Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI
terça-feira, 28 janeiro 2020 03:47

Os desafios que o ambientalista Jaime Neto vai enfrentar no Ministério da Defesa Nacional

No passado dia 18 de Janeiro, em cerimónia dirigida pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, Jaime Bessa Neto tomou posse como o novo Ministro da Defesa Nacional (MDN). No cargo, Neto substituiu o veterano Major Geral Atanásio M´tumuke, que permaneceu no cargo durante cinco anos.

 

Jaime Bessa Neto, de 48 anos de idade, não tem qualquer passagem pelo exército moçambicano. É licenciado em Geografia e mestrado em Ciências Ambientais. No seu currículo, para além de ter sido deputado da Assembleia da República eleito pelo partido Frelimo, isto para a VIII Legislatura, pontificam alguns cargos de chefia e direcção no Conselho Municipal da cidade da Beira e no Centro de Higiene Ambiental e Exames Médicos, naquela mesma cidade.

 

Antes de ser nomeado ao cargo de ministro da Defesa Nacional, Jaime Neto exercia as funções de Primeiro Secretário da Frelimo em Sofala.

 

Na última segunda-feira (20), Jaime Bessa Neto recebeu oficialmente as “pastas” das mãos do seu antecessor, contendo os diversos dossiers inerentes ao Ministério que passará a dirigir. Após receber o expediente documental, falou, pela primeira vez, como novo timoneiro da Defesa. Não se fazendo rogado, tratou logo de afastar os “fantasmas” que pudessem surgir nalgumas mentes, em virtude de ele ser um civil: “Para ser Ministro da Defesa não preciso de ser militar, é uma área de gestão. Penso que temos um apoio muito especial de Sua Excia, o Presidente da República. Vamos poder ouvir as suas orientações e caminhar em frente”, disse na referida cerimónia de recepção de pastas.

 

Jaime Neto mandava, assim, um recado para dentro, deixando, logo à partida, bem claro, para “ala castrense” daquele conturbado Ministério, que tinha total confiança e apoio do Comandante-em-Chefe das Forças de Defesa e Segurança (FDS).

 

O que o “ambientalista” vai enfrentar no MDN?

 

O Ministério da Defesa Nacional tem como missão: executar a política de defesa nacional, assegurar e fiscalizar a administração das Forças Armadas e dos demais órgãos e serviços deles dependentes.

 

No que respeita aos objectivos estratégicos, destacam-se: Consolidar as bases jurídico-legais e reforçar a cooperação interna e internacional; Assegurar a obtenção de Recursos Humanos à altura de responder com eficiência e eficácia aos desafios da Defesa; Melhorar a estrutura organizacional e operacional do Sector da Defesa; Garantir o levantamento das capacidades operacionais das Forças Armadas de Defesa de Moçambique.

 

Fazem ainda parte dos objectivos estratégicos: Garantir a operacionalidade e a manutenção de meios nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique; Promover o desenvolvimento da indústria de Defesa; Alinhar a localização das infra-estruturas básicas militares com a estratégia de Defesa e Segurança do país; Assegurar o desenvolvimento das infra-estruturas básicas da Defesa; e Garantir o apoio multilateral das FADM para assegurar o cumprimento das suas missões perenes.

 

Jaime Bessa Neto assume as funções de Ministro da Defesa Nacional, numa altura em que o país enfrenta desafios profundos no que à paz e segurança diz respeito. Os ataques armados que têm estado a ocorrer em Cabo Delgado, desde 2017, perpetrados por indivíduos ao que tudo indica inspirados no radicalismo islâmico, bem como os ataques na região centro do país, cuja autoria moral e material atribui-se à autoproclamada Junta Militar da Renamo, liderada por Mariano Nhongo, são prova ilustrativa.

 

A insegurança nas regiões norte e centro do país é, na verdade, um fardo deixado por Atanásio M´tumuke, que durante os cinco anos em que permaneceu no cargo demonstrou manifesta incapacidade de dar cobro a essas situações. Apesar dos seus discursos, quase sempre musculados, no campo mediático, a prática sempre tendeu a revelar um quadro inversamente oposto à sua auspiciosa narrativa. Ou seja, a morte de civis e as baixas do lado do exército governamental foram sempre uma realidade no teatro das operações.

 

A única acção enérgica do sexagenário então Ministro da Defesa, no quadro das investidas contra os “insurretos” em Cabo Delgado, foram mesmo os propagandísticos comunicados de imprensa que, na essência, relatavam que as FDS “assestaram golpes de artilharia”, às posições daquele grupo armado. Entretanto, enquanto as FDS “assestavam golpes de artilharia” os insurgentes, por outro lado, não paravam de visar alvos civis e, até mesmo, posições do exército governamental, precipitando, deste modo, o desaparecimento, à velocidade da luz, dos badalados comunicados de imprensa.  

   

Desde que os ataques em Cabo Delgado iniciaram em Outubro de 2017, estima-se que cerca de 350 pessoas, entre civis e militares, perderam a vida. Em consequência dos ataques armados na região centro, que as autoridades implicitamente imputam ao grupo que se diz dissidente do maior partido da oposição, a Renamo, até ao momento perderam a vida 21 pessoas. Aldeias e viaturas que circulam ao longo das Estradas Nacionais 1 e 6 são os alvos preferenciais do bando atacante.

 

Discursando durante a visita ao Quartel-General das FADM, na passada quarta-feira, Jaime Neto pediu aos moçambicanos para que depositassem total confiança nas Forças de Defesa e Segurança, no combate aos bandos armados que atacam quer em Cabo Delgado, como em Sofala e Manica. 

 

A implementação efectiva dos consensos resultantes do Acordo de Paz e Reconciliação de Maputo, rubricado pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, e Ossufo Momade, Presidente da Renamo, é outro dossier que o também geógrafo vai encontrar no MDN. Concretamente, o referente ao Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR), da força residual da Renamo.

 

Depois da assinatura do “Acordo de Maputo”, a 6 Agosto de 2019, não se conhecem, pelo menos publicamente, grandes desenvolvimentos do assunto, senão a conversão de 10 antigos guerrilheiros da Renamo a membros da Polícia da República de Moçambique (PRM).

 

Antes da assinatura daquele que também ficou conhecido como o terceiro acordo de paz, desde a Assinatura do AGP de Roma em 1992, catorze oficiais (três Generais e onze oficiais superiores) foram enquadrados nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM).

 

Cada um dos três Generais chefia um departamento do Estado-Maior General (Departamentos de Operações, de Informações Militares e de Comunicações); quatro chefiam Repartições do Estado Maior General do Ramo do Exército; um é Comandante de Brigada; dois são Comandantes de Batalhões Independentes; dois são chefes de Estado-Maior de Brigadas e dois chefiam, igualmente, o Estado Maior de Batalhões Independentes.

 

À margem da participação de Moçambique na Cimeira de Investimento Reino Unido- África, que decorreu em Londres, Filipe Nyusi disse que a demora na apresentação do real efectivo da força residual do maior partido da oposição pode estar a complicar e a gerar alguma demora no processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração.

 

Ainda à margem da referida reunião, o Comandante em Chefe das FDS mostrou-se surpreendido com os números apresentados pela Renamo, no que ao seu efectivo diz respeito. Nyusi ressalvou a necessidade de a contraparte apresentar uma “informação lógica, aceitável e credível”.

 

De acordo com fontes oficiais, o maior partido da oposição enviou uma lista de 5200 guerrilheiros, realidade que está a suscitar inúmeros questionamentos em torno da credibilidade e fiabilidade da informação.

 

O chefe do Estado disse em Londres que o Governo Britânico anunciou recentemente que tinha entre 200 a 300 mil libras para apoiar o processo de implementação do DDR.

 

A implementação do presente Acordo é feita pelas estruturas criadas ao abrigo do Memorando de Entendimento sobre Assuntos Militares, designadamente a Comissão de Assuntos Militares (CAM); Grupo Técnico Conjunto de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (GTCDDR); Grupo Técnico Conjunto de Monitoria e Verificação (GTCMV).

 

A extensa costa que o país possui é outra “dor de cabeça” que o geógrafo irá encontrar no MDN. Jaime Neto herda uma instituição quase sem meios materiais, para fazer face às crescentes ameaças impostas pelo crime organizado, nos cerca de 2700 quilómetros de costa que o país possui. O tráfico de drogas e de pessoas e ainda a pesca ilegal são algumas das ameaças para as quais este ministério deve ser dotado de capacidades, para dar uma resposta à altura.

 

Em terra e no ar, esta instituição, também na componente de meios materiais, vê-se sem capacidade para dar respostas, numa altura em que as contas públicas encontram-se no precipício em consequência das dívidas ilegais contratadas. 

 

A formação e especialização figura, igualmente, nos dias que correm um verdadeiro desafio para as Forças Armadas de Defesa de Moçambique. Neto terá de encontrar uma fórmula que garanta a formação e especialização dos quadros, oficiais, aos mais variados níveis da hierarquia militar das FADM, e nas diversas áreas científicas, de modo a serem capazes de defender a soberania e a integridade territorial.

 

Acabar com o sindicato mafioso que se dedica ao descaminho da logística militar (fardamento, material bélico e viveres) para fins contrários aos que nortearam a sua aquisição e a revitalização das infra-estruturas militares são outros pormenores que o novo timoneiro do MDN terá de tomar em consideração. (Carta)

Sir Motors

Ler 7970 vezes