o Estado moçambicano está sendo exigido uma indemnização de 21 milhões de USD pela companhia aérea portuguesa euroAtlantic, ex-parceira da LAM na falhada operação Maputo/Lisboa, rota reintroduzida pela companhia, em Dezembro de 2023.