A Defensora dos Direitos Humanos das Mulheres, Maira Solange Hari Domingos, morreu na última sexta-feira (27 de Janeiro), no Hospital Central de Maputo, vítima de malária, e era considerada uma das maiores activistas dos direitos das mulheres em Moçambique.
Até à data da sua morte, trabalhava no Fórum Mulher, onde desempenhava as funções de Directora de Programas. A sua área de especialidade era Direitos Sexuais e Reprodutivos, Violência Baseada no Género e Participação Política das Mulheres.
Os colegas lembram-se da Maira desta forma: enquanto dispersamos a luta, o opressor nos vai enfraquecer, é preciso sermos estratégicas e cada passo deve ser registado. Trabalhamos com visibilidade sem querer protagonismo pessoal e, sim, colectivo, porque no fim somos as mesmas mulheres e usar título em luta colectiva afasta as outras mulheres. O Feminismo Une e Constitui... Não esqueçamos as abordagens, elas se reinventam a cada nova forma do opressor. Sempre digo que a opressão tem uma lógica que não pode ser ignorada. Lutemos conscientes de que eles usaram a nossa liberdade para nos destruir e tornarmo-nos inimigas sem necessidade. As jovens estão a perder o poder de análise e questionamento, é preciso voltarmos a elas e elas olharem para as raparigas como quem devem cuidar, há um medo a crescer devido à intimidação política, mas não se enfraqueçam meninas, formem-se, investiguem e documentem, o Fórum Mulher é uma óptima escola, então aproveitem e se reconstituam. De Maira para Jovens Feministas (resumo das 1001 conversas).
Outro testemunho de mais um colega da Maira recorda: “NADA PARA ELAS SEM ELAS”!
Está muito difícil de acreditar que uma malária evitável e que já devia ter sido erradicada do nosso país Moçambique te tenha levado prematuramente.
Não é justo que alguém com a tua caminhada no movimento de mulheres e feminista tenha sido arrancada tão cedo do convívio da filha e do filho, do marido, da família, das companheiras e companheiros do movimento.
Desde que tomámos conhecimento da tua partida para o além na manhã do dia 28 de Janeiro de 2023, que passaram por nós tantos momentos de caminhada conjunta no Fórum Mulher e com as suas organizações, nos nossos lobbies junto da Assembleia da República para o debate e aprovação da Lei da Família, da Lei da Sucessão e Herança, da Lei da Violência Doméstica Praticada contra as Mulheres, do Código Penal e da Despenalização do Aborto, da Lei de Terras, da Lei Contra as Uniões Prematuras, do movimento pela defesa das mulheres com Fístula Obstétrica, das formações sobre Direitos Sexuais e Reprodutivos.
Das nossas participações no Comité do Estatuto das Mulheres na ONU em Nova York, no 13º Congresso Mundos de Mulheres em 2017 na Universidade de Santa Catarina, no Brasil, nos preparativos e realização do 14º Congresso Mundos de Mulheres em Setembro de 2022 em Maputo.
A Maira sempre sorridente, a Maira esperança, a Maira crente num mundo de respeito pelas mulheres, num mundo solidário, inclusivo, sem pobreza.
Continuas e continuarás connosco nos nossos corações e pensamentos.
Aqui estamos presentes até que todas sejamos livres, honrando o teu exemplo de vida!
Um poema de despedida da Maira…
Obrigada pela tua luta
Obrigada pela tua coragem
Obrigada por não desistir
Obrigada pelo teu exemplo
Vestiste a capulana da mulher moçambicana
Choraste nossas lágrimas
Marchaste nossas lutas
E gritaste nossas vitórias
Conheceste os nossos dilemas
E não vergaste no teu propósito
Seguiste firme entoando um hino
Que o Fórum Mulher e todas nós conhecemos de cor
Numa caminhada que nunca foi fácil
Sujeitas a todo o tipo de conotação
Continuaste presente na defesa daquela camada vulnerável
E empoderaste-a com palavras, crenças e acções
Sempre dissemos que nossas filhas colherão os frutos
De uma machamba que ousamos todas capinar
Semeamos igualdade, regando com sabedoria
Para que amanhã floresçam os frutos de um Moçambique digno de todas e todos!
Que DEUS te receba,
te acolha no leito dos justos
Pois a luta ainda vai longa...
E te honraremos seguindo em marcha...
“ATÉ QUE TODAS SEJAMOS LIVRES”!!!
Maira Domingos era formada em Geografia pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM) e pós-graduada em Estudos de Género no Brasil. Mãe de dois filhos, uma menina de cinco anos e um rapaz de 11 anos. Maira deixa ainda um viúvo. (Carta)