O partido Frelimo, que governa Moçambique desde 1975, tem-se revelado, cada vez mais, uma formação política fechada e anti-democrática. A mais nova prova do “fechamento” de um dos maiores partidos políticos da região Austral de África foi dada na última sexta-feira, durante o decurso da III Sessão Extraordinária do Comité Central, o órgão mais importante do partido, no intervalo entre os Congressos.
A reunião, que decorreu na Escola Central do partido, no Município da Matola, província de Maputo, tinha como objectivo eleger o novo Presidente da Frelimo, o novo Secretário-Geral e o novo Secretariado do Comité Central do partido. Das três eleições, apenas duas tiveram lugar, nomeadamente, as do Presidente do partido e do Secretário-Geral, porém, longe dos olhares dos jornalistas.
Tal como se verificou no processo de eleição de Daniel Chapo como candidato presidencial, em Maio de 2024, os jornalistas não tiveram acesso ao processo de votação (em ambas eleições), tal como se verificava nos anos anteriores. Pior, o partido sequer publicou a lista de candidatos aos cargos de Presidente e Secretário-Geral, no seu lugar de estilo, facto que era prática naquela casa, mesmo tratando-se de candidaturas únicas.
Em ambas eleições, os jornalistas apenas foram mobilizados para assistir ao acto de tomada de posse dos eleitos, uma cerimónia antecedida sempre pela leitura da acta do processo eleitoral. Américo Muchanga, Ministro das Comunicações e Transformação Digital, presidiu o processo eleitoral.
Para além do secretismo nos processos eleitorais, tem-se tornado recorrente a indicação de candidatos a Secretário-Geral e não a submissão de candidaturas pelos interessados. Desde que Eliseu Machava venceu Alcinda De Abreu, em Março de 2014 – com 131 votos contra 63 da sua opositora –, a Frelimo nunca mais assistiu a uma disputa eleitoral pelo cobiçado cargo.
Por exemplo, em Setembro de 2017, durante o XI Congresso do partido, Filipe Jacinto Nyusi indicou Roque Silva Samuel como candidato, uma aposta depois chancelada pelos membros do Comité Central, através de uma votação.
O facto repetiu-se, em 2022, durante o XII Congresso, com a renovação de Roque Silva, e, na última sexta-feira, com Daniel Chapo a indicar Chakil Aboobacar como novo Secretário-Geral. Em todas as situações, as eleições foram realizadas para legitimação do poder pelos escolhidos pelo Presidente do partido.
Aliás, as novas regras da democracia interna da Frelimo estavam explícitas no programa distribuído aos membros do Comité Central, na sexta-feira. O documento dizia claramente que o Secretário-Geral seria proposto pelo Presidente do partido (Daniel Francisco Chapo), enquanto os membros do Secretariado do Comité Central seriam propostos pelo Secretário-Geral eleito (Chakil Aboobacar).
Para o antigo Presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade da Assembleia da República, Teodoro Andrade Waty, membro do Comité Central da Frelimo, o partido no poder deve retomar “a tradição da abertura e transparência”.
“Há um lema que o Presidente Chapo transmitiu [durante a campanha eleitoral], que não se pode atingir resultados diferentes, procedendo da mesma forma. Acredito que o partido tem de ser muito mais transparente, como também são transparentes os seus estatutos, os seus regulamentos e as suas directivas eleitorais”, defendeu o jurista, em entrevista à “Carta”.
Lembre-se que a I Sessão Extraordinária do Comité Central, que elegeu Daniel Chapo como candidato presidencial da Frelimo para as eleições de 09 de Outubro último, decorreu longe da imprensa, com os jornalistas a terem acesso ao recinto da Escola Central do partido no poder e a respectiva sala de sessões na noite do último dia dos trabalhos do conclave (domingo).
A reunião durou três dias (iniciou no dia 03 de Maio e terminou no dia 05 de Maio) e, durante estes dias, os jornalistas estavam acantonados na área exterior da Escola Central da Frelimo sem qualquer informação oficial e muito menos ter imagens da reunião.
Refira-se que o Comité Central da Frelimo volta a reunir-se em Março próximo, na Matola, em sessão ordinária, para analisar a vida do partido, em concreto os resultados eleitorais de 2024 e a situação política, social e económica do país. O encontro vai servir também para a eleição dos membros do Secretariado do Comité Central, assim como para o preenchimento das vacaturas na Comissão Política, abertas pela morte de Manuel Tomé e Fernando Faustino. (A. Maolela)