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segunda-feira, 30 março 2020 05:29

Análise: Será que o bloqueio completo vai achatar a curva da pandemia em Moçambique? Por Marcelo Mosse

O bloqueio completo ("lockdown") é a mais rigorosa das medidas de distanciamento social recomendadas para conter a disseminação do coronavírus. Estas medidas de distanciamento social visam alcançar aquilo a que os especialistas chamam de achatamento da curva, que consiste em fazer com que os casos de infecção se dispersem por um período de tempo mais longo, ao invés de se concentrarem num curto espaço de tempo.

 

O objectivo deste achatamento é o de permitir que o número de casos que requerem atenção hospitalar não ultrapasse a capacidade dos serviços nacionais de Saúde. Simplificando, imagine-se que numa determinada região existem apenas 50 ventiladores. Se houver 250 doentes a precisarem deles ao mesmo tempo, 200 correrão sérios riscos de morrer.

 

O achatamento da curva permite que, em vez de termos 250 doentes a necessitar desse tipo de assistência ao mesmo tempo, tenhamos, por exemplo, 50 doentes por semana, ao longo de 5 semanas. Obviamente que os números são fictícios, e a capacidade dos sistemas nacionais de saúde não se resume ao número de ventiladores disponíveis. Mas o exemplo ilustra bem o que se pretende alcançar com o achatamento da curva, proporcionado por medidas draconianas de distanciamento social. Elas não visam reduzir o número total de casos, mas ao permitir a sua dispersão no tempo, garantem que muitas vidas sejam salvas. Por essa razão, por maiores que sejam os custos económicos, em muitos países o "lockdown" justifica-se pelo número de vidas que são poupadas.

 

E o que dizer de Países como o nosso, em que a capacidade do sistema nacional de Saúde é próxima de zero, e em que um bloqueio geral poderá levar a que muitas pessoas deixem de ter sustento durante largos períodos de tempo?

 

Voltando ao nosso exemplo, imaginemos um caso em que existem apenas 5 (em vez de 50) ventiladores para atender os mesmos 250 doentes. Será alguma vez possível achatar tanto a curva? Mais, as vidas salvas serão maiores do que as perdidas pelo facto de muitas pessoas deixarem de ter acesso a sustento?

 

Estas são as questões que temos de responder para saber se faz sentido avançarmos com um bloqueio geral em países como o nosso. Se não existem dúvidas de que os sacrifícios económicos valem sempre a pena, quando se trata de salvar vidas, existe, no nosso caso, o risco de impormos esses sacrifícios sem que consigamos salvar qualquer vida, e até colocando mais em perigo. Estas questões precisam de ser dissecadas por especialistas, antes de avançarmos com medidas que visem apenas seguir um "guião" que nos coloque nas boas graças das instituições internacionais. (Marcelo Mosse)

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