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quarta-feira, 15 julho 2020 05:39

Nampula registou “incursões” do Al Shabaab em 2017 – avança pesquisador do IESE

Depois de o professor sénior de história africana e imperial na Queen's University de Belfast, na Irlanda do Norte, Eric Morier-Genoud, ter revelado, semana finda, que as primeiras manifestações de insurgência, que se vive em alguns distritos da província de Cabo Delgado, desde Outubro de 2017, tiveram lugar no distrito de Balama, naquela província da zona norte do país, no ano de 2007, agora é a vez do pesquisador e também Director do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), Salvador Forquilha, avançar que a província de Nampula também registou a presença da seita Al Shabaab, em Março de 2017.

 

A novidade foi avançada esta terça-feira, durante a conferência virtual organizada pelo IESE, com o objectivo de reflectir se a província de Nampula “pode ajudar a pensar o conflito de Cabo Delgado”. O encontro contou com cerca de 68 participantes, entre os quais os professores Lorenzo Macagno (orador principal) e Eric Morier-Genoud (comentador).

 

Segundo Salvador Forquilha, em Março de 2017 – sete meses antes do início dos ataques militares na província de Cabo Delgado – a seita Al Shabaab (que integra o grupo terrorista que actua em Cabo Delgado) já se fazia presente na província de Nampula, tendo sido denunciada à representação do Conselho Islâmico de Moçambique naquela província e, posteriormente, ao então Governador de Nampula, Vítor Borges.

 

“Na nossa visita recente a Nampula, constatámos que, já em 2017, antes dos acontecimentos de Mocímboa da Praia, em Outubro, entre Março e Junho, temos uma movimentação desta seita em Nampula. Ela foi denunciada em Março a dizer-se que «na nossa Mesquita há um senhor que está a pregar um islão que não é habitual. Estamos todos assustados». O Conselho Islâmico fez reuniões (uma em Abril com o suposto grupo da seita e os responsáveis das mesquitas em Nampula e outra em Maio) e, em Junho, produziu um relatório que encaminhou ao Governador de Nampula. Não sei qual foi o seguimento”, afirmou Forquilha, durante a sua intervenção no debate.

 

Forquilha, que diz ter tido estes dados no âmbito de uma pesquisa em curso sobre a insurgência na província de Cabo Delgado, mas com foco na província de Nampula, afirma que alguns membros da seita eram provenientes da província de Cabo Delgado, em particular dos distritos de Macomia e Mocímboa da Praia.

 

“Lendo os documentos produzidos nesses encontros, constatámos que há muita semelhança no que tange às ideias defendidas pela seita de Nampula com aquilo que encontramos em Cabo Delgado em 2017 e 2018”, disse a fonte, referindo-se ao estudo realizado entre 2017 e 2018 sobre a radicalização islâmica no norte do país, tendo como caso de estudo o distrito de Mocímboa da Praia.

 

Entretanto, o pesquisador levantou dois aspectos que, na sua óptica, merecem uma profunda reflexão. Um está relacionado às razões que concorreram para que o grupo não enveredasse pela via militar na província mais populosa do país; e outro está relacionado com o facto de a província ser um dos pontos de recrutamento dos membros do grupo.

 

“Se não fosse pela sua forte militarização, não hesitaria em considerar o grupo como «messiânico», apesar de não ter «Messias»” – Lorenzo Macagno

 

Por sua vez, o Professor Associado de Antropologia da Universidade Federal do Paraná (Brasil), Lorenzo Macagno, que realiza trabalhos de campo em Moçambique, desde 1996, afirma que, quando esteve em Nampula, em 2003, a província apresentava realidades diferentes da província de Cabo Delgado e que constatou haver um “islão hospitaleiro” naquele ponto do país.

 

Apesar de admitir que nunca esteve na província de Cabo Delgado, a fonte entende que as desigualdades sociais não podem ser apontadas como factor principal da insurgência, pois, existem experiências de desigualdades sociais a nível do continente africano, assim como na América Latina, mas que nunca desembocaram no “jihadismo”. O mesmo, sublinha a fonte, estende-se aos projectos de exploração de gás natural em Palma e do rubi em Montepuez.

 

Para Macagno, se não fosse pela sua forte militarização, não hesitaria em considerar o grupo como “messiânico”, apesar de não ter “Messias”, pois, “apresenta-se como um grupo salvacionista”.

 

“Moçambique deve lidar com uma insurgência do tipo islamita e com uma minoria que reivindica direitos exclusivistas e salvacionistas. Não sabemos se a estratégia securitária ou da militarização será a mais eficaz, pois, enxergamos com alguma preocupação a situação”, considerou o académico.

 

Já o professor sénior de história africana e imperial na Queen's University de Belfast, na Irlanda do Norte, Eric Morier-Genoud, defende que o grupo que actua na província de Cabo Delgado não se encaixa no grupo Estado Islâmico, apesar de ambos defenderem a “utopia de ter um mundo perfeito”.

 

Segundo Eric Morier-Genoud, é necessário aprofundar-se pesquisas, como é o caso do tipo de fundamentalismo que se propala na província de Cabo Delgado; e o estudo das relações entre Moçambique e África do Sul, Moçambique-Zimbabwe e Moçambique-Tanzânia, vizinhos de Moçambique. (A. Maolela)

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