Prosseguiu, na manhã e tarde desta quarta-feira, a audição, pelo segundo dia consecutivo, do primeiro arguido do julgamento do caso das dívidas ocultas, que decorre na Cadeia de Máxima Segurança, desde a última segunda-feira. Hoje, Cipriano Mutota voltou ao Tribunal para responder as questões da defesa, assim como perguntas de insistência do Juiz e do Ministério Público, depois de ontem ter sido ouvido pelo Tribunal durante 10 horas.
“Carta” transcreve, a seguir, os principais momentos que marcaram a audição de Cipriano Mutota neste segundo dia das suas audições. Até ao fecho desta reportagem, Cipriano Mutota tinha respondido perguntas da defesa.
Perguntas do advogado Abdul Gani
Abdul Gani (advogado de Gregório Leão): Senhor Cipriano Mutota, quero lhe fazer duas ou três questões para ter um posicionamento. Se conhece o Senhor Leão: quando, como e em que circunstância começou a ter o contacto com ele.
Cipriano Mutota (CM): Meritíssimo, meu conhecimento com o Director Leão, foi entre os anos 1978 ou 80 quando ele ingressa no SNASP. Fomos colegas, fomos dirigentes da instituição por algum tempo (…).
Abdul Gani (AG): Para além da relação profissional, mantinha alguma relação externa?
CM: Não. Para além da confraternização que o próprio SISE organizava.
AG: Alguma vez foi para casa dele?
CM: Não, que eu me lembre. Tínhamos um protocolo, na exepção de encontros públicos que seguia um certo protocolo.
AG: Diz a pronúncia sobre facto não provados que, em data não determinadas, os arguidos (…), em colaboração com Jean Boustani, formaram um grupo, arquitectaram um plano criterioso. Os senhores formaram um grupo com objectivo de lapidar o Estado moçambicano?
CM: Nunca formamos um grupo. Nunca sentamos para fazer isso (…).
AG: Acusação diz que o senhor formou um grupo…
CM: Eu, pessoalmente, estou tranquilo e a pessoa que diz isso terá que provar que fizemos isso.
AG: O senhor conhece, o Senhor Carlos António do Rosário?
CM: Sim, desde 1991, quando ele entrou no SISE.
AG: Conhece o senhor Bruno Langa e já esteve com ele?
CM: Sim, num café, onde tivemos uma conversa banal?
AG: Conhece o Senhor Ndambi Guebuza?
CM: Conheço, como filho do meu Comandante-em-Chefe (…).
Perguntas do advogado Alexandre Chivale
Alexandre Chivale (AC): Disse, no início do seu depoimento, que a nível do seu serviço criou um canal de comunicação para os consumidores (…). Tem certeza que estas informações chegaram efectivamente ao Comandante-em-Chefe das FDS?
CM: Faço a afirmação porque o senhor Director-Geral logo que recebe a informação faz subir a informação.
AC: Senhor CM, numa das suas afirmações, disse que, dos famosos 50 milhões que foram referidos, em função do atraso dos valores, Teófilo Nhangumele disse que iria falar com Ndambi Guebuza.
CM: Fui claro ontem. Ele disse que veio falar depois de falar com o Senhor Ndambi.
AC: Disse que participou em dois encontros na Presidência da República, em nome do Comando Conjunto (…), se nos dois encontros esteve com o Senhor Teófilo Nhangumele?
CM: Pelo que me recordo, ele participou num encontro e foi o último, onde o MDN pediu que ele não participasse mais.
AC: Nas reuniões do Comando-Conjunto, como o Teófilo Nhangumele foi apresentado nesta reunião?
CM: Primeiro, não sou membro do Comando Conjunto. Eu fui como técnico. O Director-Geral sempre que tivesse uma situação que precisava de uma situação, ele pede que a pessoa o acompanhe. E quando chegas lá, já sabem quem tu és.
AC: Tem conhecimento de como o Senhor Teófilo, como ele era tratado?
CM: Na qualidade de quem tinha conhecimento do draft.
AC: Quem convidou o Senhor Teófilo Nhangumele?
CM: Fui eu que fiz a proposta ao DG e este anuiu, eu tendo ficado com a questão de planificação e ele com a questão financeira.
AC: Sobre os representantes do Comando Conjunto de cada sector…
CM: Naquela reunião ficou-se que o processo deve ser liderado pelo MDN, MINT e o SISE, e as outras instituições seriam integradas ao longo do processo (…) e nunca disse que sobre a composição do veículo (…).
AC: Sobre a composição do veículo orientado pelo Comandante do Comando Conjunto…
CM: O Monte Binga foi o local escolhido e os donos da casa ficaram a liderar o processo.
AC: Relativamente ao caso da MULEPE, eu queria que nos clarificasse. Eu queria que nos clarificasse se o PENA que se refere é o Senhor Leonardo PENA, actualmente Embaixador de Moçambique no Vietname?
CM: Sim, é este!
AC: Tem conhecimento de um acordo entre a MULEPE e a ABU DHABI MAR de 16 de Setembro de 2011?
CM: É forçoso este acordo. Logo que tomei conhecimento, eu disse que a MULEPE não é das FDS e disse para procurarem a Monte Binga que estava a liderar o processo. Nós não podemos prosseguir com este processo, porque o Monte Binga é que deveria prosseguir com o projecto.
AC: Quem assinou este END Way? Meritíssimo, eu gostaria de juntar este documento aos autos que tem assinatura do Senhor Cipriano Mutota. Vou voltar a esta reunião, se esta reunião era do documento conjunto ou do comando operativo.
CM: Tivemos a reunião, estiveram os componentes, mas não posso confirmar que estiveram na reunião (…).
AC: No Gabinete do Ministro Defesa Nacional estiveram na reunião os membros do Comando Operativo. Quem são os integrantes?
CM: (…) fizeram parte o Ministro da Defesa, do Interior, do SISE e a equipa, eu e o Teófilo Nhangumele (…).
AC: Tem em mente, a data deste encontro? (…) Não terá sido no dia 21 de Dezembro de 2012?
CM: Não, não tenho em mente.
AC: Quantos e quais tipos de oficiais o SISE tem? Já é homem na casa há 40 e tal anos.
CM: Prefiro me abster, não vou responder.
AC: Quem é o tal General Guebuza que fez referência ontem?
CM: Não me lembro de ter dito isto nesta audiência.
AC: Podemos ler os autos de ontem, de um tal General e isto pode criar alguma confusão, porque o então Comandante-em-Chefe é também Tenente-General. Quem é?
CM: O Paulo Guebuza foi mencionado pela Batsetsane. Disse que pelos contactos anteriores feitos o falecido pode ter organizado o encontro do Ministério das Ciências e Tecnologias.
AC: Disse-nos ontem a respeito do projecto da ZEE e que com detalhes. Se o projecto não tivesse falhado, teríamos hoje a situação em Cabo Delgado ou não?
Rodrigo Rocha, advogado de Cipriano Mutota, protesta a pergunta.
(…)
AC: Tem conhecimento de algum fundo do Estado pago a Ndambi Guebuza e António Carlos do Rosário?
CM: Não tenho conhecimento.
AC: Quais são as atribuições do Gabinete de Estudo e Planificação?
CM: Esta questão não vou responder.
AC: Tem conhecimento que o então Director-Geral do SISE, Gregório Leão, em 2006, criou uma Direcção Nacional de Assuntos de Inteligência Internacional, dentro da Divisão de Análise?
CM: Uma das atribuições do Gabinete de Estudo e Planificação é esta, mas não vou responder. É uma questão de Segredo do Estado.
AC: Tem conhecimento de uma apresentação sobre a questão da Zona Económica Exclusiva (ZEE), que o DG que teria a presença do comandante em chefe e que em vez de chamar o ACR, mas chamou a se CM.
CM: Não tenho conhecimento disso (…) o Gabinete do Director-Geral tem um secretário e um chefe de protocolo e funciona muito bem. Não acredito que tenha cometido um erro deste. Não confirmo e não sei o que se pretende com isso.
AC: Houve uma viagem feita para KIEL, na Alemanha para visitar um Quio da PRIVINVEST. E por questões de infelicidade não foi e pediu em substituição o Teófilo Nhangumele?
CM: o Senhor Nhangumele já tinha autorização e se o Director não se anuiu se ele não iria.
AC: Como Teófilo Nhangumele chegou a apresentar um projecto desta envergadura na presença do Comandante em Chefe?
CM: Não posso revelar isso, porque o SISE tem seus braços que mantém a segurança deste país e o número é aquele que nós sabemos que esta la, mas não posso revelar aqui esta informação.
Houve uma questão que no início do projecto deveria ir para particulares, mas quando chegou a hora de financiamento, a MULEPE foi retirada porque não poderiam financiar privados, mas sim Estado.
3ª parte das perguntas do Advogado Jaime Sunda
JS: Há momentos que falamos de reuniões ou há momentos que falamos de encontros. Sobre as apresentações. A minha questão é sobre as apresentações do draft. Foi nos encontros ou nas reuniões?
CM: Foram dois encontros e duas apresentações.
JS: Pode nos dizer porque não esteve num dos encontros e no segundo falou-se de mesmo assunto?
CM: Não sei porque não estive num e estive noutro.
JS: Quando ouviu falar de dinheiro no processo?
CM: Ouvi falar de dinheiro nos dois momentos, quando fizemos o draft e o processo da definição dos orçamentos. Ouvi com a Ângela sobre as máquinas.
JS: Os 365 milhões eram para o que no estudo. Qual era a finalidade?
CM: Existe o estudo. A orçamentação do equipamento, da formação e para suportar todo projecto.
JS: Sabia donde viria este dinheiro?
CM: Não, porque pensávamos que o valor vinha do Estado, através do Ministro das Finanças (…) na nossa óptica, o Estado e o governo tinha que financiar este projecto, era nossa expectativa.
JS: Falou-se aqui de expectativa financeira? Tinha alguma expectativa da sua parte?
CM: Não tinha nenhuma expectativa financeira, porque já tinha o meu salário que o Estado me pagava, e porque iria querer outro dinheiro.
JS: Teve conhecimento do valor financiado para o projecto?
CM: Não, porque a versão que foi apresentada não foi além (…) a versão que nos coloca aqui não era a nossa expectativa. No meu projecto nunca fiz nenhum projecto pensando em expectativas (…) nós buscamos ameaças para propor medidas e soluções para dissipar (…).
JS: Daquilo que sabe. Sabe ou não se o projecto que avançou, se tinha alguma ligação com a PRIVINVEST?
CM: Sei através da média, TV, Noticiais e ouvi num dos conselhos coordenadores do SISE pelo Rosário, apenas!
JS: Falou-se aqui também dos 50 milhões de USD. Tem alguma relação com o dinheiro que o senhor recebeu?
CM: Não sei (…).
JS: O senhor falou que a recomendação que recebeu na apresentação que fez foi dito para melhorar, aprimorar, aprofundar o estudo. Recebeu de quem esta recomendação?
CM: Recebi do meu Director-geral.
JS: O senhor falou aqui, do TN como focal point da PRIVINVEST (…) o Teófilo chegou de falar sobre este assunto?
Advogado: Eu queria saber se conhece o Zulficar Ismael Ali Ahmed, antes aonde e quando?
CM: Nunca tinha ouvido do nome, só ouvi através destas listas que circulam por aí.
4ª parte das perguntas do Advogado Rodrigo Rocha
RR: O que a MULEPE fazia, suas actividades (…)?
CM: A MULEPE tinha suas actividades. Uma delas era a limpeza de tanques. E fizemos a limpeza dos tanques da Petromoc e um dos trabalhos fizemos limpeza de cinco tanques com crude (…) solicitamos uma licença ambiental para passarmos a fazer limpeza (…) tem licença de concessão mineira no Gilé (…) porque as pessoas desistiram quando eclode a segunda vaga de desestabilização.
RR: Resumidamente a MULEPE tinha uma actividade própria…. Estava relacionada com actividades de segurança?
CM: Não.
RR: Sobre este documento quem tem envio?
CM: Recebi do Teófilo (…) e nunca mim foi dito quem era a pessoa.
RR: Nesta altura partilhavam escritórios?
CM: Sim, era este o endereço.
RR: O seu projecto quantas fases previa?
CM: O meu projecto que desenhado por mim e pelo Teófilo e do Rosário previa três fases de implementação (…) fundamentação, estudo e implementação. E fiquei sou na fase nas duas primeiras fases.
RR: Ontem quando o assistente perguntou se o Senhor Teófilo era do SISE, respondeu que sim, confirma?
CM: Sim, confirmo.
RR: Então, quando se fala que o Senhor Teófilo era estranho do SISE (…).
CM: Eu confirmei mesmo sem ter autorização e que antes de começar a trabalhar comigo ele já fazia parte (…).
RR: No SISE, é uma prática pagar as pessoas pelos serviços prestados?
CM: Não é uma prática, mas quando trabalhamos com alguém útil pagamos pelos serviços prestados.
RR: De que conta saiam estas remunerações?
CM: Não sei donde saiam, mas sempre que pudéssemos tínhamos que submeter as propostas aos nossos chefes hierárquicos para que assim se fizesse.
RR: Alguma vez disse que para o Senhor Jean Boustani que queria este falar ou não?
CM: Por duas vezes falamos, e uma delas foi quando ele disse que vinha a Maputo trabalhar (…).
RR: Alguma vez negócio com Jean Boustani sobre os valores do projecto?
CM: Nunca negociei com ele.
RR: Quando é que teve o encontro e a chamada telefónica?
CM: Por aí, em 2011 (…).
RR: Quando fez esta chamada estava dentro do projecto ou não?
CM: Não.
RR: Tem em mente de quanto tempo já estava fora do projecto?
CM: Por aí, sete meses ou mais.
RR: Já alguma vez, envio algum email ou negócio com o senhor Jean Boustani para o aumento do valor para mais 50 milhões de USD?
CM: Nunca cheguei a dizer porque o valor ainda não tinha sido decidido.
RR: Tem a ver com este projecto que tem sido falado?
CM: Tenho sim. Houve plágio. Copiou-se algumas coisas (…), mas nos fomos rigorosos nas fases de implementação (…) por isso, dissemos que iriamos experimentar por aí, uns 302 milhões de USD.
RR: Nesta conversa que teve com o Senhor Jean Boustani, ele prometeu algum montante?
CM: Sim, prometeu um milhão de USD (…) ele disse que iria tirar um milhão do seu bolso para me dar, mas eu disse que tu estas a dar mais aos outros e eu só 1 milhão (…) por isso, eu aceitei porque não tinha nada a ver com a empresa.
RR: O valor que foi enviado para a conta dos seus amigos, foi enviado directamente da conta do senhor Boustani?
CM: Não sei, talvez.
RR: Porque sempre insistiu que o valor deveria ser pago em Moçambique e não fora do país?
CM: Nunca pensei que o valor fosse ilegal, por isso aceitei receber na minha (…) e a retenção é na fonte.
RR: Porque não aceito receber o valor fora do país?
CM: Sou patriota (…) por isso bati com o pé que deveria receber o dinheiro aqui no país (…).
RR: Alguma vez teve poder decisão para avançar com algum projecto?
CM: Nunca tive este poder.
RR: Se alguém viesse com 20 milhões e dissesse que a aprovas este projecto, aceitaria?
CM: Não, iria recusar (…) porque iria me questionar porque eu (…).
RR: Lembra-se quanto tempo levou o seu interrogatório na Procuradoria?
CM: Por aí, 12 horas de tempo, das 09H00 as 21H00.
RR: Ontem quando foi inquerido pelo Juiz porque veio desmentir as afirmações da PGR?
CM: Porque estava sozinho (…) a primeira estava sozinho e a segunda fui com um advogado, mas o Procurador-Geral Adjunto actual disse que o Dr. Inácio Matsinhe não poderia porque tinha sido constituído assistente deste processo, o que ele recusou (…) e depois aceitei entrar sozinho e criaram estas ratoeiras e estou aqui preso (…).
(…)
RR: Senhor Mutota, neste processo todo, o Sr. terá falsificado ou forjado algum documento?
CM: Não, mas recordo-me de ter escrito uma carta ao BIM, com conteúdo não verdadeiro.
RR: Senhor Mutota, o Estado ou SISE entregou-lhe alguma coisa que tinha que devolver ou retribuir?
CM: Nunca.
RR: Dos arguidos deste processo, quais deles teve uma relação pessoal para privar?
CM: Com excepção do Teófilo, com os restantes alguns a relação era profissional ou de subordinação (…).
RR: Quantas vezes falou com Sr. Teófilo depois de falar com a Sra. Ângela sobre as máquinas?
CM: Duas vezes.
RR: Com Senhor Jean Boustani, quantas vezes falou com ele?
CM: Duas vezes.
RR: Achas que isto é cobrar insistentemente?
CM: Não.
RR: Alguma vez penso que os valores que foram pagos por Jean Boustany era uma remuneração?
CM: Não.
(Omardine Omar, na B.O.)