Os nexos entre a celebração das datas das agendas mundiais e a temática doméstica, confere mérito à umas e desmérito às restantes. 28 de Abril, dia mundial da educação, passou quase despercebido para o grande público e até para as instituições com responsabilidades na administração educacional. No ano 2020, foi instituído o 28 de Abril como Dia Mundial da Educação. Foi sob proposta do Fórum Mundial de Educação, realizado em Dakar, no Senegal. Moçambique foi parte integrante deste momento e movimento. Assumiu e incorporou, inclusivamente, uma das suas recomendações mais importantes, a universalização do ensino, com acesso ilimitado predominantemente para as raparigas. Era a resposta que melhor condizia com os objectivos do desenvolvimento humano e de desenvolvimento sustentável. É a partir da educação que conseguiremos ultrapassar os problemas alimentares, melhorar a qualidade da saúde e promover um desenvolvimento sustentável. A qualidade da educação de um país determina o seu nível de desenvolvimento.
Apesar dos progressos registados e dos resultados marcadamente encorajadores, quer em Moçambique, como em vários países signatários, muito em particular no que concerne a redução da exclusão escolar, falta de infra-estruturas, maior contratação de professores e grelhas curriculares mais ajustadas, se constatou, contudo, uma verdadeira encruzilhada. As instituições de educação migraram de problemas mais simples, para os mais complexos e, por vezes, insanáveis. Assegurar que todos têm ingresso e acesso, são conceitos, algumas vezes, irreconciliáveis. Ingresso significa a possibilidade de todos se poderem matricular e fazer parte do processo. Acesso, por sua vez, pressupõe uma aprendizagem com qualidade, usufruto dos recursos disponíveis, e o beneficiar desse conhecimento para o resto de suas vidas.
Um pouco pelo mundo, o 28 de Abril não se traduz, apenas, em momentos de reflexão. Os debates em conferências assumem uma dimensão mais estruturada e prolífica, com anúncios de grandes medidas e políticas que visam melhorar a qualidade da educação. Esta data, serve, igualmente, para expressar as estratégias e modelos tendentes a reverter as dissonâncias e incongruências típicas do sistema. É, no entanto, importante que não se fique somente na identificação dos problemas e num elenco de intenções. É preciso que as intenções se materializem em acções!
A universalização será, sempre, um pau de dois bicos. O preço tem sido demasiado alto, sobretudo nos resultados da aprendizagem. Se inicialmente, os avanços iniciais eram acalentadores e moralizadores, posteriormente, geraram descrédito e índices de desconfiança em cadeia. A qualidade da educação passou a fazer parte do discurso corrente dos peritos e dos leigos. Mesmo considerando o uso e recurso às tecnologias, seria impossível disfarçar os resultados.
Os índices nacionais e internacionais que medem o desempenho da educação, revelam que existe uma incapacidade geral na aprendizagem, com mais de 90% das crianças incapazes de aprender a ler, escrever ou realizar cálculos simples, após três anos de escolaridade. Mais grave, tem sido o desempenho dos próprios professores que, igualmente, não dominam a leitura e a escrita, pautam pelo absentismo, desinteresse pela profissão e por práticas de corrupção inqualificáveis. Estes factos mostram como a qualidade da educação terá de passar, necessariamente, pela formação científica, pedagógica e ética dos professores.
Não admira, pois, que a cada 28 de Abril os educadores revejam os entraves e vazios que estão ocorrendo nos sistemas educativos. Escrevo estas linhas quando se celebra o dia da língua portuguesa, 5 de Maio. Comparo o frenesim deste movimento global, com os silêncios do 28 de Abril. A língua portuguesa, a bom rigor, se tornou no primeiro idioma do mundo a ter uma data oficial reconhecida pela UNESCO e, consequentemente, uma língua com mais de 265 milhões de falantes, em cinco continentes.
Porém, considerando que o nosso sistema de ensino se faz em português, para mais de 8 milhões de alunos do ensino básico, seria meritório que estas celebrações, se puderem associar e consubstanciar nesse quadro de referência entre ensino e língua. Não poderemos ignorar que existem mais moçambicanos que portugueses que se comunicam em português, e que o contexto multilíngue e multicultural que tipifica este país, tem a todo o custo que ser referenciado como parte desse esforço do sistema de ensino, pois, as dificuldades de aprendizagem se prendem às dificuldades em dominar a própria língua portuguesa.
Portanto, num momento em que se debate a língua portuguesa, por todo o mundo, as nossas reflexões vão no sentido de encontrar soluções para enriquecer a aprendizagem da língua portuguesa, mesmo considerando que a diversidade linguística já impôs as marcas das línguas nacionais no português falado em Moçambique. Portanto, assumir que estamos, muitas vezes, impedidos de comunicar com outros moçambicanos, caso não estejamos usando a língua portuguesa, como esse factor de unidade nacional. A qualidade que colocarmos no ensino desta língua terá reflexos imediatos na qualidade de ensino em Moçambique.
O mote da actualidade não está dissociado da pandemia. Os resultados deste ano lectivo, longe das aulas presenciais, têm sido tímidos, pouco consistentes e reveladores de que os ganhos obtidos foram revertidos. São vazios que não podem ser ignorados, num momento em que a esperança tem de suplantar o descrédito.
Por outras palavras, celebrar quer o 28 de Abril ou o 5 de Maio, terá de perpassar os limites das lições dos mestres nas academias e centrar-se nos falantes em todas as esferas da sociedade. Quando o cidadão tiver a consciência que existe um dia mundial da educação, como existe um dia da língua, fará mais sentido celebrar essas datas como um activo familiar, social e cultural.