Uma análise do Centro de Integridade Pública (CIP) defende que o Programa Quinquenal do Governo (PQG) para 2025-2029 continua a propor soluções vagas, não quantificadas, para o combate às desigualdades sociais, num contexto fiscal frágil e de dependência crónica de ajuda externa.
Tendo como base para avaliação do PQG 2025-2029, o World Social Report 2025, publicado pelas Nações Unidas, o CIP afirma haver uma distância “desconcertante” entre os alertas globais e o PQG 2025-2029, aprovado há dias pela Assembleia da República. “Moçambique quer resolver problemas do século XXI com ferramentas do século passado”, defende o CIP, numa análise publicada este domingo.
“Relatórios como o World Social Report 2025 (ONU) e o Pobreza, Prosperidade e Planeta 2024 – Saídas para a Policrise (Banco Mundial) clamam por acções concretas, inclusivas e integradas que respondam simultaneamente à pobreza, desigualdade, degradação ambiental e fragilidade institucional”, mas “o PQG 2025-2029 continua a propor soluções vagas, não quantificadas, num contexto fiscal frágil e de dependência crónica de ajuda externa”, sublinha.
Segundo o CIP, o relatório da ONU mostra que 10% da população mundial controla 76% da riqueza, enquanto os 50% mais pobres vivem com apenas 2% do bolo global. “Esses dados retratam uma economia concentrada e disfuncional, onde grupos vulneráveis enfrentam riscos crescentes. (…) Se as tendências actuais persistirem, até 2030 os países frágeis terão dois terços das pessoas mais pobres do mundo”, sublinha.
CIP afirma que a informalidade atinge 83% da força de trabalho regional, deixando milhões de pessoas sem protecção social e sujeitas à pobreza, mesmo quando empregadas. No caso do nosso país, cerca de 53,1% da população vive em situação de pobreza multidimensional, vulnerabilidade climática crescente e um sector informal dominante.
“O PQG reconhece esses problemas, mas oferece respostas genéricas e pouco quantificadas. O Governo propõe, por exemplo, reduzir a pobreza, mas não detalha como ou com que recursos irá materializar esse objectivo, num país onde o orçamento continua fortemente condicionado a doações externas e a elite política permanece imune à austeridade, que, entretanto, impõe à maioria da população”, diz a análise.
“O PQG promete: transformar a economia; acelerar a industrialização; e criar empregos decentes. No entanto, ignora o histórico de fracasso na execução de políticas estruturantes e na inclusão de grupos vulneráveis. Exemplo concreto: o relatório global recomenda sistemas universais de protecção social, com o objectivo de abranger todas as camadas sociais, enquanto Moçambique insiste em programas fragmentados e altamente dependentes de financiamento externo”, sublinha.
Continuando, o CIP refere que os investimentos públicos no país continuam fortemente dependentes de recursos externos, mesmo num contexto de confiança fragilizada por parte de vários parceiros internacionais. Por exemplo, para 2025, o Orçamento do Estado terá um défice de 126,8 mil milhões de Meticais (cerca de 33% das receitas previstas), o que “evidencia a forte dependência do país de financiamento externo”.
Para o CIP, cinco áreas estão a falhar no país: protecção social fragmentada; emprego e informalidade; crise climática e resiliência; fragilidade institucional e polarização social; e educação no século XXI com métodos dos século XX.
“O relatório da ONU propõe cinco pilares para reverter o colapso social iminente: redistribuição de riqueza; formalização do trabalho; investimento em resiliência climática; fortalecimento da coesão social; e cooperação internacional. Infelizmente, Moçambique ainda resiste ao primeiro e mais básico passo: reconhecer que a crise é estrutural e que soluções paliativas não bastam. O PQG deveria ser um plano de viragem, mas parece mais um catálogo de promessas recicladas”, conclui a análise, enfatizando que o início de um novo ciclo de governação deveria constituir uma oportunidade soberana para que levasse o Governo a introduzir mudanças estruturais na forma como elabora o PQG.