Um grupo de cerca de 40 insurgentes degolou dois trabalhadores da concessionária de turismo de caça Kambako Safaris, na Reserva Especial do Niassa, do lado da província de Cabo Delgado, executou a tiro membros do “staff”, queimou completamente um acampamento de luxo, o principal, com mais de dez casas, saqueou bens e utensílios, apoderou-se de viaturas, destruiu uma avioneta e roubou armas e fardamento de uma força da Unidade de Intervenção Rápida (UIR), disseram à “Carta” várias fontes.
A invasão dos insurgentes aconteceu no dia 19 e o incêndio ao principal “lodge” deu-se na madrugada entre os dias 23 e 24 deste mês. Depois da captura dos quatro trabalhadores, os insurgentes exigiram o pagamento de um resgate de três milhões de meticais, para a libertação das vítimas, mas tal foi rejeitado, devido às regras globais contra o financiamento ao terrorismo.
Após a rejeição, os insurgentes atearam fogo no acampamento principal. Em comunicado a que “Carta” teve acesso, no sábado, a Kambako Safaris refere que o principal acampamento, chamado Kambako, foi completamente queimado por “ladrões à solta”, contrariando a versão do governo norte-americano, que em nota publicada sexta-feira (25), no seu site, atribuiu o ataque a “terroristas”.
“O governo dos EUA recebeu informações de que terroristas atacaram aldeias nos limites da Reserva Especial do Niassa, perto de Nairoto, antes de entrarem na reserva e fazerem reféns num alojamento de caça privado”, refere a nota.
“Carta” teve acesso a uma outra nota da Kambako Safaris, que descreve o ataque como um “incidente isolado” e que resultou na perda de “bens essenciais”, mas “sem o registo de perda de vidas”. “A pilhagem aconteceu quando o acampamento estava quase vazio” e “este incidente teve um sério impacto na comunidade, uma vez que a empresa emprega 120 habitantes, todos os anos”, diz a nota.
Rapto e extorsão
Mas, “Carta” sabe que o acampamento Kambako foi incendiado por um grupo de cerca de 40 homens e mulheres que se faziam transportar em motas e bicicletas, que raptaram quatro trabalhadores que se dirigiam ao “lodge” Litule, que está a 60 Km do primeiro, onde iam realizar obras de reabilitação, porque se aproxima a época de caça. Os “terroristas” exigiram, por telefone, o pagamento de um resgate de três milhões de meticais, para a libertação das vítimas, disseram as fontes.
Além do rapto de quatro colaboradores, várias pessoas ligadas ao safari foram executadas pelos homens armados, contaram as mesmas fontes. “Carta” sabe que dois dos quatro trabalhadores raptados foram soltos e devem estar quase a ser salvos por operacionais da Kambako e elementos das forças de segurança.
Ao pararem, foram interpelados pelo grupo armado, que exigiu que os acompanhassem até ao “lodge” principal, mas quando chegaram a este acampamento os turistas e outras pessoas que estavam ali presentes já tinham fugido, contaram as nossas fontes.
“O que não foi roubado foi queimado”
Na nota a que “Carta” teve acesso, a concessionária diz: “o principal acampamento da Kambako Safaris, ao longo do Rio Lugenda, foi atacado por bandidos oportunistas”. “O que não foi roubado, incluindo combustível, armazéns de comida, roupa de protecção e veículos – foi deliberadamente destruído, num incêndio que arrasou todo o acampamento”, diz o comunicado.
Como parte dos preparativos da época de caça que se aproxima, o local foi “recentemente abastecido com comida e bebida, bem como roupas de protecção, botas, chapéus, camas e uniformes para os trabalhadores”, avança Jumbo Moore, parceiro fundador da Kambako Safaris, citado no comunicado.
Moore enfatiza que todos os tanques de combustível estavam cheios de diesel, incluindo para avionetas, e o safari acabava de receber equipamento essencial para a sua actividade, incluindo veículos, rodas e sobressalentes para camiões e tractores, sistemas solar e de inversores, rádios e tubos de canalização de água. “Os bandidos devem ter visto os nossos camiões a passar por várias aldeias ao longo de vários dias e engendraram um plano para conseguir estes bens valiosos”, afirmou.
Sentimento de terror noutros “lodges”
Operadores de outros safaris manifestaram à “Carta” medo com o ataque que atingiu a Kambako Safaris pelo facto de o grupo armado ter roubado armas, munições e mantimentos, porque pode visar outros acampamentos.
Instalado em 2004 na Reserva Especial do Niassa, ao longo do Rio Lugenda, a Kambako Safaris descreve-se como grupo de mentes dedicadas à conservação e que apostou na transformação de uma extensão de terra de vida selvagem no norte de Moçambique, numa concessão de caça de conservação.
“Duas décadas depois, esse sonho cresceu e criou a mais famosa actividade de safari de Moçambique, um modelo de conservação sustentável e desenvolvimento da comunidade”, diz o texto.
A concessionária começou como Kambako e, em 2015, juntou-se ao empreendimento a Champungu, criando a Champungu-Kambako Safaris. A gestão da concessão está a cargo de Jacques Hartzenberg e Jumbo Moore, ambos com experiência na administração de vários safaris em África.
A Kambako Safaris diz que, ao longo de 20 anos, tem trabalhado com a Administração Nacional de Áreas de Conservação (ANAC) na restauração e gestão de extensas áreas de vida selvagem.
Assinala que as actividades que desenvolve têm sido uma fonte de sobrevivência para as comunidades adjacentes, porque emprega 120 habitantes locais e fornece comida e materiais de construção, trabalhando em acções que visam impedir o conflito entre os animais bravios e as populações.
A concessionária afirma que já ofereceu milhares de quilos de carne limpa e tem distribuído carne processada resultante do abate legal, proporcionando um alimento nutritivo vital às populações. Em 2024, os benefícios económicos directos da concessionária para as populações ultrapassaram 400 mil dólares, salienta aquele safari.