O jornalista português e especialista em cobertura de guerra, José Rodrigues dos Santos, defende que o profissionalismo, no tratamento de assuntos de guerra, em particular dos ataques terroristas que ocorrem na província de Cabo Delgado, deve começar pelas próprias Forças Armadas, que devem criar condições para que os jornalistas possam cobrir os factos no teatro operacional.
A tese foi defendida esta quarta-feira, numa conferência virtual, organizada pelo Instituto de Comunicação Social Para África Austral (MISA), capítulo de Moçambique, com o objectivo de discutir questões relacionadas à “verdade, liberdade de imprensa e segurança dos jornalistas em ambiente de guerra”, e vêm a propósito das últimas declarações do Chefe de Estado, segundo as quais, alguns órgãos de comunicação social estão a “desinformar” e “manipular” a opinião pública em torno da real situação, naquele ponto do país.
Segundo o jornalista da Rádio e Televisão de Portugal (RTP), “o profissionalismo deve começar pelas próprias Forças Armadas, isto é, têm de enquadrar os jornalistas e permitir que eles vão aos sítios, porque, senão, o jornalista só pode ser um louco (...)”.
Prosseguindo, a fonte explicou: “primeiro passo é o que são as Forças Armadas moçambicanas. Qual é grau de profissionais que elas têm para enquadrar jornalistas para mostrar a situação. As limitações não nascem dos jornalistas, mas das limitações impostas pelas forças no terreno, sejam do Estado Islâmico, sejam do Exército moçambicano”, sublinhou.
Na sua explanação, José Rodrigues dos Santos realçou que a cobertura jornalista, em momentos de guerra, “não é fácil”, sobretudo, obter os dois lados da moeda, pois, “o Estado Islâmico não está preocupado em exprimir o seu ponto de vista de uma maneira independente, porque tem um projecto específico, que é impor a sharia”, enquanto “compreendem que o jornalista tem maneira de trabalhar diferente (...) e jornalistas que se põem do lado dos jihadistas acabam se colocando numa situação perigosa”.
“Do ponto de vista de trato normal, são pessoas simpáticas, afáveis, muito educadas, mas têm esta visão do mundo. Por outro lado, do ponto de vista do exército regular, é um exército que tem vocação para lidar com jornalistas. Neste confronto entre jihadistas, de um lado, e o exército, do outro, criam uma situação muito difícil de cobrir”, acrescentou.
Para o especialista, o fechamento das Forças de Defesa e Segurança (FDS) torna difícil a cobertura jornalística do conflito, pois, o exército tem uma tradição e/ou formação autoritária, devido às ligações comunistas e socialistas, enquanto os jihadistas não têm interesse em falar à imprensa.
Por isso, a fonte entende que as melhores fontes de informação, em ambientes de guerra, são as instituições independentes, como as igrejas e os civis, pois, os militares, na maior parte das vezes, têm mentido e/ou ocultado informações. “Pode existir uma grande derrota e dizerem que é uma vitória”, sublinhou.
Aliás, sobre o patriotismo dos jornalistas, o jornalista atira: “o anti-patriota é quem mente e oculta a verdade; é quem deixou Mocímboa da Praia ser tomada”. Por isso, defende que o Estado deve ter força para fazer frente aos jihadistas e não intimidar os jornalistas para justificar sua incompetência.
Refira-se que José Rodrigues dos Santos nasceu, em Moçambique, a 01 de Abril de 1964, sendo jornalista da RTP desde 1991, onde se tornou o rosto mais conhecido da televisão pública na cobertura da primeira guerra do golfo. (Omardine Omar)