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17 de Abril, 2025

Protestos pós-eleitorais: Actuação da Polícia foi imprudente, desnecessária e ilegal – Amnistia Internacional

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Continua a ser motivo de indignação e repúdio a forma como as FDS (Forças de Defesa e Segurança), em particular a Polícia da República de Moçambique (PRM), actuaram durante os protestos populares convocados pelo ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, em contestação aos resultados das eleições gerais de 09 de Outubro passado, que deram vitória à Frelimo e ao seu candidato presidencial Daniel Chapo.

Em relatório publicado esta semana, a Amnistia Internacional afirma que a actuação das FDS durante os protestos pós-eleitorais “foi imprudente e desnecessária, tornando-a força ilegal”. O Relatório diz também que a Polícia violou “as normas e padrões internacionais”, usando, de forma ilegal, “armas de fogo e armas menos letais”, assim como “matando e ferindo manifestantes e transeuntes”.

“O exército usou igualmente a força e armas menos letais de forma imprudente e ilegal. Nos incidentes documentados em que pessoas perderam a vida, o uso ilegal da força violou o direito à vida desses manifestantes e transeuntes, bem como o seu direito de reunião pacífica. Noutros incidentes, causou lesões corporais e, em todos os incidentes, violou o direito de manifestação pacífica”, considera a organização.

Baseando a sua análise em entrevistas (a testemunhas oculares, vítimas e familiares das vítimas, médicos e advogados com experiência na assistência de pessoas feridas ou presas) e verificação de dados abertos (mais de 100 vídeos e fotografias publicados nas redes sociais e/ou partilhados directamente com os investigadores; documentos oficiais e médicos, entre outros), a Amnistia Internacional contraria a narrativa oficial de que as manifestações foram violentas, defendendo que “os protestos foram em grande parte pacíficos”, apesar de “incidentes isolados de violência por parte de alguns manifestantes”.

Citando dados da Plataforma DECIDE, uma organização da sociedade civil moçambicana que contabilizou o número de fatalidades registadas durante as manifestações populares e de rua, a Amnistia Internacional reporta, em todo o país, a morte de 315 pessoas e mais de 3.000 pessoas feridas entre 21 de Outubro de 2024 e 16 de Janeiro de 2025.

“A Polícia moçambicana procedeu a prisões em massa de manifestantes e transeuntes, incluindo crianças de apenas 14 anos, e deteve-os em esquadras de Polícia em todo o país. A Plataforma DECIDE informou que, entre 21 de Outubro de 2024 e 16 de Janeiro de 2025, mais de 4.000 pessoas foram presas e detidas no contexto das manifestações”, acrescenta.

Já os advogados informaram à Amnistia Internacional que prestaram assistência jurídica a estes presos, sendo que “a maioria destas prisões foram arbitrárias”, para além de que a Polícia negou aos advogados o acesso aos seus clientes, em violação dos direitos dos detidos a um julgamento justo.

“Quatro entrevistados relataram à Amnistia Internacional que a Polícia negou igualmente o acesso dos detidos às suas famílias. A Amnistia Internacional documentou um caso de detenção em regime de incomunicabilidade e dois casos de actos que podem constituir tortura ou outros maus-tratos. Em Mecanhelas, na província do Niassa, as autoridades moçambicanas tentaram também suprimir informação sobre as manifestações e a resposta policial, intimidando jornalistas e confiscando o seu equipamento”, detalha.

Para além dos abusos cometidos pela Polícia, a Amnistia Internacional denuncia também a limitação no acesso à informação, com o corte da internet e o bloqueio das redes socais da Meta (Facebook, WhatsApp e Instagram), verificados durante o período dos protestos.

“A Amnistia Internacional receia que os fornecedores de serviços de Internet o tenham feito sem cumprir com as suas responsabilidades internacionais em matéria de direitos humanos, contribuindo assim possivelmente para violações dos direitos de acesso à informação, liberdade de expressão, associação e manifestação pacífica”, garante a organização, para quem as declarações do então Ministro dos Transportes e Comunicações, Mateus Magala, assim como o cómico comunicado do Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique “sugerem que actores estatais ordenaram as interrupções da internet”.

A Amnistia Internacional apela às autoridades a garantirem uma investigação “exaustiva e imparcial” a todas as alegações de homicídios, ofensas à integridade física, prisões e detenções arbitrárias e outras violações de direitos humanos, protagonizadas pelos seus agentes e que “sejam levados à justiça em julgamentos justos”.

“O governo moçambicano deve também assegurar condições para que as vítimas possam obter reparações rápidas do Estado, incluindo restituição, compensação financeira justa e adequada, cuidados médicos e reabilitação apropriados”, sublinha.

Refira-se que o Relatório da Amnistia Internacional analisa violações dos direitos humanos por parte das FDS, no contexto das manifestações realizadas entre 21 de Outubro de 2024 e 24 de Janeiro de 2025, bem como possíveis acções de fornecedores de serviços de internet que resultaram em impedimento no acesso à informação durante esse período.

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