Inicia próxima segunda-feira, 23 de Agosto de 2021, o julgamento do caso das “dívidas ocultas”, tido como o maior escândalo de corrupção em Moçambique (desde a independência), que levou o país ao descrédito nas praças financeiras internacionais. Em causa, lembre-se, está o empréstimo, com garantias ilegais do Estado, de mais de 2.2 mil milhões de USD pelas três empresas caloteiras, nomeadamente, ProIndicus, EMATUM e MAM.
No banco dos réus estarão 19 arguidos, que são acusados pela prática dos crimes de violação das regras de gestão, posse de armas proibidas, associação para delinquir, chantagem, corrupção passiva, peculato, abuso de cargo ou função, falsificação de documentos, uso de documentos falsos e branqueamento de capitais.
Para além dos 19 arguidos, o juiz Efigénio José Baptista, da 6ª Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, irá ouvir 68 declarantes, entre eles, o ex-Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, e o ex-Governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove.
O primeiro arguido a ser ouvido pelo Tribunal será Cipriano Mutota, então Director do Gabinete de Estudos e Projectos do SISE (Serviço de Informação e Segurança do Estado). Recorde-se que as dívidas ocultas foram contratadas, no âmbito da implementação do Projecto de Protecção da Zona Económica Exclusiva de Moçambique (liderado pelo SISE), que levou à criação das três “empresas caloteiras”.
Cipriano Mutota é tido como peça-chave para o esclarecimento do processo inicial do caso, visto que foi quem recebeu, em primeira mão, a proposta do Projecto, apresentada pela representante da empresa Abu Dhabi Mar LC, do grupo Privinvest, na África do Sul, Batsetsane Thlokoane. Entretanto, diferentemente dos restantes membros do grupo, Mutota não teve a mesma sorte, pois, foi “caloteado” pelos seus “companheiros de trincheira”. Mutota será ouvido pelas 9:00 horas.
No mesmo dia, quando forem 13:00 horas, o Tribunal irá ouvir Teófilo Nhangumele que, segundo o Ministério Público, esteve presente no encontro de apresentação da proposta do Projecto de Protecção da Zona Económica Exclusiva de Moçambique, na qualidade de amigo de Cipriano Mutota.
Na sua acusação, o Ministério Público afirma que Nhangumele jogou um papel fundamental para que o então Presidente da República, Armando Guebuza, aprovasse o projecto. Foi Nhangumele que abordou Bruno Tandane acerca do assunto para que este conversasse com o amigo Ndambi Guebuza, de modo que o primogénito de Guebuza convencesse o pai a aprovar a proposta.
De acordo com o calendário partilhado pelo Tribunal, a audição dos arguidos termina no dia 01 de Setembro, com o julgamento de António Carlos do Rosário, o famoso “Agente A” do Relatório da Kroll, tido como o principal mastermind do calote. À data dos factos, Do Rosário era Director Nacional da Inteligência Económica no SISE e tornou-se PCA das três empresas caloteiras.
Refira-se que o julgamento irá decorrer na Penitenciária da Máxima Segurança (vulgo B.O.), no Município da Matola, província de Maputo, e não contará com a participação dos juízes eleitos. O juiz autorizou a presença do público, assim como a transmissão em directo do julgamento, porém, caso o reu não se oponha.
Sublinhar que a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) estará representada no julgamento, como assistente, por sete advogados, nomeadamente, Gilberto Correia, Flávio Menete, Arlindo Guilamba, Filipe Sitoi, Vicente Manjate, João Nhapossa e Duarte Casimiro, o actual Bastonário. (Carta)