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11 de Abril, 2025

Subsistência não é destino: para onde vai a agricultura moçambicana?

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Nas últimas décadas, Moçambique tem implementado diversas iniciativas com o objetivo de fortalecer a agricultura, aumentar a produtividade e melhorar o bem-estar das famílias rurais. Desde planos estratégicos como o PARPA até programas mais recentes como o Sustenta, a tónica tem recaído sobre o papel central da agricultura no desenvolvimento nacional e na redução da pobreza.

Esses esforços refletem a importância do setor agrícola na estrutura econômica do país, uma vez que a maioria da população depende direta ou indiretamente da agricultura para sobreviver. No entanto, apesar das boas intenções, permanece a necessidade de reavaliar a direção que estas políticas têm tomado, especialmente no que se refere à agricultura de subsistência.

A agricultura praticada pela maioria dos moçambicanos é de pequena escala e voltada essencialmente para o autoconsumo. As famílias produzem para se alimentar, e apenas os excedentes, quando existem, são comercializados. Nestes contextos, os agricultores operam sob forte incerteza, com baixos níveis de capitalização, acesso limitado a mercados e fraca infraestrutura de apoio.

Apesar disso, muitas das intervenções públicas e privadas têm procurado modernizar esse modelo através da introdução de insumos melhorados, técnicas de produção mais eficientes e mecanismos de integração ao mercado. Embora essas medidas tenham mérito técnico, raramente são acompanhadas por mudanças estruturais que assegurem retorno ao investimento. Exigem-se melhorias de produtividade sem garantir os meios mínimos para que tais melhorias se sustentem.

Esse tipo de abordagem tende a encarecer uma agricultura que, na sua essência, foi construída para funcionar com recursos mínimos. A introdução de tecnologias sem escala, sem estabilidade de preços e sem canais de comercialização eficientes pode aumentar os riscos para os agricultores, colocando em causa sua segurança alimentar em vez de fortalecê-la.

A questão da escala produtiva é igualmente relevante. A transição de uma agricultura de subsistência para uma agricultura comercial exige acesso a maiores extensões de terra, infraestrutura, equipamentos e conhecimento técnico. No entanto, nem todos os produtores têm vocação ou interesse em seguir esse caminho. Muitos exercem a atividade agrícola por falta de alternativas, não por opção empreendedora.
Neste cenário, torna-se urgente repensar a forma como os recursos públicos e os esforços institucionais são distribuídos. A assistência técnica e financeira não deve assumir uma lógica universal, tratando todos os produtores da mesma forma, mas sim reconhecer os diferentes perfis existentes no meio rural. Aqueles com capacidade e interesse em crescer poderiam beneficiar de apoio mais direcionado, com políticas de crédito, mecanização e ligação a cadeias de valor. Por outro lado, para os que permanecem na agricultura apenas por ausência de opções, seria mais estratégico investir na diversificação económica rural, com oportunidades em setores como agroprocessamento, comércio local, turismo rural e serviços.

Reconhecer que a agricultura não será, para todos, a via de saída da pobreza não significa abandoná-la. Pelo contrário, trata-se de encontrar formas mais eficazes de usá-la como plataforma para a transformação rural. Isso inclui permitir que produtores mais estruturados possam crescer e empregar outros, ao mesmo tempo em que se criam alternativas para aqueles que hoje produzem apenas para sobreviver.
Persistir em apoiar exclusivamente agricultores de subsistência, sem uma estratégia clara de transição, limita o potencial de transformação do setor agrícola. Ao mesmo tempo, ignorar os que têm capacidade de se tornar empreendedores rurais é desperdiçar oportunidades de crescimento mais dinâmico e sustentável.

Portanto, políticas públicas mais eficazes deverão articular inclusão social com promoção de produtividade, reconhecendo a heterogeneidade do meio rural. É necessário deslocar o foco da assistência generalizada para intervenções segmentadas, pensadas a partir das reais possibilidades de cada grupo. A agricultura, embora central, deve ser entendida dentro de um ecossistema mais amplo de desenvolvimento rural, onde haja espaço para diferentes trajetórias.

Transformar a agricultura moçambicana exige abandonar a romantização da subsistência e encarar com realismo os desafios e as oportunidades do setor. O futuro do desenvolvimento rural passa por reconhecer que nem todos os camponeses querem ou podem tornar-se empresários agrícolas – e está tudo bem com isso, desde que existam alternativas reais e dignas.

 

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