No dia em que se celebra o Dia Mundial da Água, data instituída pelas Nações Unidas (NU) para chamar a atenção ao consumo consciente e sobre a grande importância do acesso universal e sustentável aos serviços de abastecimento de água, o lema chama a atenção sobre a tragédia das cheias e inundações que, ciclicamente, também tem devastado Moçambique: é celebrado sob o Libertar os Caminhos da Água.
Apela-se à mudança para evitar cheias e inundações. O lema não foi escolhido ao acaso: as mudanças climáticas têm contribuído para a alteração dos padrões de precipitação e a frequência de condições meteorológicas extremas, o que por sua vez, aumenta o risco de cheias e inundações, bem como a emergência de surtos de doenças transmitidas pela água, tais como a cólera, diarreias e malária. Esta condição é exacerbada pela ocupação desordenada da terra,planificação urbana precária, o que concorre para encerramento dos caminhos d'água.
As inundações recentemente havidas no Distrito Boane, Província de Maputo, deixaram um rasto de destruição de infraestruturas e deixou um número elevado de desalojados, o que nos deixa uma séria reflexão sobre o impacto das Mudanças Climáticas na provisão dos serviços de ASH, planificação urbana e na gestão sanitária.
O ciclone Freddy causou inundações catastróficas tanto em Moçambique, como no Malawi - países que têm surtos graves de cólera - criando um risco agudo de exacerbação da propagação da doença.
Citando a Organização Mundial de Saúde (OMS), a WaterAid - Organização Não Governamental (ONG) que trabalha no sector de Água, Saneamento e Higiene (ASH) emitiu um aviso severo de que a actual crise de cólera é uma pandemia que põe em risco mais de um bilião de pessoas no mundo.
“Uma tempestade perfeita de alterações climáticas, conflitos e crises financeiras juntamente com as migrações criaram uma crise de cólera sem precedentes a nível global - provocando surtos em larga escala em países que, durante muitos anos, estiveram livres desta doença altamente contagiosa”, avança a organização, que actua em Moçambique desde 1995.
O aumento alarmante dos casos de cólera surge quando a Global Task Force for Cholera Control (GTFCC) adverte que o pior poderá estar ainda por vir. A modelização da GTFCC mostra que o crescimento populacional e a urbanização rápida e não planeada podem levar a uma duplicação dos casos de cólera nos próximos 20 anos, se não forem tomadas medidas urgentes.
Adam Garley, Director Nacional da WaterAid Moçambique disse: “os surtos tendem a seguir o ciclo anual da estação das chuvas e afectam desproporcionalmente as comunidades que não têm acesso ao saneamento básico e à água limpa. Nas áreas que se debatem com o actual surto, a falta de infraestruturas e de recursos para campanhas de educação e sensibilização para a saúde pública está a dificultar o controlo da propagação da doença. Tais crises são susceptíveis de ser agravadas pelas alterações climáticas à medida que os padrões pluviométricos se tornam cada vez mais intensos e imprevisíveis”.
Tal como a pandemia da Covid-19, o actual surto de cólera sublinha a necessidade urgente dos governos investirem em água, saneamento e comportamentos higiénico seguro. Estes três elementos essenciais, são a única solução, a longo prazo, para pôr fim a este ciclo dispendioso de doença e morte. A melhoria do acesso aos serviços sustentáveis de água e saneamento não servirá apenas para controlar a cólera, mas também ajudará a parar a propagação de uma série de outras doenças transmitidas por via da água, tais como a diarreia, responsável por 20% das admissões hospitalares em Moçambique e que é a segunda principal causa de morte em crianças menores de cinco anos nos dois países (Moçambique e Malawi).
Este ano, as celebrações do Dia Mundial da Água tem o condão de coincidirem com o arranque, a 22 de Março, em Nova Iorque, EUA, da Conferência da ONU sobre Água, edição 2023. As Nações Unidas reconhecem que, no mundo, biliões de pessoas ainda vivem sem água potável e saneamento geridos com segurança, embora o acesso à esses serviços tenha sido, há muito, definido em muitos países como um direito humano básico. A água e a pobreza estão intimamente ligadas. Sem água, não há desenvolvimento, e sem desenvolvimento, é impossível erradicar a pobreza.
Espera-se que esta Conferência adopte a Agenda de Acção para Água como um resultado principal, representando compromissos voluntários de países e partes interessadas para cumprir os objectivos e metas globais relacionados com a água.
Na Conferência, Moçambique é representado pelo Ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, Carlos Mesquita, acompanhado pelo Director Nacional de Abastecimento de Água e Saneamento, Raúl Muthevue.
A WaterAid faz-se representar por uma delegação que inclui Moçambique, África do Sul, Reino Unido e América.(Carta)