O Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), entidade pública que controla o sector empresarial do Estado, anunciou, na última terça-feira, a cessação de funções do então Conselho de Administração da Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) e a constituição de um novo Conselho de Administração, composto pelos novos accionistas da companhia e a criação de uma Comissão de Gestão, a ser liderada por Dane Kondic, ex-CEO e Presidente do Grupo EuroAtlantic Airways e I-Jet Aviation.
Seco e sem detalhes sobre as razões destas mexidas, o comunicado do IGEPE dizia que as decisões foram tomadas durante a Sessão Extraordinária da Assembleia-Geral da empresa, que teve lugar naquela terça-feira. Explicava ainda que a Comissão de Gestão (composta por três membros) terá uma função executiva, com responsabilidade de “conduzir a gestão da empresa e garantir a continuidade das operações”. Já o Conselho de Administração terá a função de supervisão.
Quando ainda brotavam questionamentos, e com o IGEPE a furtar-se de dar explicações, a LAM emitiu um comunicado de imprensa a esclarecer as razões da escolha do ex-CEO da EuroAtlantic Airways para liderar as operações da companhia. Lembre-se que a EuroAtlantic Airways, uma companhia aérea portuguesa especializada em leasing, charter e carga aérea, foi parceira da LAM na operacionalização dos recentes voos de Maputo a Lisboa, suspensos em Fevereiro passado.
Segundo a LAM, a nomeação de Dane Kondic, um australiano de origem sérvia (tem dupla nacionalidade), “constitui uma decisão estratégica” dos novos accionistas (EMOSE, CFM e HCB), “sustentada na necessidade de, em virtude da situação actual da empresa, e depois de sucessivas tentativas de resgate falhadas, trazer para esta fase de transição um gestor com uma vasta experiência internacional na gestão e reestruturação de companhias aéreas, assente nos mais elevados padrões internacionais da indústria de aviação”.
Para a LAM, Kondic, de 60 anos de idade, “reúne os requisitos técnicos, a liderança e a visão estratégica necessários para conferir solidez e credibilidade ao processo em curso”, pelo que, “a sua integração visa, não apenas assegurar uma condução profissional e eficaz da reestruturação, mas também evitar abordagens experimentais e promover a transferência estruturada de conhecimento às equipas moçambicanas que permanecerão na LAM, contribuindo, deste modo, para o fortalecimento institucional e a sustentabilidade a longo prazo da companhia”.
A LAM descreve o Presidente da sua Comissão de Gestão como um gestor com uma “vasta experiência internacional na gestão e reestruturação de companhias aéreas”, assente nos “mais elevados padrões internacionais da indústria de aviação”. Clarifica que vai liderar a companhia área moçambicana “durante o período de reestruturação, que se estima que seja de cerca de 12 meses”, sendo que, para a contratação do gestor definitivo será lançado um concurso público internacional.
No seu vasto curriculum, partilhado pela LAM, está a sua passagem pela Air Serbia (2013-2018), como CEO e Presidente, onde conduziu “o processo exemplar de reestruturação e reposicionamento da companhia, expandindo a frota de 4 para 21 aeronaves”; o exercício da função de Vice-Presidente Comercial da Abacus International (2011-2012); de Vice-Presidente da North Asia GTA/Travelport (2008-2010); e de Director-Geral da Kuoni Travel para a região da Ásia-Pacífico (2005-2007). É Mestre em Gestão de Empresas (MBA) com especialização em Negócios Internacionais e Marketing pela University of Technology, de Sydney, e Licenciado em Contabilidade e Finanças pela University of New South Wales, Austrália.
A LAM afirma que a reestruturação da empresa visa contribuir significativamente para o aumento do tráfego de passageiros, a expansão do turismo e do transporte de carga. Diz que a Comissão de Gestão Executiva (que inclui os moçambicanos Lucas Francisco – para área financeira e comercial – e Hilário Tembe – para área operacional) agrega competências relevantes para assegurar a reestruturação e o reposicionamento da companhia.
No entanto, em nenhuma linha do comunicado de quatro páginas, a dita companhia aérea de bandeira moçambicana aborda a tensa relação que manteve, nos últimos meses, com a EuroAtlantic Airways, após a suspensão dos voos de Maputo-Lisboa-Maputo.
Lembre-se que a EuroAtlantic Airways, que fornecia a aeronave Boeing 777 (de 302 lugares) usada pela LAM na operação Maputo-Lisboa-Maputo, anunciou, a 27 de Fevereiro último, a rescisão do contrato com a companhia aérea moçambicana com “efeito imediato”, por alegado incumprimento da LAM “no pagamento das suas substanciais dívidas financeiras”.
Da rescisão, a companhia aérea portuguesa exigia uma indemnização de 21 milhões de USD, porém, o Governo moçambicano comprometeu-se apenas a pagar 3 milhões de USD, isto é, menos 18 milhões de USD exigidos pela companhia. “O que nós fizemos foi pegar o contrato e ver as cláusulas. Há uma equipa que está a trabalhar neste momento, chegou-se à conclusão de que o valor que estava a ser exigido era demasiado exagerado, e o valor de pré-aviso é mais ou menos cerca de 3 milhões de USD. É o valor que temos na mesa, mas a equipa continua a trabalhar”, disse, em Abril último, o Ministro dos Transportes e Logística, João Matlombe.
“…E ainda há acertos de conta, porque há facturas que foram pagas, mas os trabalhos não foram realizados”, acrescentou a fonte, garantindo haver “má interpretação”. “Nós vamos partilhar quando tivermos fechado o assunto”, assegurou.
Até ao momento, o Governo ainda não apresentou os resultados finais da negociação para o pagamento da dívida da LAM com a EuroAtlantic Airways. O que se sabe é que o ex-CEO da companhia portuguesa, que chegou a receber dinheiro por algo que não fez, conforme disse o Ministro dos Transportes e Logística, vai liderar uma nova fase da reestruturação da LAM, depois da falhada intervenção da sul-africana Fly Modern Ark (FMA).
Sem informação sobre o desfecho do diferendo financeiro que separa LAM e a EuroAtlantic, uma dúvida paira no ar: será a nomeação do ex-CEO da companhia aerea portuguesa, uma forma de quitar a dívida reclamada por esta empresa? (A. Maolela)